Justiça afasta justa causa de empregado dependente químico que se recusou a participar de programa de prevenção de álcool e entorpecentes
Resumo em texto simplificado
Um empregado dependente químico foi dispensado por justa causa após recusar participar de um programa de prevenção contra álcool e entorpecentes. A empregadora, uma mineradora, havia aplicado advertência e suspensão antes da justa causa. No entanto, a Primeira Turma do TRT-MG, acompanhando o voto do desembargador Luiz Otávio Linhares Renault, não validou a dispensa, reconhecendo que, por ser dependente químico, a demissão foi sem justa causa. Em agosto de 2016, o trabalhador recusou tratamento e foi advertido; em janeiro de 2018, recusou novamente e foi suspenso; e, em junho de 2018, após testar positivo para álcool, foi demitido. A decisão de primeira instância que considerou lícita a dispensa foi reformada em segundo grau, destacando que a dependência química impede a justa causa.
Saiba mais sobre esta iniciativaO empregado era dependente químico e foi dispensado por justa causa após se recusar a participar de programa de prevenção contra álcool e entorpecentes. A empregadora, uma mineradora, já havia aplicado sanções disciplinares mais brandas pelo mesmo motivo, uma advertência e uma suspensão, até que, por fim, decidiu se valer da mais grave penalidade a ser imposta ao trabalhador: a justa causa.
Mas o que, a princípio, poderia parecer um caminho procedimental na aplicação de penalidades gradativas, com o objetivo de recuperar o empregado, até culminar com a dispensa por justa causa, não foi validado pelos julgadores da Primeira Turma do TRT-MG, por envolver empregado dependente químico. Acompanhando o voto do desembargador Luiz Otávio Linhares Renault, como relator, os integrantes do colegiado deram provimento ao recurso dos familiares do trabalhador, falecido no curso do processo, para reconhecer que a despedida foi, na verdade, sem justa causa.
A prova documental revelou que, em agosto de 2016, o falecido se recusou a submeter-se a tratamento de prevenção de uso de álcool e entorpecentes ofertado pela empregadora, o que resultou em punição disciplinar, advertência.
Em janeiro de 2018, novamente, o trabalhador recusou tratamento disponibilizado pela empresa, através do programa de prevenção ao uso de álcool e entorpecentes (PPAE). Por esse motivo, a empresa aplicou-lhe a penalidade de suspensão de três dias de trabalho, por ato de insubordinação.
Em 4/6/2018, o empregado testou positivo no teste de ar expirado em etilômetro e, mais uma vez, recusou-se a participar do tratamento ofertado pela empregadora, para prevenção ao uso de álcool e entorpecentes. Dessa vez, a empregadora decidiu dispensá-lo por justa causa, nos termos do artigo 482, "h", da CLT (ato de indisciplina ou de insubordinação).
Inconformado, o trabalhador ingressou em juízo para tentar reverter a medida, mas o juízo da Vara do Trabalho de Congonhas considerou lícita a dispensa e julgou improcedentes os pedidos. Na sentença, constou, inclusive, que a empresa poderia ter aplicado a penalidade de imediato diante da falta praticada, mas ainda assim observou a gradação do exercício do poder disciplinar, conferindo ao empregado a oportunidade de reabilitação.
Entretanto, em grau de recurso, o relator colegiado de segundo grau chegou a conclusão diversa. Isso porque ficou evidenciado que o empregado era viciado em álcool, tanto que as punições foram todas calcadas nesse fato, o que impede a aplicação da justa causa.
“Via de regra, o dependente químico, álcool ou qualquer outro tipo de droga entorpecente, recusa-se a participar de programas de recuperação, vedados sendo o tratamento ou a internação compulsórias, de modo que a recusa do reclamante à submissão ao atendimento do Programa de Prevenção para o Álcool e Entorpecentes não poderia, associada à outra situação de positividade no teste de ar expirado em etilômetro, servir de fundamento para a dispensa por justa causa”, ponderou no voto condutor.
Para complementar os fundamentos da decisão, o relator citou jurisprudência do TRT da 3ª Região no sentido de que o alcoolismo crônico se trata de doença e não deve dar ensejo à justa causa. O correto seria o empregador encaminhar o empregado para tratamento médico junto ao INSS.
DISPENSA POR JUSTA CAUSA - EMBRIAGUEZ - ARTIGO 482, "f", DA CLT. A jurisprudência vinha se firmando no sentido de que a embriaguez em serviço não precisaria se repetir para autorizar a dispensa por justa causa. No entanto, atualmente, quando de tal prática pelo empregado, vários fatores devem ser considerados. O avanço da ciência, no campo da medicina, evidenciou que o alcoolismo consiste em uma doença, da qual não se tem que culpar o indivíduo, paciente por dependência química e não moral. Assim, ao tomar conhecimento da embriaguez do empregado, em serviço, ou não (artigo 482/CLT), caberá ao empregador encaminhá-lo a tratamento e obtenção de licença médica, que naturalmente será concedida, se necessária. Passando-o à responsabilidade do Estado, obstará eventuais prejuízos que o empregado pudesse, com a sua doença, acarretar ao empreendimento ou aos seus colegas de trabalho. Processo 00140-2004-072-03-00-7 RO Data de Publicação 15/06/2004 Órgão Julgador Quarta Turma Relator Antônio Álvares da Silva.
ALCOOLISMO. DISCRIMINAÇÃO. INVALIDADE DA DISPENSA. REINTEGRAÇÃO. Considerando que o autor era portador de alcoolismo crônico (doença formalmente reconhecida pelo Código Internacional de Doenças (CID) da Organização Mundial de Saúde - OMS), caberia à reclamada proceder à suspensão do contrato de trabalho, seguida de encaminhamento do empregado ao INSS. Contudo, a empresa ré tratou a referida doença como desvio de conduta justificador de rescisão do contrato de trabalho, impondo-se, assim, o reconhecimento da invalidade da dispensa. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego. Precedentes deste E. Regional e do C. TST. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010260-04.2017.5.03.0012 (AP); Disponibilização: 26/02/2018, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 719; Órgão Julgador: Quarta Turma; Relator: Maria Lucia Cardoso Magalhaes).
Nesse contexto, após considerar inválida a dispensa por justa causa e reconhecer que a despedida foi sem justa causa, o relator condenou a mineradora a pagar aviso-prévio, 13º salário, férias acrescidas de 1/3 e indenização de 40% do FGTS. Atualmente, o processo aguarda decisão de admissibilidade do recurso de revista.