Violência de gênero: faxineira do Mercado Municipal de Governador Valadares receberá indenização de R$ 20 mil após ser agredida por segurança
Resumo em texto simplificado
A Justiça do Trabalho determinou o pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 20 mil, à faxineira do Mercado Municipal de Governador Valadares que foi agredida pelo segurança. A profissional garantiu ainda a rescisão indireta do contrato, com o pagamento das verbas devidas. A faxineira contou que estava limpando o banheiro masculino do mercado, quando um cliente entrou e começou a tirar a calça na frente dela, além de dizer palavras ofensivas. Ela chamou então o supervisor, que apenas pediu para o homem ir embora, mesmo ela alegando que queria prestar queixa-crime pelas ofensas e pelo desrespeito. Segundo a profissional, a situação piorou porque um segurança do mercado começou a ofendê-la, dizendo que não tinha acontecido nada demais. A faxineira contou que houve então um desentendimento com o segurança, que acabou batendo no peito dela, empurrando-a com força. Para o juiz Kleverson Glauber Figueiredo de Paula Júnior, em atuação na 1ª Vara do Trabalho de Governador Valadares, ficaram configuradas as condutas ilícitas da empregadora ao não adotar medidas eficazes de prevenção e correção no caso. Houve recurso, que aguarda julgamento.
Saiba mais sobre esta iniciativaPara marcar a Semana da Mulher, o TRT-MG traz uma coletânea de casos decididos conforme o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero 2021, que estabelece orientações para que os julgamentos realizados considerem a igualdade e a não discriminação, especialmente no que diz respeito às questões de gênero. Em alguns casos, o número do processo foi omitido, para preservar a privacidade das pessoas envolvidas. Acompanhe!
A Justiça do Trabalho determinou o pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 20 mil, à faxineira do Mercado Municipal de Governador Valadares que foi agredida pelo segurança. A profissional garantiu ainda a rescisão indireta do contrato de trabalho, com o pagamento das verbas devidas. A decisão é do juiz Kleverson Glauber Figueiredo de Paula Júnior, no período em que atuou na 1ª Vara do Trabalho de Governador Valadares.
A faxineira contou que, no dia 1º de outubro de 2024, estava limpando o banheiro masculino do mercado, quando um cliente entrou no local. Ela explicou que pediu ao homem que utilizasse o outro banheiro ou aguardasse um momento até que ela terminasse a limpeza.
Segundo a profissional, o cliente não atendeu ao pedido. Ele simplesmente começou a tirar a calça na frente dela e, além de tudo, disse palavras ofensivas. A autora explicou que foi chamar o supervisor para resolver a situação. “Mas, quando chegou ao local, ele viu que o cliente era um amigo e ele apenas pediu para o homem sair e ir embora, mesmo após ter falado que queria prestar queixa-crime pelas ofensas e pelo desrespeito”.
A trabalhadora disse que um segurança do mercado, que estava no local, começou a ofendê-la, dizendo: “ela inventa demais e fala muito, que isso era coisa de mulher, e não tinha acontecido nada demais”.
A faxineira contou que se dirigiu ao segurança dizendo: “ [...] se desrespeitassem a sua esposa você ia gostar? Da forma que seu amigo fez comigo?”. A partir daí, ela contou que o segurança começou a gritar e a xingar a mãe dela. E, diante dessas ofensas, ela se aproximou dele pedindo respeito com a família dela.
Na sequência, o segurança agrediu a faxineira, batendo no peito dela com as duas mãos e a empurrando com muita força. Segundo a trabalhadora, “ele foi pra cima dela, mas os outros seguranças intervieram na agressão”. Ela chamou então a polícia e fez um boletim de ocorrência, mas o segurança e o cliente não estavam mais no local quando a polícia chegou.
Testemunha que trabalha no mercado, como monitora de estacionamento, informou que conhece o segurança e que já teve problema com ele. “[...] havia brincadeiras impróprias no ambiente laboral; […] o segurança usava constantemente palavrões; que o segurança tinha o hábito de diminuir as funcionárias mulheres”, informou.
Na defesa, o empregador negou as acusações. Disse que as imagens do circuito interno de vigilância demonstram que a reclamante foi a causadora dos atos de agressão. “Ela estava gesticulando e apontando o dedo para o colaborador, demonstrando clara intenção de agressão”.
Decisão
Para o juiz sentenciante, no contexto dos autos, ganha especial relevância o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça, que tem o objetivo de orientar magistradas e magistrados a considerarem a desigualdade e discriminação pautadas em gênero ao conduzirem processos e proferirem decisões. Segundo ele, esse protocolo busca assegurar, no âmbito do Poder Judiciário, a concretização de valores centrais da Constituição Federal de 1988.
O julgador destacou ainda na decisão que a violência de gênero sofrida pela trabalhadora está em desacordo com os compromissos assumidos pelo Brasil em tratados e convenções internacionais. “Destacam-se a Convenção nº 111 da OIT, que proíbe a discriminação em matéria de emprego e ocupação, e a Convenção nº 190 da OIT, que trata da eliminação da violência e assédio no trabalho, reconhecendo o impacto desproporcional sobre as mulheres”.
Conclusão
Diante das provas, o magistrado entendeu que existiam “brincadeiras” impróprias no ambiente de trabalho e condutas que têm aptidão para a caracterização de assédio contra a trabalhadora. “Em que pese as alegações das testemunhas da parte ré de que a reclamante era agressiva e descontrolada, não existem medidas disciplinares, nem ocorreu a demissão da obreira em função disso”.
O juiz concluiu ainda que, no vídeo juntado ao processo, não fica clara a alegação da empregadora de que a ex-empregada tenha ofendido o segurança e ainda “partido para cima dele”. Isso tendo em vista, ainda, a não disponibilização do áudio”.
Assim, no entendimento do julgador, ficaram configurados os elementos essenciais à responsabilização civil da reclamada, quais sejam: as condutas ilícitas, tanto comissivas quanto omissivas, praticadas pelo segurança e pela empregadora ao não adotarem medidas eficazes de prevenção e correção; o grave dano moral experimentado pela autora no ambiente de trabalho; e o nexo causal evidente entre as práticas abusivas e o prejuízo à dignidade e saúde psíquica.
O magistrado julgou procedente o pedido para reconhecer a rescisão indireta do contrato de trabalho a partir do dia 1º/10/2024, com fulcro no artigo 483, "c", da CLT. Em consequência, condenou a empregadora ao pagamento das verbas rescisórias devidas.
Em relação aos danos morais, ele julgou procedente o pedido da trabalhadora e condenou a empresa ao pagamento da indenização. “Efetuando um juízo de ponderação e equidade, tendo em vista as circunstâncias do caso em exame, o caráter compensatório da medida, a situação econômica das partes e a necessidade de se combater veementemente práticas abusivas e discriminatórias no ambiente de trabalho, julgo procedente, nos termos dos artigos 5° da CF e 186, 927 e 932 do CC, o pagamento de indenização de R$ 20 mil”.
Houve interposição de recurso pela empresa, que aguarda julgamento no TRT-MG.