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Victor Russomano: As mudanças no Direito Sindical

publicado: 16/08/2017 às 08h09 | modificado: 16/08/2017 às 09h08

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Pós-graduado em Sociologia Jurídica pela UNB, o advogado Victor Russomano Júnior iniciou sua fala criticando o que chama de “esquizofrenia na jurisprudência trabalhista”. Para explicar, ele exemplifica com o caso dos motoristas de caminhão que, devido a problemas de segurança na estrada e para proteção da carga, tem implantados em seus veículos sistemas de controle por satélite, como GPS e, às vezes, até escolta de helicóptero. Empresa e sindicato realizam acordo estabelecendo que esses mecanismos não implicam em controle de jornada (o que exclui esses trabalhadores do regime de jornada previsto no art. 62 da CLT), mas estabelecem um total fixo de 60 horas extras para todos os motoristas submetidos a essa situação, façam eles ou não horas extras. Mas daí vem o TST e declara a invalidade da cláusula do acordo coletivo, entendendo que os equipamentos de segurança implicam, sim, controle de jornada e que, se a situação contraria a lei, não poderia ser negociada. “Isso é esquizofrenia”, dispara o advogado, observando que a jurisprudência trabalhista coloca um limite na negociação coletiva que a Constituição de 1988 não impõe, pois a ela confere amplo poder e liberdade.

Ao comentar sobre o que mudou na legislação trabalhista, ele afirma: “O Direito do Trabalho não está em seu leito de morte. Ele subsiste em seus princípios fundamentais, prevalece na maioria de suas normas preservadas. O que não prevalece é aplicar o DT dessa forma esquizofrênica ou de forma que permita a ampla desregulamentação”, completa, dizendo que esse equilíbrio precisa ser buscado fora das amarras ideológicas que têm afetado a discussão da matéria.

O palestrante alerta que a interpretação das normas pautada por critérios ideológicos leva, por vezes, a decisões absurdas, como muitas de que se tem notícia. Segundo ele, mais que nunca é preciso equilíbrio e isenção para se aplicar a lei com razoabilidade. E isso a nova legislação vai permitir.

Em outro exemplo citado, um Banco estatal, que vinha de duas décadas de prejuízo, foi privatizado e passou a ter lucro. Nesse processo, foi feita uma alteração no contrato de trabalho dos empregados, por negociação coletiva, para que fossem absorvidos pelo novo empregador. Embora aparentemente a alteração tenha sido prejudicial a eles, na prática, a privatização trouxe várias vantagens ao conjunto dos empregados e isso foi reconhecido pelo TST que declarou a validade da negociação e passou a negar provimento às ações individuais que tentavam desconstituí-lo. “É essa razoabilidade que se espera na aplicação das leis a partir da reforma”, pondera Russomano.

De acordo com o advogado, é preciso aguardar os efeitos da nova legislação sobre a realidade concreta para se fazer um juízo de valor sobre as vantagens e desvantagens dessa reforma. Quanto às alegadas inconstitucionalidades, completou, só o STF é quem vai dizer se existem ou não, e invalidar as que assim forem. Com isso, ele faz dura crítica ao que chama de “jurisprudência de resistência” que, segundo rumores na mídia, parte da magistratura trabalhista anuncia que vai fazer. “Ou seja, por critérios ideológicos, já se prejulga a reforma, antes mesmo do julgamento de constitucionalidade”,arremata.

“Estamos numa fase de alteração do sistema jurídico. Estamos nos aproximando do sistema dos precedentes da common law.  Essa jurisprudência que será construída a partir do julgamento dos dispositivos nos casos concretos, chegando ao TST e ao STF, é que vai dizer do alcance da reforma”, frisou.

Ao longo de toda a sua fala, Russomano clama pelo abandono dos critérios ideológicos em prol do equilíbrio e de uma visão dos interesses nacionais para que se entenda o que foi proposto na reforma. Segundo explica, não havia, por exemplo, na legislação um critério seguro para que o empregador pudesse premiar o mérito e a produtividade do empregado porque sempre havia o risco dos pedidos de equiparação, com decisões que criavam verdadeiras anomalias em termos de padrões salariais, deferindo diferenças astronômicas para alguns empregados. Para Russomano, agora que isso vai para a negociação coletiva é a chance de essa anomalia ser corrigida. A ideia é evitar situações como a de uma indústria têxtil brasileira que, mesmo concorrendo com empresas estrangeiras que produzem a um custo 40% mais baixo, forneça alimentação ao trabalhador e ainda seja penalizada com a condenação ao pagamento de horas extras pelo tempo que o trabalhador gastou no deslocamento até o refeitório. “É isso  o que se tem de evitar” , pondera, e finaliza dizendo que é preciso aplicar a reforma com equilíbrio e bom senso, sem questionamentos ideológicos.

Por fim, o palestrante frisa que não se trata de desregulamentação e que o Direito do Trabalho não corre risco de extinção: “Ele tem de ser flexibilizado e atualizado. Essa reforma tem de ser acoplada a uma reforma da organização sindical, eliminando-se o mono-sindicalismo obrigatório, para que o sindicato tenha representatividade e legitimidade para realizar o instrumento coletivo em prol dos interesses reais dos trabalhadores. E isso será julgado por magistrados isentos, com base nas normas do Direito do Trabalho, e não com base em critérios ideológicos. Se assim feito, a reforma será, aí sim, usada em prol dos trabalhadores, e servirá de instrumento de modernização do Estado e de crescimento do País. Essa é a única saída, esse é o único caminho”, conclui.

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