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Brumadinho um ano depois: “Todo dia é dia 25 para as vítimas”

publicado: 07/02/2020 às 20h09 | modificado: 11/02/2020 às 01h33

O TRT-MG lançou, na tarde desta sexta-feira (7), sua revista de número 100, um ano após a maior tragédia socioambiental do país, em homenagem às 270 vítimas fatais. A centésima edição aborda o tema: “Acidentes Coletivos do Trabalho: Prevenção e Reparação”, dando ênfase ao fatídico 25 de janeiro de 2019 e às medidas tomadas até então.

A abertura do evento foi feita pelo presidente do TRT-MG, desembargador José Murilo de Morais. Também compuseram a mesa de abertura a vice-presidente, desembargadora Camilla Guimarães Pereira Zeidler; a coordenadora do Comitê de Saúde e gestora regional do Programa Trabalho Seguro, desembargadora Denise Alves Horta; o gestor nacional do Programa Trabalho Seguro, desembargador Sebastião Geraldo de Oliveira; o coordenador acadêmico da Escola Judicial, juiz Cléber Lúcio de Almeida; o presidente da Amatra3, juiz Renato de Paula Amado, e o coronel do Corpo de Bombeiro de Minas Gerais, Erlon Dias do Nascimento Botelho. 

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Fotos: Leonardo Andrade

Os componentes da mesa destacaram o empenho e a mobilização do Poder Público, em especial a atuação da Justiça do Trabalho, que não tem medido esforços para sentenciar e dar retorno para a população quanto à tragédia. O presidente do TRT-MG ressaltou o acordo histórico homologado pela JT mineira no caso de Brumadinho, que teve o maior valor de indenização já pago na história envolvendo danos coletivos”. 

A vice-presidente, desembargadora Camilla Zeidler, também reafirmou que a Justiça do Trabalho não tem medido esforços. “É para mim um alento fazer parte de uma instituição que, incansavelmente, tem agido para, ao menos, atenuar os efeitos devastadores daquela calamidade”. 

O tema desta edição comemorativa da Revista do TRT-MG é, indiscutivelmente, relevante, mas, neste momento histórico, em que o rompimento da barragem construída pela mineradora Vale, em Brumadinho, acaba de completar um ano, ele assume especial importância. Mostramos que a sociedade pode sempre contar com uma Justiça do Trabalho cada vez mais forte e independente e que está, constantemente, pensando em maneiras de melhor realizar sua função jurisdicional pacificadora”, completou a desembargadora Camilla Guimarães. 

Na ocasião, Josiane Alves Melo recebeu uma singela homenagem do Tribunal, em nome de todas as vítimas de Brumadinho. 

A professora e servidora deste Tribunal, Isabela Márcia de Alcântara Fabiano, enfatizou a importância da obra. “Era indispensável tratar sobre o tema. Tudo começou porque a gente sentia que era importante divulgar decisões judiciais desta casa, referentes aos acidentes de Brumadinho, mas também de Mariana. Então a nossa tentativa com a obra é de tentar disseminar essas informações para que elas sejam úteis e ganhem ainda mais publicidade. Esperamos que, de alguma forma, essa obra seja de todos”. 

Na segunda mesa, coordenada pela psicóloga Luciana Xavier Passeado, a palestrante, psicóloga Maria Cândida Vianna, e a debatedora, professora Carolina Costa Resende, da PUC Minas, ressaltaram o estresse pós-traumático que uma tragédia pode deixar em todos os envolvidos, direta ou indiretamente. 

A psicóloga Maria Cândida definiu o estresse pós-traumático como um transtorno mental que acomete pessoas que estão expostas a situações catastróficas, em que há um risco grande de morte. 

Ela alertou para alguns sinais: “Os sintomas mais comuns são: desejo de isolamento, flashes constantes da catástrofe, desejo de autoextermínio, ansiedade, irritabilidade, tristeza, amnésia, transtorno de ansiedade. Esses são alguns dos principais, além dos sintomas físicos: pressão alta, dores na cabeça, nas pernas e dor muscular”. Quanto ao tratamento, o mais indicado é o acompanhamento com a profissional, com foco em reinserir a pessoa na sociedade. 

Para a professora Carolina, o caso de Brumadinho tem um forte agravante. “Quando a gente fala do estresse pós-traumático, é como se a gente então fosse atender as pessoas depois que o trauma passou, depois que o episódio aconteceu, e então ajudaríamos as pessoas a superar aquilo que já passou. Mas eu pergunto: e quando 25 é todos os dias, 25 de janeiro é todo dia em Brumadinho? Então não passou, é um trauma que continua”. 

Papel da Justiça do Trabalho mineira no acidente de Brumadinho

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Em seguida, teve início a palestra sobre o tema "Papel da Justiça do Trabalho mineira no acidente de Brumadinho", com os juízes Sandra Maria Generoso Thomaz Leidecker e Ordenísio César dos Santos. 

