Mineradora de Congonhas é condenada a pagar indenização por danos morais coletivos de R$ 100 mil
A Justiça do Trabalho condenou a mineradora responsável pela barragem de mineração Casa de Pedra, em Congonhas, a pagar uma indenização de R$ 100 mil por danos morais coletivos. Isso porque, em 2017, foi descumprida a determinação de interdição de auditor-fiscal do trabalho em obra que vinha sendo realizada pela mineradora. A empresa, na ocasião, submeteu trabalhadores e a comunidade local a risco, ao descumprir a determinação de interdição. Depois desse episódio, a ordem de interdição foi suspensa e a mineradora retomou suas atividades. O juiz do 1º grau havia julgado procedente pedido do Ministério Público do Trabalho para tornar definitiva a tutela concedida, impondo a manutenção da determinação de que a mineradora se abstenha de manter em funcionamento barragem de rejeitos, obra, estabelecimento, setor de serviço, máquina, equipamento embargado ou interditado por órgãos de inspeção do trabalho. Julgadores da Décima Turma do TRT-MG confirmaram a decisão do 1º grau, diante da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra a mineradora.
Entenda o caso - Em 11/10/2017, foi lavrado o Termo de Interdição, com a determinação de paralisação de toda e qualquer atividade de lançamento de rejeitos na Barragem Casa de Pedra, mesmo que indiretamente, assim como o manejo de rejeitos já depositados. Foram interditadas também as obras de drenagem e o reforço do maciço nas ombreiras direita e esquerda do dique de sela, barramento natural da Casa de Pedra. Isso porque foram constatadas no local diversas irregularidades que comprometem a segurança dos trabalhadores e da comunidade vizinha.
Já em 18/10/2017, por meio de nova inspeção, os auditores-fiscais constataram que essas obras, no dique de sela, não foram paralisadas, conforme havia sido determinado pela fiscalização do Ministério do Trabalho, “colocando em risco os trabalhadores no local”. Foi instaurado, então, inquérito civil, com designação de audiência administrativa, sendo proposto um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) futuro aos representantes da empresa, que informaram o desinteresse na celebração do acordo nos termos propostos. Em dezembro de 2017, o auditor-fiscal do trabalho fez uma revisão e suspendeu a ordem de interdição, permitindo a retomada das atividades da mineradora. Entretanto, no entender da julgadora, isso não anula a demonstração de irregularidades anteriores quanto ao descumprimento das normas de segurança relacionadas ao funcionamento das barragens.
Diante dos fatos narrados e considerando a recusa da empresa em ajustar sua conduta pela via extrajudicial, o Ministério Público do Trabalho ajuizou ação civil pública contra a empresa, com o pedido de tutela inibitória e condenatória. Para o MPT, “esse seria o melhor caminho para exigir da ré a correção das irregularidades trabalhistas apuradas, a fim de assegurar um ambiente seguro de trabalho, com a devida proteção à sua saúde, integridade, e vida, em consonância com a garantia constitucional inscrita no artigo 7º, inciso XXII, da CF/88”.
Ao decidir o caso, o juízo da Vara do Trabalho de Congonhas julgou procedente o pedido do Ministério Público do Trabalho, “a fim de tornar definitiva a tutela concedida, determinando à mineradora que se abstenha de manter em funcionamento barragem de rejeitos, obra, estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamento embargado ou interditado por órgãos de inspeção do trabalho”. Pela decisão, a empresa deveria cumprir integralmente eventuais ordens, notificações, termos de interdições ou de embargo promovidos pela Auditoria Fiscal do Trabalho até que venham a ser suspensos pela referida autoridade competente. Para cada ordem descumprida, a multa diária imposta era de R$ 50 mil.
A empresa foi condenada, ainda, ao pagamento de indenização por danos morais de R$ 50 mil. O Ministério Público do Trabalho alegou que, ao descumprir a determinação de interdição, a mineradora causou lesão aos interesses da coletividade, colocando em risco a vida e a integridade de trabalhadores, além da segurança da sociedade. Isso, segundo o órgão, tendo em vista o potencial de ocorrência de uma tragédia ambiental de grandes proporções, tal como aquelas ocorridas nas cidades de Mariana e Brumadinho.
Recurso - Mas a empresa interpôs recurso contra a interdição. Em síntese, sustentou que não houve incidente ou indício de risco e que a própria sentença admitiu que, posteriormente, as medidas de segurança adotadas foram reconhecidas pela fiscalização, inclusive com permissão para reativação das atividades suspensas. Alegou que o ambiente de trabalho é seguro e que não há, nos autos, comprovação objetiva, técnica ou científica acerca da existência de riscos concretos, destacando que a interdição efetivada pelo auditor-fiscal do Trabalho foi equivocada.
Por fim, argumentou que as obras, realizadas no dique de sela, foram qualificadas como de caráter emergencial, a fim de que fosse conferida maior agilidade ao processo, reiterando a inexistência de risco de ruptura e reafirmando a segurança e regularidade das obras, inclusive com acompanhamento da Defesa Civil.
Decisão - Para a relatora, juíza convocada Sabrina de Faria Fróes Leão, os elementos de prova dos autos demonstram que a empregadora, de fato, deixou de observar as medidas de segurança necessárias à realização de suas atividades. “O relatório elaborado pela Secretaria de Inspeção do Trabalho elenca várias irregularidades relacionadas à prestação de serviços no complexo de barramento de rejeitos, concluindo pela existência de risco grave e iminente capaz de causar acidentes graves e até fatais”, ressaltou a julgadora.
Embora considerem remota a probabilidade de ruptura, estudos descreveram várias hipóteses que podem gerar o rompimento da estrutura da Barragem Casa de Pedra, não descartando de maneira efetiva a possibilidade de um acidente de grandes proporções.
Para a julgadora, demonstrada a prática de irregularidades e, especialmente, os riscos decorrentes da atividade exercida pela recorrente, o que se deve ter em ordem de relevância, no caso concreto, é o descumprimento da ordem de interdição. Segundo a relatora, ainda que a empresa julgasse equivocada a determinação de interdição dos agentes fiscalizadores, é completamente ilegal a conduta de desprezar a proibição, baseando-se em juízo próprio de que não estariam constatados os riscos detectados na inspeção.
No entendimento exposto no voto condutor, não prospera também a alegação recursal de que a ordem de interdição é nula e arbitrária e prescinde de “causa fática concreta e fundamento jurídico válido”.
“Da mesma forma, não merece acolhida a tese de ser essa a ação própria para apreciação do mérito da fiscalização empreendida pelo MTb, considerando tratar-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho com vistas ao deferimento de tutela inibitória, e não ação anulatória de termo de interdição ou auto de infração”, concluiu a julgadora.
Assim, foi negado provimento ao recurso da mineradora e mantida a sentença que manteve a determinação de abstenção especificada.
Dano moral - Quanto ao dano moral, a julgadora atendeu ao MPT e majorou o valor da condenação de R$ 50 mil para R$ 100 mil. Para a magistrada, não prospera a alegação da ré de que não houve especificação da coletividade afetada, já que constou expressamente da inicial e da sentença que a atividade desenvolvida poderia causar danos graves. Na visão da juíza convocada, não há dúvida quanto ao dano praticado. “Houve o descumprimento, por parte da ré, da ordem de interdição expedida por autoridade competente e consequente exposição dos trabalhadores e população local aos riscos daí decorrentes”, reforçou.
Segundo a relatora, o descumprimento de ordem de interdição expedida pelo auditor-fiscal do Trabalho é sinal de desprezo pelas medidas de segurança recomendadas pelo órgão de inspeção e, em consequência, pelos valores humanos da vida e integridade física. “Sobretudo quando se tem em vista que a tragédia ocorrida em Mariana, após rompimento de barragem da mineradora Samarco, havia ocorrido em 2015, isto é, dois anos antes da realização da diligência”, concluiu. Conforme pontuou a julgadora, o dano, no caso, é endereçado a toda uma coletividade e, ainda, à sociedade, e não à figura do empregado individualmente considerado.