Respeito e acolhimento salvam vidas: a prevenção começa na inclusão!
O Setembro Amarelo é um período dedicado à conscientização sobre a saúde mental e a prevenção ao suicídio. Essa reflexão, no entanto, não deve se restringir à dimensão individual. É necessário compreender que a saúde mental é também um fenômeno coletivo, influenciado por fatores sociais, organizacionais e institucionais.
No contexto laboral, relações marcadas por discriminação, assédio ou exclusão não apenas violam direitos fundamentais, como também funcionam como gatilhos de adoecimento emocional, podendo levar a desfechos extremos, como o suicídio.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o suicídio é a quarta principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos. O ambiente de trabalho pode atuar como fator de risco, quando hostil e discriminatório, ou como fator de proteção, quando baseado em respeito, acolhimento e inclusão.
Prevenir o suicídio exige, portanto, uma transformação institucional: combater a discriminação e o assédio é também proteger a saúde mental coletiva.
Discriminação: fator de risco psicossocial institucional
A discriminação caracteriza-se pelo tratamento desigual, desrespeitoso ou excludente dirigido a uma pessoa ou grupo em razão de características como gênero, raça, etnia, orientação sexual, identidade de gênero, idade, deficiência, religião ou origem social. No ambiente de trabalho, pode manifestar-se de modo explícito (agressões verbais, exclusões deliberadas, recusa injustificada de oportunidades) ou de forma sutil, por meio de microagressões, condutas repetidas e normalizadas, frequentemente apresentadas como “brincadeiras” ou “opiniões”, mas que comunicam inferiorização, desvalorização ou exclusão, tais como:
- Interrupções sistemáticas e desvalorização de ideias: interromper repetidamente a fala de um colega durante reuniões, desconsiderar ou minimizar suas sugestões e só reconhecer uma proposta quando apresentada por outra pessoa, reforçando a invisibilização de sua contribuição.
- Presunção de incapacidade: assumir, sem qualquer evidência, que alguém não possui competência para executar determinada tarefa, como delegar exclusivamente atividades simples a uma pessoa, desconsiderando suas habilidades e qualificações.
- Correções e cobranças sem critérios técnicos claros: exigir perfeccionismo extremo ou alterar constantemente entregas apenas para adequá-las a preferências pessoais, sem fundamentação normativa ou técnica, criando insegurança e desgaste emocional.
- Retrabalho imposto: determinar que tarefas corretas e finalizadas sejam refeitas, não por necessidade real, mas para reforçar autoridade hierárquica ou demonstrar poder, gerando frustração e perda de produtividade.
- Definição de metas inalcançáveis: estabelecer objetivos ou padrões desproporcionais, impossíveis de serem cumpridos, criando um ambiente de pressão psicológica e ansiedade permanente.
- Atribuição de erros a características pessoais: responsabilizar alguém por falhas vinculando-as a aspectos individuais, como afirmar que algo deu errado “por ser mulher”, “por ser jovem”, “por ser novo na equipe” ou “por ter deficiência”, reforçando estereótipos e preconceitos.
- Isolamento e exclusão velada: deixar de convidar colegas para reuniões externas, eventos institucionais ou momentos de integração, partindo da presunção de que a presença dessas pessoas causaria dificuldades, contribuindo para seu afastamento social e profissional.
- Tratamento condescendente ou infantilizador: dirigir-se a profissionais adultos em tom paternalista ou com expressões que diminuam sua capacidade, como dizer: “ele(a) é muito esforçado(a) para quem tem essa condição”, desqualificando suas competências.
- Falas depreciativas disfarçadas de elogio: comentários aparentemente positivos, mas que reforçam preconceitos, como: “você trabalha bem, apesar da sua deficiência” ou “até que você conseguiu se sair melhor do que eu imaginava”.
Esses comportamentos, embora sutis, reforçam desigualdades estruturais e prejudicam a saúde emocional da pessoa alvo, comprometendo o senso de pertencimento, a autoestima e a confiança no ambiente institucional. Quando normalizadas, tornam-se barreiras invisíveis que fragilizam toda a equipe e afetam a qualidade do serviço público.
De acordo com pesquisa da OMS (2022), trabalhadores submetidos a contextos discriminatórios têm 2,5 vezes mais risco de desenvolver depressão ou ansiedade, além de maior probabilidade de afastamento e intenção de desligamento.
A tríade tóxica: discriminação, assédio e suicídio
O suicídio não decorre de uma causa única, mas de uma rede complexa de fatores que se acumulam ao longo do tempo. Quando a discriminação não é enfrentada, ela frequentemente se conecta ao assédio, configurando uma tríade tóxica:
- Discriminação: gera desigualdade estrutural, invisibilidade e sentimento de inferioridade.
- Assédio: reforça a violência por meio de condutas sistemáticas de humilhação, perseguição ou intimidação.
