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Justiça reconhece vínculo de emprego entre clínica veterinária e profissional que começou como suposta estagiária

publicado: 23/07/2025 às 00h00 | modificado: 22/07/2025 às 18h04
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Resumo em texto simplificado

A Justiça do Trabalho reconheceu que uma auxiliar de veterinário, que atuava inicialmente como estagiária em uma clínica, trabalhava na verdade como empregada sem registro. A clínica, especializada em fisioterapia animal e pet shop, afirmou que a profissional recebia apenas “mentoria” e teria atuado depois como parceira autônoma. No entanto, o juiz Alexandre Chibante Martins, titular da 3ª Vara do Trabalho de Uberaba, concluiu que havia relação de emprego, já que a empresa não apresentou contrato de estágio, nem relatórios de atividades exigidos pela Lei do Estágio. Segundo o juiz, se a empresa ou instituição não cumprir as regras dessa Lei ou o que foi combinado no contrato de estagiário, isso pode fazer com que o estágio seja considerado um emprego formal. A clínica recorreu, mas os julgadores da Nona Turma do TRT de Minas confirmaram a sentença. Não cabe mais recurso.

Saiba mais sobre esta iniciativa

Médica veterinária terá direito a salário, verbas rescisórias e piso da categoria após comprovar relação de trabalho regular desde o período como estudante e sem registro em carteira.

A Justiça do Trabalho reconheceu que uma auxiliar de veterinário, que atuava inicialmente como estagiária em uma clínica, na verdade trabalhava como empregada sem anotação em Carteira. A decisão é do juiz Alexandre Chibante Martins, titular da 3ª Vara do Trabalho de Uberaba (MG).

A clínica, especializada em fisioterapia animal e pet shop, afirmou que a profissional recebia apenas “mentoria” e, depois, teria atuado como parceira autônoma. No entanto, o juiz concluiu que havia relação de emprego, já que a empresa não apresentou contrato de estágio nem relatórios de atividades exigidos pela lei.

Início da prestação de serviços

A profissional começou a trabalhar na clínica veterinária em fevereiro de 2021, ainda como estudante de Medicina Veterinária. Segundo ela, o trabalho era diário, com funções práticas relacionadas à rotina da clínica. Já a empresa alegava que se tratava de uma “mentoria”, ou seja, um tipo de acompanhamento informal, sem vínculo de emprego.

Suposto estágio sem formalização

Apesar de relatar que ela estava em estágio, a empresa não apresentou nenhum documento obrigatório por lei, como o termo de compromisso assinado entre a estudante, a instituição de ensino e a clínica. Também não havia relatórios periódicos sobre as atividades realizadas. Esses documentos são exigidos pela Lei nº 11.788/2008 e, sem eles, não é possível caracterizar um estágio legal. Na sentença, o juiz explicou que, embora a Lei do Estágio (Lei nº 11.788/2008) diga que o estágio não gera vínculo de emprego, ela também exige que o estagiário seja tratado com responsabilidade. Se a empresa ou instituição não cumprir as regras da lei ou o que foi estabelecido no contrato de estágio, isso pode fazer com que o estágio seja considerado emprego. Nesse caso, o estudante passa a ter direitos trabalhistas e previdenciários, como qualquer outro trabalhador regido pela CLT.

O magistrado explicou que a própria lei reforça isso duas vezes. No artigo 3º, ela diz que qualquer descumprimento das obrigações pode transformar o estágio em vínculo de emprego. No artigo 15, ela afirma que manter estagiários fora das regras da lei também gera a relação de emprego.

No particular, é incontroverso que, a despeito do objetivo profissionalizante, não houve estágio formalizado, nos termos da lei. Logo, o vínculo de emprego é presumido na hipótese em discussão”, concluiu o julgador.

Exercício de atividades típicas de empregada

O conjunto de provas analisado pelo juiz demonstrou que, durante esse período, mesmo sem contrato assinado, a auxiliar de veterinário usava uniforme com a marca da clínica, crachá de identificação, atendia clientes sozinha e utilizava equipamentos da empresa. Os atendimentos eram agendados pela própria clínica, que também recebia os pagamentos. A profissional tinha até a chave da clínica.

Na sistemática processual trabalhista, admitida a prestação de serviços, incumbe à parte ré a prova de se tratar, efetivamente, de labor eventual, ou situação diversa, por se constituir fato impeditivo ao reconhecimento do vínculo empregatício, presumindo-se, caso não se desonere do encargo processual, trata-se, de fato, de relação de emprego. Some-se que o Direito do Trabalho é norteado pelo Princípio da Primazia da Realidade. Desse modo, o que importa para a solução da controvérsia é a realidade vivenciada entre as partes e a constatação da presença ou não dos elementos fático-jurídicos caracterizadores do liame empregatício (art. 3º da CLT).”, pontuou o magistrado.

Registro profissional

Na sentença, o julgador frisou que, quando obteve o registro profissional no Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), como médica veterinária, em julho de 2021, ela passou a atuar oficialmente na função. Mesmo assim, a situação de informalidade permaneceu. A clínica continuou sem registrar a profissional e sem anotar sua Carteira de Trabalho e mantinha o controle sobre a agenda e os atendimentos. Os pagamentos continuavam sendo feitos pelos clientes à clínica, que repassava os valores à profissional.

A veterinária permaneceu prestando serviços até julho de 2022. Ao longo desse período, realizava atendimentos tanto na clínica quanto fora dela (em empresas ou residências dos clientes), sempre com agendamento e controle feitos pela clínica. A frequência dos atendimentos variava entre uma e duas vezes por semana, mas por períodos longos e contínuos.

Provas no processo

Conforme observou o magistrado, mensagens de WhatsApp mostraram a rotina de trabalho da profissional, além de fotos e vídeos anexados ao processo. As imagens revelaram que ela atendia animais usando uniforme da empresa. Além disso, o perfil da clínica nas redes sociais indicava a profissional como responsável pela área de fisioterapia e reabilitação animal.

Reconhecimento judicial do vínculo de emprego

Diante dessas evidências, o juiz reconheceu que havia todos os pressupostos de uma relação de emprego: pessoalidade, subordinação, habitualidade e pagamento pelos serviços. Ele também entendeu que o trabalho da profissional não era eventual nem autônomo.

O juiz também analisou o valor que a profissional deveria ter recebido durante o período trabalhado. No início da prestação de serviços, quando ainda não tinha o registro como médica veterinária, a profissional trabalhava como auxiliar. Nessa fase, ela atuava, em média, 4 horas por dia. Por isso, o juiz decidiu que ela deveria receber, pelo menos, metade do valor do salário mínimo vigente naquele período.

A partir de 27 de julho de 2021, data em que obteve o registro profissional, passou a atuar como médica veterinária. A partir daí, passou a ter direito ao piso salarial da categoria, como prevê a Lei nº 4.950-A/1966. Segundo a lei, o médico veterinário que trabalha 6 horas por dia deve receber seis salários mínimos. Se a jornada ultrapassar a 6ª hora diária, deve haver um acréscimo de 25% sobre esse valor.

Com base nas mensagens trocadas por WhatsApp e nos depoimentos colhidos, o magistrado entendeu como provado que a profissional trabalhava em tempo integral, de manhã e à tarde. A empresa não produziu prova em contrário. Assim, o juiz determinou que ela tem direito ao piso salarial da categoria, com o acréscimo de 25% pela jornada estendida.

Além disso, conforme a decisão, ela também deve receber as diferenças salariais entre o valor que lhe foi pago e o valor correto, com os devidos reflexos nas verbas rescisórias: aviso-prévio, férias proporcionais com 1/3, 13º salário proporcional e FGTS com multa de 40%.

A clínica recorreu ao TRT mineiro. Em decisão unânime, os julgadores da Nona Turma do TRT-MG confirmaram a sentença. Não cabe mais recurso.

Processo

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