"Abuso sexual não é apagado, mas pode ser ressignificado", afirma psicóloga em palestra sobre abuso contra crianças e adolescentes
“Não podemos apagar um abuso sexual, mas podemos ressignificá-lo. Podemos rearranjar essas vivências. E também precisamos, logo que possível, preparar crianças e adolescentes para não serem vítimas de abusos sexuais, porque são praticados, geralmente, por pessoas próximas e admiradas por eles. Homens e mulheres podem ser abusadores”, explicou a psicóloga e mestre em psicanálise, Vanessa Gama Pozzato, durante a palestra “Abuso sexual contra crianças e adolescentes: Um Tema Urgente”, na tarde desta quinta (18), no plenário do 8º andar do edifício-sede do TRT-MG, em Belo Horizonte.
Em sua explanação, ela relatou casos de sedução de menores, mas que não resultaram em morte, como o da menina Araceli, há 50 anos, em Vitória, no Espírito Santo. Os abusos, segundo ela, implicam impactos psíquicos importantes que podem acompanhar a pessoa por toda a vida. “Freud já tratava da sexualidade das crianças, porque elas têm sexualidade, mas não estão preparadas para vivê-la antes da vida adulta. Por exemplo, o ideal é que os pais não façam sexo no mesmo quarto em que os filhos dormem ou na frente deles. Se não dá para ter quartos separados, pelo menos que durmam em colchões separados. Cada um tem que ter o seu espaço, que deve ser respeitado. E não podemos deixar de escutar as crianças e adolescentes e nem esquecer que meninos também são abusados”, frisou Pozzato.
Em seguida, foi a vez da juíza de direito e especialista em Direito Processual Civil e em Direito Penal e Criminologia, Daniela Cunha Pereira. Ela contou que lidou, durante 13 anos, com muitas meninas vítimas de crimes sexuais, já que o sexo feminino é o mais afetado estatisticamente. Todo dia, segundo dado alarmante apresentado, acontece um estupro de menina ou mulher a cada nove minutos.
Conforme ela explicou, isso se deve ao fato de os corpos das mulheres serem mais sexualizados pela sociedade que o dos homens. “Um dos crimes mais comuns cometidos é o estupro de menores de até 14 anos e isso independe do consentimento da vítima. Já existe também o estupro virtual, sem necessidade de contato direto. Filmar, fotografar ou registrar atos sexuais, mesmo que isso não seja compartilhado, também é crime, sendo válido tanto para menores quanto para maiores de idade”, disse.
Daniela Cunha lembrou que armazenar conteúdos no próprio celular, mesmo que ele seja compartilhado por outra pessoa, pode incorrer em crime e que o ideal seria que denunciassem e não se omitissem, sobretudo os homens, que são os que mais recebem esse tipo de conteúdo em grupos de WhatsApp.
Ao final, ela ressaltou a importância da denúncia anônima, mesmo que seja uma suspeita, por meio do "disque 100", e lembrou ainda que a Lei Maria da Penha também se aplica às meninas. Inclusive, nesses casos, as Delegacias da Mulher podem ser acionadas.
Abertura e mesa de honra
Na abertura do evento, o presidente do TRT-MG, desembargador Ricardo Mohallem, afirmou estar muito satisfeito em receber, em especial, os alunos da Escola Municipal Anisio Teixeira e seus professores, porque, segundo ele, onde há ensino, reduz-se as chances do trabalho infantil. A possibilidade é menor. “Os trabalhos que prejudicam as crianças retiram delas a possibilidade de serem crianças e de crescerem em seu aprendizado. O abuso é um tema interessante, porque diz respeito ao Direito Penal e aos adultos, à boa formação das famílias”, ressaltou.
Já a gestora regional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem, desembargadora Jaqueline Monteiro de Lima, enfatizou que, para uma criança ser feliz, é preciso que ela cresça com segurança, sem violência. “E hoje, no Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, não podemos deixar morrer jamais a história da menina Araceli, que foi raptada, violentada e assassinada. Atualmente, temos também um mundo digital, que virou um veículo de abuso sexual moderno. Hoje é para não silenciarmos jamais e tratarmos de um tema que precisa ser enfrentado”, concluiu.
Posteriormente, foi veiculado o vídeo da música “Ninguém mexe comigo”, que mostra, de maneira lúdica, a mensagem de proteção às crianças e aos adolescentes.
A mesa de honra foi composta, além das duas palestrantes, pelo presidente do TRT-MG, desembargador Ricardo Mohallem; pelo vice-corregedor, desembargador Manoel Barbosa da Silva; pela gestora regional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem, desembargadora Jaqueline Monteiro de Lima; pela ex-gestora regional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil 2020-2021, desembargadora Adriana Goulart de Sena Orsini; pelas também gestoras regionais do Programa de Combate ao Trabalho Infantil, juízas Sandra Generoso e Renata Lopes Vale; e pelo coordenador da Coordenadoria Nacional de Combate ao Trabalho Infantil e de Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes em MG, procurador Wagner Gomes do Amaral.
Assistam, na íntegra, ao evento: