Comissão Interinstitucional debate Projeto de Lei que limita combate a trabalho escravo
Foto: Madson Morais |
Projeto de Lei que muda o conceito de trabalho escravo surgiu como tema de preocupação na 19ª Reunião da Comissão Interinstitucional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Foi a primeira reunião no ano do coletivo composto por 31 instituições e entidades, com participação de entes dos governos estadual e municipal, instituições federais e estaduais ligadas à Justiça (tribunais, ministérios públicos e defensorias), bem como entidades da sociedade civil.
A comissão é coordenada atualmente pela Secretaria de Estado da Defesa Social, que nela atua representada por Tales Andrade de Souza, coordenador especial de prevenção à criminalidade, e por Flávia Gotelipe, coordenadora do Programa de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Pelo TRT-MG, participaram os desembargadores Emerson José Alves Lage, que já vinha integrando a comissão, e José Eduardo Chaves Jr, além da juíza Martha Halfeld Furtado de Mendonça Schmidt, titular da 3ª Vara de Juiz de Fora.
Representando a Superintendência Regional do Trabalho no Estado, órgão do Ministério do Trabalho, Marcelo Campos manifestou sua contrariedade com Projeto de Lei oriundo do Senado que visa descaracterizar, como situações análogas à escravidão, os casos de "jornada exaustiva" e de "trabalho em condições degradantes". Segundo ele, a eventual aprovação dessas modificações, propostas pelo que ele definiu como "setores conservadores", anularia o efeito dos avanços obtidos na repressão ao trabalho escravo, como a Emenda que determina a desapropriação de imóveis onde essa prática ocorre. Na sua fala, lembrou que a grande maioria das situações de trabalho análogo à escravidão são enquadrados nos casos cujo conceitos podem ser alterados, e que as outras duas hipóteses previstas legalmente - "trabalho forçado" e "serviço por dívidas" - são muito raras na atualidade. "Não teremos mais como identificar o trabalho análogo à escravidão (...) estaremos diante de uma lei para inglês ver", afirmou ele.
Marcelo Campos também relacionou essas propostas à possível liberalização generalizada das terceirizações, que depende, por um lado, de Ação que está sendo analisada pelo STF e, por outro, de Projeto de Lei que, segundo ele, pode ser votado ainda em março pelo Congresso. O representante do Ministério relatou que mais de 90% dos casos identificados como trabalho escravo se dão por meio de terceirização. Ele também apresentou outras propostas, como mudanças na CLT para penalizar o beneficiário desse tipo de exploração, e defendeu regulamentar o conceito de "trabalho análogo à escravidão". Ao final da sua fala, alertou que o papel futuro da comissão pode ver-se comprometido se não forem combatidas as ameaças nacionais às condições materiais que hoje existem para a sua atuação.
Os presentes à reunião também ouviram uma exposição do trabalho desenvolvido pelo Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, apresentada por Viviane Coelho. Foi descrita a atuação da entidade com o acolhimento das vítimas, a mobilização e a articulação em rede, bem como a intervenção no contexto das situações levantadas. A representante do Núcleo também apontou detalhes das operações por ele desenvolvidas, desafios e metas.
O Comitê Interestadual de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas tem, como objetivo, aprimorar um modo de atuação que conjugue e interligue esforços, em forma de rede, de todas as instituições e entidades que o integram para o combate às diversas modalidades de tráfico de pessoas. (David Landau)