- Sofrimento extremo: o indivíduo internaliza a mensagem de que "não tem valor", o que pode culminar em ideação suicida.
Esse processo leva ao chamado trauma relacional institucional, em que a pessoa perde a confiança na equipe e na organização, sentindo-se desamparada e isolada, sem ver alternativas além do afastamento ou da autodestruição.
O impacto da discriminação na saúde mental
A psicologia do trabalho e a psiquiatria organizacional identificam a discriminação como risco psicossocial de alta severidade, pois ela atua em múltiplos níveis:
Nível | Consequência emocional | Exemplo prático |
---|---|---|
Individual |
Baixa autoestima, ansiedade, depressão, culpa, ideação suicida. |
Servidor constantemente desqualificado em reuniões passa a acreditar que "não é capaz". |
Interpessoal |
Conflitos, isolamento social, dificuldade de cooperação. |
Exclusão de um colega em decisões importantes por preconceito implícito. |
Institucional |
Adoecimento coletivo, perda de talentos, queda na produtividade. |
Alta rotatividade e afastamentos por licenças médicas relacionadas ao estresse. |
De acordo com pesquisa da OMS (2022), ambientes hostis e discriminatórios custam à economia mundial mais de 1 trilhão de dólares por ano devido a afastamentos, perda de produtividade e custos com saúde.
Amparo legal e normativo
O enfrentamento à discriminação e a promoção da saúde mental no trabalho não são escolhas opcionais, mas deveres constitucionais e normativos. No âmbito do Poder Judiciário, destacam-se:
Legislação | Resumo |
---|---|
Constituição Federal de 1988 arts. 1º, III; 3º, IV; 5º, caput) | Estabelece a dignidade da pessoa humana como fundamento e proíbe qualquer forma de discriminação. |
Institui, no âmbito do Poder Judiciário, a Política de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral, do Assédio Sexual e da Discriminação. | |
Convenção nº 190 da OIT | Reconhece o assédio e a violência como violações de direitos humanos no trabalho. No Brasil, a Convenção 190 ainda não foi ratificada, mas está em processo de tramitação no Congresso Nacional. |
Essas normas reforçam o compromisso do Judiciário em promover ambientes justos, inclusivos e saudáveis, indo além da letra da lei para transformar práticas institucionais.
Estratégias institucionais de prevenção
A prevenção ao suicídio e a promoção da saúde mental não se limitam ao apoio psicológico individual. É necessário transformar a cultura organizacional, adotando medidas estruturais:
- Cultura do respeito:
- Programas contínuos de educação e sensibilização sobre diversidade e inclusão.
- Zero tolerância a práticas discriminatórias e assédio.
- Canais de escuta qualificada:
- Atendimento sigiloso, seguro e acolhedor para relatos de assédio ou discriminação.
- Fluxo claro e proteção contra retaliações.
- Lideranças capacitadas:
- Formação de gestores para identificar sinais de sofrimento emocional.
- Promoção de feedback construtivo e ambientes cooperativos.
- Apoio psicossocial institucional:
- Políticas de promoção da saúde mental coletiva.
- Incentivo a práticas de autocuidado integradas às metas organizacionais.
Reflexão coletiva: o papel de cada um
A prevenção ao suicídio começa com autocrítica e ação coletiva. Pergunte-se:
- Minhas falas e atitudes promovem o acolhimento ou reforçam barreiras invisíveis?
- Já testemunhei situações de discriminação e permaneci em silêncio?
- Tenho incentivado um ambiente onde todas as pessoas se sintam seguras para ser quem são?
Cada escolha cotidiana constrói ou destrói o senso de pertencimento. Falar sobre saúde mental é também falar sobre direitos humanos, diversidade e democracia institucional.
Onde buscar ajuda
Se você ou alguém próximo estiver passando por sofrimento emocional intenso, não hesite em buscar apoio:
- CVV – Centro de Valorização da Vida: ligue 188 ou acesse www.cvv.org.br
- TRT-MG: utilize os canais institucionais de escuta qualificada para relatar situações de assédio ou discriminação. O sigilo e a proteção são garantidos.
Compromisso do TRT-MG
O TRT-MG reafirma que combater a discriminação é também salvar vidas. Construir um ambiente laboral saudável significa garantir que cada pessoa seja reconhecida em sua dignidade e singularidade, fortalecendo a missão institucional de justiça social e cidadania. Neste Setembro Amarelo, vamos juntos transformar a cultura institucional: respeito, inclusão e saúde mental são inseparáveis.
A presente campanha integra as ações do Comitê de Ética e Integridade e dos Subcomitês de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral, do Assédio Sexual e da Discriminação do TRT-MG, em parceria com o Subcomitê de Atenção Integral à Saúde, em consonância com a Resolução CNJ nº 351, de 28 de outubro de 2020, que institui a Política de Prevenção e Enfrentamento do Assédio e da Discriminação no Poder Judiciário.