Audiência pública discute ônus da prova na responsabilidade subsidiária de ente público
Na última sexta-feira (16), o TRT-MG recebeu representantes de entidades sindicais, OAB/MG, Ministério Público do Trabalho, Procuradoria Federal, empresas e órgãos públicos, como Cemig e Copasa, além de representante do Estado de Minas Gerais e advogados em geral, em audiência pública destinada a ouvir depoimentos dos especialistas e esclarecer circunstâncias de fatos ligados ao tema: “RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. TERCEIRIZAÇÃO. ENTE PÚBLICO. FISCALIZAÇÃO. ÔNUS DA PROVA”.
O objetivo da audiência, presidida pelo desembargador José Eduardo de Resende Chaves Júnior, foi colher subsídios para o julgamento do Incidente de Uniformização de Jurisprudência (IUJ) nº 0011608-93.2017.5.03.0000, no qual se firmará Súmula ou Tese Jurídica Prevalecente (a depender do quórum) sobre a matéria relativa ao ônus da prova, nos casos em que se pretende responsabilizar subsidiariamente o ente público em demandas envolvendo terceirização de serviços, sob a acusação de “culpa in vigilando”, ou seja, por não ter fiscalizado a empresa contratada quanto ao pagamento dos direitos trabalhistas daqueles que lhes prestaram serviços.
Seria da administração pública o ônus de provar que fiscalizou devidamente a empresa (hipótese em que estará desonerada da responsabilidade subsidiária, nos termos do entendimento firmado pelo STF no julgamento do RE 760.931/DF), ou é o trabalhador/reclamante quem tem de provar que o ente público ao qual prestou serviços não cumpriu com seu dever de fiscalizar e, portanto, deve ser responsabilizado pelo pagamento das verbas trabalhistas a ele devidas, em caso de inadimplência da empresa contratada, sua empregadora?
Cada expositor inscrito teve 10 minutos para expor seus argumentos, podendo também apresentar suas razões por escrito, via PJe, no prazo de 10 dias.
O representante do MPT, procurador Hélder Santos Amorim, manifestou-se no sentido de que a responsabilidade do ente público é ampla e irrestrita, devendo valer aí o princípio da aptidão da prova, pelo qual o ônus probatório compete à parte que tiver condições de produzí-la. E, nesse ponto, argumenta que o trabalhador não tem acesso à fiscalização do contrato do Poder Público e, portanto, não está apto a apresentar essa prova sobre a fiscalização do contrato entre o ente público e a prestadora de serviço. O ônus probatório, então, iria mesmo para o ente público. Nessa mesma linha se posicionou o representante da OAB e da Associação Mineira de Advogados Trabalhistas (Amat), advogado Humberto Marcial Fonseca.
Também se pronunciaram, nesse sentido, os representantes do Sindicato dos Empregados em Edifícios e Condomínios, em empresas de Prestação de Serviços em Asseio, Conservação, Higienização, Desinsetização, Portaria, Vigia e dos Cabineiros de Belo Horizonte (Sindeac), Federação dos Empregados em Turismo e Hospitalidade do Estado de Minas Gerais (Fethemg) e do Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações de Minas Gerais (Sinttel). Eles argumentaram que os trabalhadores têm sido surpreendidos com fechamento de empresas sem pagamento de direitos trabalhistas, situação que transfere o risco desse tipo de contrato para o empregado. E denunciaram que, muitas vezes, no processo licitatório os preços contratados não são compatíveis com o gerenciamento do negócio, o que leva à inadimplência trabalhista.
Salientaram ainda que a parte documental apresentada no processo pelo ente público pode estar perfeita, mas, na prática, isso não significa que a fiscalização foi feita. Assim, defendem que, mesmo que a Administração não fique sabendo das irregularidades, o próprio inadimplemento trabalhista verificado no processo caracteriza, por si, a falta de fiscalização.
Em posição contrária, o procurador Federal no Estado de Minas Gerais, Davi Monteiro Diniz, manifestou o entendimento de que o ente público não pode ser equiparado a uma empresa privada, até porque tem limites nessa fiscalização, já que não detém todos os elementos dos contratos firmados entre a empresa e o trabalhador. Com ele concordou o representante do Estado de Minas Gerais, Geraldo Ildebrando de Andrade, para quem o fato de a verba não ter sido quitada pelo ente privado não dá direito ao trabalhador de transportar ao ente público a responsabilidade subsidiária porque, com isso, estaria sendo retirado do empregador privado a sua responsabilidade e os encargos do negócio. Assim, também entende que é do trabalhador o ônus da apresentação de prova concreta da falta de fiscalização para que haja a responsabilização do ente público.
O representante da Procuradoria Federal no Estado de Minas Gerais, Bráulio Lisboa Lopes, lembrou que o ente público tem feito a fiscalização, inclusive com várias rescisões de contratos com empresas privadas.
Para a representante da Cemig, advogada Raquel Passos, também absolutamente contrária à inversão do ônus da prova, a situação é muito preocupante, ante o grande número de ações e decisões declarando a responsabilidade subsidiária da empresa. Ela questiona o fato de que, em geral, a responsabilidade da Administração Pública tem sido definida nas ações como objetiva, deixando de se analisar a culpa subjetiva. Assim, a empresa paga duplamente pelo mesmo serviço, o que acaba caindo nas costas do contribuinte do Estado.
Participaram ainda da audiência pública, como ouvintes, representantes da Procuradoria-Geral do Município de Belo Horizonte, da Gasmig, do Sejur, do Hospital das Clínicas/UFMG, da Codemig, da Procuradoria da Fazenda Nacional em Minas Gerais, da AGU, da Procuradoria da União de vários escritórios de advocacia da Capital mineira.
Agora é aguardar o julgamento o IUJ, que tem como relator o desembargador José Eduardo de Resende Chaves Júnior, para que, levando em conta os argumentos expostos, proceda-se à ampla discussão sobre a matéria, firmando-se, ao fim, a Súmula ou TJP sobre o tema, com base no entendimento dominante entre os magistrados do TRT-MG. (Margarida Lages)