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Atlético e Cruzeiro falam a mesma língua sobre polêmicas dos contratos de jogador de futebol

publicado: 08/05/2014 às 16h53 | modificado: 08/05/2014 às 19h53

Distante da paixão dos gramados e arquibancadas dos campos de futebol, dirigentes e advogados dos clubes brasileiros sofrem no dia a dia com as incertezas jurídicas provocadas pela Lei 6.915/98, que institui normas gerais sobre o desporto, disciplinando, inclusive o contrato do atleta profissional de futebol. As questões polêmicas desses contratos foram debatidas em movimentado clássico entre Atlético e Cruzeiro, na manhã desta sexta-feira, dia 8, no III Congresso de Direito Material e Processual do Trabalho e I Congresso Latino-Americano de Direito Material e Processual do Trabalho, que são realizados no Museu de Ciências Naturais da PUC Minas, em Belo Horizonte. Nas brincadeiras, a rivalidade. Sobre as polêmicas, perfeita afinidade.

Atlético e Cruzeiro falam a mesma língua sobre polêmicas dos contratos de jogador de futebol (imagem 1)
Na mesa, o professor Davidson Malacco, advogado trabalhista e coordenador do Conselho Docente; o advogado do Atlético, Lucas Thadeu de Aguiar Ottoni; desembargador Fernando Rios Neto; Fabiano de Oliveira Costa, advogado do Cruzeiro; e Lázaro Cândido da Cunha, diretor jurídico do Atlético

O clima, que já era de plena camaradagem entre o palestrante Lucas Thadeu de Aguiar Ottoni, advogado do Atlético, e o debatedor Fabiano de Oliveira Costa, advogado do Cruzeiro, ficou ainda mais descontraído quando o desembargador do TRT-MG, Fernando Rios Neto, mediador dos debates, observou que, dos integrantes da mesa, apenas Fabiano é cruzeirense, e o diretor jurídico do Atlético, advogado Lázaro Cândido da Cunha, arrancou risadas de parte da plateia ao afirmar que é católico e, por isso, homenageava o Papa, em clara alusão à derrota do Cruzeiro para o clube do Sumo Pontífice, na noite de ontem, pela Libertadores. As brincadeiras tiveram continuidade com o advogado atleticano Lucas Thadeu de Aguiar Ottoni, ao introduzir em sua palestra provocações divertidas, envolvendo hipotéticas situações contratuais de atletas, nefastas ao clube estrelado.

Na abordagem das questões polêmicas dos contratos, Lucas afirmou que a dificuldade começa com a falta de cursos e a reduzida doutrina sobre Direito Desportivo. As maiores preocupações que demonstrou, no entanto, foi com a perda de atletas da base para outros clubes e com a proibição de contratação de atletas de idade inferior a 14 anos, determinada pela Justiça do Trabalho de Minas, ao conceder tutela inibitória pedida pela Procuradoria Regional do Trabalho. No caso da perda de atletas, o receio se justifica, segundo o advogado, uma vez que Corte Arbitral do Esporte, que julga, em 2ª Instância, litígios sobre essas transferências, tem relativizado o valor da cláusula contratualindenizatória, prevista na lei para o caso de rompimento do contrato por iniciativa do atleta. Já proibição de contratação de menores de 14 anos seria um equívoco, por inviabilizar o sonho de muitas adolescentes, já que a fase mais importante de maturação do atleta de base é dos 11 aos 13 anos. Além disso, o clube oferece aos jovens excelente estrutura, além de escola, transporte e toda espécie de assistência necessária para a idade. O advogado alvinegro também criticou o excesso de exigências para o clube ser considerado formador de atletas.

O advogado do time celeste, Fabiano de Oliveira Costa, não fugiu à dividida. Disse que seis cadeiras da mesa, com um cruzeirense, fazem lembrar um placar de 6 a 1, imposto por seu time ao clube rival. Disse também que a derrota na Argentina não passou de acidente, pois o time do Papa não pode fazer frente a um clube papa-títulos, tricampeão brasileiro, bicampeão das Américas, tricampeão da supercopa dos campeões da Libertadores da América e tetracampeão da Copa do Brasil. E aproveitou o recente centenário do Atlético para lhe desejar, no século recém iniciado, as mesmas glórias do anterior, restritas a apenas um título.

Passando ao tema objeto do debate, Fabiano taxou a Lei Pelé de absurda, esdrúxula, de difícil aplicação, por ser cheia de contradições, que colocam no limbo os atores da atividade desportiva. "As controvérsias dessa lei causam insegurança jurídica e empurram as partes para o Judiciário", afirmou o advogado, que reconhece, no entanto, a eliminação de parte dos graves equívocos da lei, por meio de 11 alterações promovidas ao longo do tempo, destacando, entre elas, a substituição, em 2011, da cláusula penal pelas cláusulas indenizatória e compensatória, a primeira, para o rompimento do contrato por iniciativa do atleta, e a segunda, por iniciativa do clube.

O advogado do Cruzeiro também concordou com as críticas do advogado do Atlético em relação à proibição da contratação de menores de 14 anos, bem como a respeito das exigências impostas aos clubes formadores. E, fazendo coro com o colega, disse que os atletas que têm ótimos salários não podem ser tratados como hipossufientes, tal qual um trabalhador comum. Segundo Fabiano, esses atletas são representados por excelentes advogados, que muitas vezes querem impor regras contratuais não acobertadas pela legislação. Como exemplo, citou a formulação de dois contratos, um de valor menor, como salário, e outro, em nome de uma empresa, como se fosse de Direito de Imagem, para pagar menos impostos, e daí a pouco, sem nenhum pudor, recorre-se ao Judiciário pedindo o reconhecimento da natureza salarial do valor pago à empresa e pedindo os direitos daí resultantes. O advogado citou, por fim, a exigência do seguro obrigatório, que, da forma original, não tinha como ser contratado, uma vez que não houve regulamentação, e mesmo agora, com a substituição para o seguro desportivo, não tem boa perspectiva quanto à sua viabilidade prática.

A palestra foi prestigiada por magistrados, servidores e profissionais das instituições promotoras e apoiadoras, entre estas o TRT-MG e sua Escola Judicial, além de professores, advogados e estudantes. (Walter Salles - Fotos: Madson Morais) )

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