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Poder disciplinar do empregador e direito de imagem do atleta foram debatidos na tarde de encerramento de Encontro

publicado: 13/04/2012 às 18h43 | modificado: 13/04/2012 às 21h43

O Encontro Mineiro de Direito Desportivo Trabalhista , iniciado ontem com palestra do Ministro do TST, Carlos Alberto Reis de Paula, e com prosseguimento em todo o dia de hoje no auditório da OAB/MG, na rua Albita, 250, em Belo Horizonte, foi concluído, à tarde, com as palestras "Poder Disciplinar do Empregador no Direito Desportivo do Trabalho", "Patrocínio no Direito Desportivo: Limites e Ingerência no Vínculo de Emprego", "acréscimos remuneratórios" e "Direito de Imagem e Direito de Arena após a Lei 12.395/11".

Na abertura dos trabalhos da tarde, o presidente da OAB/MG, Luís Cláudio Chaves, destacou a ótima relação da Ordem com o TRT de Minas, considerado por ele um exemplo para todo o país. Segundo Luís Cláudio, essa relação, que já era muito boa, foi estreitada ainda mais graças à postura do ex-presidente do Tribunal, desembargador Paulo Roberto Sifuentes Costa, sempre sensível às reivindicações dos advogados. O dirigente elogiou também as ações conjuntas da Escola Superior de Advocacia e da Escola Judicial do TRT, no Encontro e nos movimentos pela conciliação.

Poder disciplinar do empregador e direito de imagem do atleta foram debatidos na tarde de encerramento de Encontro (imagem 1)

Poder Disciplinar do Empregador no direito Desportivo do Trabalho

No primeiro painel, mediado pelo advogado Conselheiro Seccional da OAB-MG e auditor do TJD-MG, João Carlos Gontijo Amorim, discorrendo sobre o poder disciplinar do empregador, o desembargador do TRT da 1ª Região (RJ), Alexandre Belmonte, comentou aspectos do artigo 31 da Lei 9615/98, que permite a rescisão do contrato do atleta com a entidade de prática desportiva que atrasar por três meses ou mais o pagamento de salários, gratificações, prêmios e outras verbas, e, ainda, os artigos 34 e 35 da mesma lei que estabelecem, respectivamente, obrigações dessas entidades e dos atletas profissionais, salientando que os atletas podem exigir o cumprimento do contrato, mas é preciso que também cumpram suas obrigações, pois têm deveres de obediência, diligência e fidelidade para com o empregador.

O magistrado esclareceu que a lei foi omissa quanto à possibilidade de rescisão contratual por falta grave do empregado, mas que, no seu entender, deve ser aplicado subsidiariamente o artigo 482 da CLT. Como exemplos de ato de improbidade, motivador da justa causa, ele cita, além do furto e roubo, a manipulação de resultados de loteria e a falsa denúncia de sequestro relâmpago para justificar falta a treinamento. Ele citou, ainda, casos de abandono de emprego, caracterizado por atos positivos; de indisciplina e insubordinação; de condenação criminal; ofensas físicas e morais contra a entidade e seus dirigentes; de atos lesivos da honra e boa fama, considerando que a imagem do atleta está ligada à imagem da agremiação da qual participa.

Como exemplos de incontinência de conduta, o desembargador citou a vida desregrada, falta de pudor, uso de palavras e atos obscenos, declarações impensadas à imprensa, que possam atentar contra a união do grupo. Alexandre Belmonte, porém, adverte que o poder disciplinar deve ser exercido como forma de demonstrar o repúdio da entidade à conduta do atleta, visando restabelecer, quando possível, o fiel cumprimento do contrato. Segundo ele, o exercício do poder disciplinar é necessário para manter a ordem interna, mas a entidade responde pelos abusos que cometer, e lembra que são cabíveis, a título de sansão disciplinar: advertência, censura escrita, suspensão e a despedida por justa causa.

Poder disciplinar do empregador e direito de imagem do atleta foram debatidos na tarde de encerramento de Encontro (imagem 2)

Patrocínio no Direito Desportivo: Limites e Ingerência no vinculo de emprego

O Juiz do Trabalho Gilmar Carneiro, da 5ª Região (Bahia), começou sua palestra criticando os clubes de futebol brasileiros, cujos contratos de patrocínio têm cláusula de confidencialidade (ao contrário do que ocorre na Europa), em razão do que é difícil saber o efetivo nível de ingerência dos patrocinadores nos contratos dos atletas profissionais. O magistrado critica duramente os atletas de grandes clubes, que, de forma consciente, firmam contrato com baixo salário e irreal valor a título de imagem para pagar menos Imposto de Renda, e depois reclamam a incidência do valor no FGTS, férias, 13º salário etc. Nesse caso, as entidades de prática desportiva "ganham" pela sonegação da incidência do salário "extra-folha" sobre tais parcelas. Mas, especificamente quanto ao patrocínio, o magistrado esclarece que, segundo o artigo 3º, parágrafo único, inciso II da Lei Pelé, ele somente é permitido para os atletas não profissionais.

Sobre o Direito de Imagem, geralmente lançado indevidamente para cobrir parte dos grandes salários, o juiz questiona quem o estabelece, se o empregador ou o patrocinador, ou o próprio atleta. Ele citou o caso do atacante Fred, do Fluminense, que assinou o contrato na sede da Unimed, patrocinadora do clube. Ainda sobre a interferência do patrocinador, ele afirmou que nos contratos do Flamengo, após o caso Bruno, há uma cláusula que obriga o atleta a honrar a imagem e o bom nome do clube e de seus patrocinadores.

Lembrando o princípio da autonomia da vontade para a livre estipulação das partes interessadas em tudo que não contrarie as disposições de proteção do trabalho, os contratos coletivos e as decisões de autoridades competentes, ele pergunta se não está na hora de cobrarmos um pouco mais também dos trabalhadores, geralmente assistidos por agentes e empresários, por assinarem contrato de forma consciente, sabendo que, lá na frente, o que foi disposto não prevalece.

O último painel do encontro foi mediado pelo Juiz Marcelo Segato, da Justiça do Trabalho de Minas, que passou pelas categorias de base do América, Cruzeiro e Flamengo. Ele lembrou que alguns familiares distantes, ao ficarem sabendo que se tornou juiz, imaginaram que fosse árbitro de futebol, em razão do seu passado de jogador, e lamentaram a mudança, reconhecendo que ele era muito bom de bola.

Poder disciplinar do empregador e direito de imagem do atleta foram debatidos na tarde de encerramento de Encontro (imagem 3)

Acréscimos Remuneratórios

Coube ao advogado Afonso Celso Raso, professor titular de Direito do Trabalho da UNA, falar sobre os acréscimos remuneratórios. Antes, porém, ele contestou a aplicação da CLT ao contrato do atleta profissional, sob alegação de que o jogador de futebol não é um trabalhador comum; que é imensa a disparidade salarial entre um e outro; que as condições de trabalho são diferentes, assim como as obrigações dos clubes são diversas das do empregador comum. Ele argumenta que a própria lei de regência dessa relação estabelece que o contrato do atleta profissional é um contrato especial.

O advogado, que também é dirigente de um clube tradicional da capital, não concorda que o tempo de concentração e de viagem seja considerado como se de trabalho fosse por estar o atleta à disposição do empregador. Segundo ele, nas concentrações os atletas têm mais lazer que obrigações para com o clube, e que, se viagem for considerada tempo de trabalho, o atleta vai trabalhar 25 horas por dia, em face da redução ficta da hora noturna. Para ele, as condições dos atletas são especiais, daí porque suas relações contratuais devem ser analisadas de forma excepcional, e deve ser observado, sempre o princípio da razoabilidade.

Afonso Celso Raso ainda questiona se alimentação e habitação dadas ao atleta com habitualidade não vão ser consideradas também salário in natura . Por outro lado, elogiou a conduta do Ministério Público do Trabalho, que exerceu uma fiscalização construtiva nas categorias de base dos clubes. Finalizando, agradeceu o Ministro Carlos Alberto Reis de Paula pelas manifestações de amor ao América.

