Turma declara nulidade de cláusula contratual que estipula duração semanal do trabalho móvel
Um dos critérios adotados pela legislação trabalhista para a fixação da remuneração pelo trabalho é o pagamento de salário por unidade de tempo, no qual se considera a duração do serviço prestado. Mas não só a duração do trabalho efetivamente prestado, mas também a própria disponibilidade do empregado perante o empregador deve ser levada em conta para calcular a remuneração devida. Nessa modalidade de aferição salarial, a jornada de trabalho e a duração semanal ou mensal do tempo trabalhado ou à disposição é o critério de cálculo, independentemente do volume da produção ou da obra produzida.
A 3ª Turma do TRT-MG analisou, recentemente, o recurso de uma empregada que tratava da questão da retribuição salarial por unidade de tempo. Uma empregada buscava o deferimento de diferenças salariais, ao argumento de que ficava à disposição da empregadora 08 horas diárias ou 44 semanais, mas recebia somente pelo tempo trabalhado. E a juíza convocada Maria Cecília Alves Pinto, relatora do recurso, deu razão a ela, entendendo como ilegal a jornada de trabalho estipulada no contrato.
A cláusula dispõe que a duração normal semanal do trabalho da contratada seria móvel e variável, com limite máximo de 44 horas e mínimo de mínimo de 8 horas. Estabelece ainda que a jornada semanal deveria ser ajustada de comum acordo entre as partes, com pelo menos 10 dias de antecedência do início de cada semana, devendo ser observados os limites legais de 11 horas consecutivas entre duas jornadas e o descanso de 24 horas por semana de trabalho. "Tudo em consonância com a disponibilidade da contratada, visando principalmente adequar seu horário de trabalho a outras atividades, como lazer, estudos ou mesmo outra atividade profissional" , reza a cláusula.
Mas, diante da constatação de que a empregada apenas tomaria ciência da jornada a ser cumprida alguns dias antes de sua fixação, a juíza convocada concluiu que ela ficava à disposição da empregadora no período máximo (44 horas semanais), mesmo não sendo chamada para trabalhar, tendo em vista que o mínimo de labor garantido era de 8 horas diárias. "Tanto isso é verdade que no parágrafo primeiro foi anotado que as horas trabalhadas até o limite normal diário de 8 horas não seriam computadas e pagas como horas extraordinárias, o que somente ocorreria relativamente à que superasse tal limite. Denota-se que o reclamante permanecia à disposição patronal por 8 horas diárias e 44 semanais, devendo ser remunerado de acordo com essa disponibilização de tempo" , explicou.
De acordo com a magistrada, a jornada a ser cumprida pelo trabalhador deve ser estabelecida previamente, de forma a permitir ao empregado conhecer de antemão não somente seu horário de trabalho, como também o seu salário mensal. Caso contrário, o contrato estará estipulando uma condição que atende única e exclusivamente à conveniência da empresa, sendo prejudicial ao empregado.
Ela observou que o prazo de apenas de 10 dias para cientificar o empregado da sua jornada é exíguo, já que não propicia ao trabalhador tempo para a sua organização, de forma a permitir a prática de outras atividades do cotidiano, sejam particulares ou profissionais. Pontuando que nem mesmo no âmbito do Direito Civil é permitida a fixação de cláusula contratual que submete uma das partes ao puro arbítrio da outra para o cumprimento de determinada obrigação (art. 122/CC), frisou que essa mesma regra deve ser observada no contrato de trabalho, especialmente em se considerando que o objeto deste contrato é a força de trabalho da pessoa humana.
A relatora ainda destacou que esse tipo de contratação impõe a predominância de interesses puramente econômicos em detrimento dos sociais, contrariando princípios constitucionais e, por isso mesmo, não pode prevalecer. Nesse contexto, ressaltou não ser justo que a empregada receba apenas pelas horas laboradas, quando se manteve à disposição do empregador ao longo de toda jornada de 08 horas. E que a forma de contratação adotada transfere para o trabalhador o risco do empreendimento, circunstância vedada pelos artigos 2º e 9º da CLT. Por tudo isso, declarou nula a cláusula contratual.
Assim, considerou que a empregada tem direito à remuneração correspondente a 220 horas mensais, considerado o valor do piso salarial, já incluído neste montante o repouso semanal remunerado. Foram deferidas, portanto, as diferenças salariais entre os salários recebidos e os pisos fixados nos instrumentos coletivos da categoria, com os reflexos cabíveis. O entendimento foi acompanhado pelos demais julgadores da Turma.