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Veja a história do pai do Presidente do TRT-MG que foi vítima de aliciadores e forçado a trabalhar como escravo

publicado: 23/07/2017 às 00h00 | modificado: 24/07/2017 às 16h34

Na abertura do evento, o desembargador Júlio Bernardo do Carmo surpreendeu e sensibilizou a plateia ao relatar uma história verdadeira vivida por seu pai, João Barbosa do Carmo, que, aos 19 anos de idade, foi seduzido por uma falsa promessa de trabalho e acabou prisioneiro em um verdadeiro campo de trabalhos forçados. Ele trabalhava na Guarda Municipal do Rio de Janeiro, com soldo baixo e tendo de lidar de forma inadequada com os constantes perigos da atividade. Cansado dessa vida perigosa, seu pai ouviu dizer que um fazendeiro estava recrutando trabalhadores rurais para sua fazenda em local muito distante, não se sabia muito bem onde. Assim, ele pediu exoneração e partiu em busca de melhores condições de vida e trabalho. A promessa era irrecusável: salário muito bom, alimentação sadia, alojamento bem construído, de forma que conseguiria, depois de um ano ou mais, amealhar um bom “pé de meia”.

Logo, partiu de caminhão, em longa viagem, juntamente com outros trabalhadores. Mas a decepção foi imediata: mansardas escuras de pau a pique, na qual trabalhadores dormiam no chão, sem cobertores ou roupas de cama adequadas. O lanche era um café ralo com um pouco de farinha de mandioca, entremeadas com tiras de carne seca. Capangas do fazendeiro se posicionavam armados nos quatro cantos da fazenda, intimidando os trabalhadores e impedindo a fuga. Os documentos pessoais foram recolhidos. A alimentação fraca vinha de um armazém da fazenda, vendidos a preços exorbitantes. As condições de higiene eram degradantes, faziam as necessidades no mato e se valiam de folhas de bananeira, sempre sob o olhar atento do capanga da fazenda. Era preciso pagar pelos instrumentos de trabalho, que eram de responsabilidade de cada um. No final de cada mês, descontadas todas as despesas, diziam que a sobra iria constituir o pecúlio, o “pé de meia” que receberiam ao final do contrato de trabalho.

Feitas as contas, o jovem João Barbosa rapidamente concluiu que iria passar a vida toda ali como verdadeiro escravo. Depois de trabalhar seis meses arduamente e sem merecer nenhuma queixa por parte dos “gatos”, o pai passou a ser bem visto pelos turmeiros. A partir daí, quando se recolhia para dormir, seu pai passou a ouvir, amedrontado o rugir da onça no mato. E todo esse contexto fez com que ele passasse a arquitetar uma forma de fugir daquele inferno e libertar-se da escravidão. Ao cair de uma noite bem escura, aproveitando-se da distração dos capangas, que bebiam pinga e se aqueciam em torno de uma fogueira, Seu João tomou coragem e embrenhou-se mata adentro: correu horas e horas a fio. Em certa altura, passou a ouvir o ladrar dos cães de guarda sendo espalhados pelo mato. Mas a sua ânsia de liberdade era muito maior. E quando seus pés não mais aguentavam a empreitada, já banhados em sangue, atingiu, finalmente, uma estrada vicinal. Depois de algum tempo conseguiu carona em um caminhão, chegando ao Rio de Janeiro vários dias depois. E sua cabeça foi logo povoada com o sonho de uma vida melhor.

Diante dessa comovente história, o desembargador ressaltou a oportunidade de, como Presidente deste Tribunal, participar desse Congresso que busca exterminar essa chaga da escravidão.

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