Direito de Imagem e Direito de Arena após a Lei 12.395/11

Abordando o tema acima, o secretário-geral da OAB-MG e presidente do Tribunal de Justiça Desportiva de Minas Gerais, o advogado Sérgio Murilo Diniz Braga elucidou que no Brasil existem 210 mil atletas de futebol registrados, dos quais, apenas 1% atuam nas séries A, B e C do campeonato brasileiro, logo 99% desses atletas recebem salários baixíssimos, muitas vezes apenas durante um período do ano. A esses, segundo Sérgio, os direitos de Arena e Imagem não beneficiam. Eles são trabalhadores comuns. E quem está no alojamento, mesmo das categorias de base, é o pobre, o miserável, que precisa de amparo. O advogado entende que esses meninos precisam ser tirados das ruas o quanto antes, para serem formados homens e atletas, até porque, nos dias atuais, não dá para iniciar a formação de um atleta aos 14/15 anos de idade, pois futebol, hoje, é coisa de profissional.

Sobre o direito de imagem, especificamente, ele fala da sua proteção, constitucional e no Código civil, como um dos direitos da personalidade. O direito ao uso da imagem do atleta pode ser por ele cedido ou explorado mediante ajuste contratual de natureza civil, com fixação de direitos, deveres, e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo. A exceção, de acordo com ele, é a fraude, muito usual para benefício das partes. A respeito do direito de Arena, ele sustenta que é exclusivo das entidades de prática desportiva, de acordo com o parágrafo segundo do art. 42 da Lei Pelé. Distinguindo um direito do outro, Sérgio explica que o Direito de arena não diferencia um atleta do outro. Todos recebem 5% do valor recebido pelo clube, sendo que o percentual recebido tem natureza salarial. Diversamente, o direito de imagem é personalíssimo, individual, cada atleta pode firmar contrato com o clube e/ou seus parceiros ou com quem melhor lhe interessar.

Poder disciplinar do empregador e direito de imagem do atleta foram debatidos na tarde de encerramento de Encontro (imagem 4)
Fotos: Madson Morais

Avaliações

Para o desembargador Paulo Roberto Sifuentes Costa, coordenador-geral do evento, a avaliação do Encontro é a mais positiva possível, não só pelo aspecto de grande participação dos operadores do Direito de Minas Gerais, no concernente ao direito Desportivo do Trabalho, como também pelo congraçamento entre juízes, advogados, procuradores do trabalho e estudantes. "Os painelistas trataram os temas mais importantes ligados às alterações promovidas na Lei Pelé de maneira instigante, de modo a levar à reflexão dos participantes do evento, o que vai resultar em reflexos na jurisprudência sobre o tema", avaliou o desembargador.

O advogado trabalhista, compositor, poeta e ilusionista Leopoldo Santana, por sua vez, ficou positivamente surpreso com a grandiosidade do Encontro. "Não esperava tanto, por ser um tema relativamente novo, quase desconhecido da maioria. São superpositivas iniciativas desse porte. Aproveito o ensejo para sugerir a realização de um encontro focado nos direitos dos artistas, tratando de vínculo empregatício e direitos autorais, entre outros."

Ao final dos painéis, foram sorteados brindes oferecidos por clubes mineiros de futebol.

O Encontro Mineiro de Direito Desportivo Trabalhista é uma realização do TRT-MG, por meio de sua Escola Judicial, com apoio do Ministério do Esporte, do Governo de Minas Gerais, do MPT/MG, da Amatra3, da OAB/MG, da Escola Superior de Advocacia da OAB/MG, da Abrat, da Amat, do Instituto Mineiro de Direito Desportivo e da Asttter.

Para assistir à matéria sobre o Encontro Mineiro de Direito Desportivo Trabalhista, produzida pela equipe da TVTRT-MG, clique aqui . (Walter Salles)

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