O coordenador da mesa, desembargador Sebastião Geraldo de Oliveira, disse que a Justiça do Trabalho tem conseguido conduzir a bom termo essa competência de julgar as ações referentes a Brumadinho. Ele lembrou que o maior acidente do trabalho do Brasil foi o de Brumadinho, envolvendo a Vale do Rio Doce, e o segundo também foi em Minas Gerais, no Parque da Gameleira, em que houve o desabamento do Palácio das Exposições. 

Em sua fala, a juíza Sandra Maria Generoso detalhou aspectos da ação coletiva, em que, na ocasião, era urgente mitigar o sofrimento dos envolvidos e esse foi o grande desafio da Justiça do Trabalho. Ela explicou sobre as responsabilidades civil subjetiva e objetiva nas ações e as teorias do risco-proveito e do risco criado. 

Já o juiz Ordenísio César dos Santos relembrou a participação dele na ação coletiva em que concedeu tutela antecipatória, na época, para resguardar as vítimas. “A Justiça do Trabalho é pioneira na conciliação e não conheço melhor forma de solucionar conflitos. A celeridade e eficiência nessa demanda coletiva foram marcantes, porque em julho de 2019 ela já estava encerrada”, explicou. 

E completou: “Que essas tragédias sirvam definitivamente de lição para todos nós, Estado e sociedade civil, quanto à urgente e necessária cultura da prevenção”. 

Apresentação musical

No meio do evento, o grupo musical Batucabrum, de Brumadinho, apresentou-se, trazendo um momento de descontração aos presentes. O grupo surgiu de projeto cultural e social, com o objetivo de levar cultura e alegria para as crianças e adolescentes de escolas públicas da cidade de Brumadinho, e hoje atende 150 crianças. O projeto oferece várias oficinas gratuitas para crianças entre 7 e 17 anos, como aulas de violão, confecção de instrumentos musicais, dublagem e, ainda, reforço escolar e suporte para uma alimentação saudável e equilibrada.

Como forma de agradecimento, o Batucabrum recebeu doação de leites, biscoitos e sucos. Após a tragédia, famílias atingidas pelo rompimento da barragem passaram a procurar ainda mais pelo grupo, como maneira de levar conforto ao coração das crianças.

MPT e Brumadinho 

Na palestra sobre "O olhar e as iniciativas do Ministério Público do Trabalho (MPT) voltados para o acidente de Brumadinho", o palestrante foi o procurador do MPT, Geraldo Emediato de Souza. Sob a coordenação de mesa do coordenador acadêmico da Escola Judicial do TRT-MG, juiz Cléber Lúcio de Almeida, o procurador do MPT abordou o papel do órgão na ação civil coletiva de 2019. 

Não temos o que comemorar pelos tantos estragos causados às famílias e ao meio ambiente com essa tragédia. A Fundação Renova, criada para reparar os impactos causados pelo rompimento da barragem em Mariana, não conseguiu reparar nem 10% das ações. O acordo conseguido no caso de Brumadinho não nos orgulha, mas foi o melhor acordo já feito na Justiça do Trabalho. Não há dinheiro que possa mensurar o valor de uma vida perdida, mas o trabalho feito em parceria com os outros órgãos teve o objetivo de valorizar a vida de cada empregado morto, mesmo que a Vale não tenha demonstrado tanto interesse”, lamentou. 

Ele ainda detalhou que o papel do MPT continua, porque há mais de R$ 400 milhões para investir em projetos sociais. “Dependemos da Justiça do Trabalho para avançarmos na distribuição desses recursos da melhor forma possível, mostrando o papel dela para a sociedade”. 

Atuação do Corpo de Bombeiros 

A última palestra foi sobre "A atuação do Corpo de Bombeiros no acidente de Brumadinho: relato de experiências", com o coronel do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, Erlon Dias do Nascimento Botelho. 

A coordenação de mesa ficou sob responsabilidade da gestora regional do Programa Trabalho Seguro do TRT-MG, desembargadora Denise Alves Horta, que frisou que o Tribunal não poderia deixar de falar sobre essa tragédia e sobre o estresse pós-traumático, tema que está diretamente ligado ao Comitê de Saúde, da qual é coordenadora. 

O coronel Erlon Dias informou que são 379 dias ininterruptos de trabalho, sem pular um dia desde o ocorrido. Ele contou que foi desenvolvida uma Operação Coordenada entre diversos órgãos e montado um Sistema de Comando de Operações. “Foi a maior operação do Brasil e América Latina”, ressaltou. 

Ele ainda falou sobre as fases da operação e finalizou dizendo que o Corpo de Bombeiros não tem ideia de quando a missão terá fim. “Vamos encerrá-la quando o estágio de decomposição dos corpos não permitir mais localizá-los”. 

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