Empresa que adulterou laudo pericial é condenada a indenizar motorista que ficou paraplégico após acidente
A Justiça do Trabalho de Minas tem recebido grande número de ações envolvendo empresas de logística e caminhoneiros vítimas de acidente de trânsito. São demandas que denunciam a negligência patronal e engrossam as estatísticas de acidentes de trabalho que poderiam ser evitados se o empregador zelasse pela segurança dos seus empregados e de todos os que trafegam pelas vias públicas. A situação se agrava ainda mais quando a empresa, além de ser negligente, usa artifícios e pratica irregularidades com o objetivo de afastar sua culpa. Na época em que atuava na 36ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, a juíza Luciana Nascimento dos Santos se deparou com esse tipo de situação. No entender da magistrada, ficou evidenciada a culpa da empresa, que chegou a adulterar o laudo pericial, inclusive com a descaracterização do local do incidente, para se eximir da sua obrigação de indenizar o empregado, vítima de um acidente de trabalho que o deixou paraplégico.
Ficou comprovado que o acidente ocorreu em virtude de um defeito na suspensão dianteira do caminhão. O exame de corpo de delito demonstrou que o motorista entregador sofreu grave lesão em sua coluna vertebral, o que provocou a limitação de movimentos, prejudicando a locomoção e causando impotência sexual. Segundo informações do processo, o trabalhador se casou após o acidente. Entretanto, no entender da juíza, esse acontecimento não altera a extensão do dano, já que o casamento do reclamante não é pleno, pois falta a atividade sexual. Para a magistrada, ficou evidenciado que o trabalhador sofreu danos morais decorrentes das repercussões emocionais do fato, das alterações drásticas e dolorosas na sua vida doméstica e das restrições impostas em sua vida afetiva. Nesse sentido, o acidente de trabalho ocasionou não só dor física, mas também sofrimento psicológico, marcando para sempre a vida de um jovem ¿privado de sua sexualidade, o que implica não só em deixar de ter prazer sexual, mas também na perda da auto-estima ligada à virilidade¿ ¿ completou a juíza.
De acordo com o depoimento de um ex-empregado da empresa reclamada, quase todo mês havia acidentes com motoristas, sendo que a maioria foi causada pela falta de manutenção nos veículos. Na época do acidente que vitimou o reclamante, a empresa possuía cerca de 25 caminhões. Apesar disso, não havia manutenção preventiva. Conforme declarou a testemunha, as manutenções eram feitas por exigência dos motoristas, quando não havia mais jeito. A julgadora considerou inadmissível o fato de uma empresa de grande porte não ser diligente na manutenção de sua frota, formada por número razoável de caminhões, que trafegam por grande parte do território estadual. Conforme alertou a magistrada, as empresas devem se cercar de cuidados para evitar problemas futuros, submetendo suas frotas a manutenção periódica, imprescindível para a segurança no trânsito. Como se isso não bastasse, a juíza constatou ainda que a empresa apresentou um laudo pericial adulterado, referente ao acidente, com o qual pretendeu demonstrar que o veículo estava em perfeitas condições e que o motorista trafegava com velocidade excessiva.
Examinando o laudo apresentado no original e assinado apenas por um perito de confiança da empresa ¿ quando a lei exige a assinatura de dois peritos ¿ a magistrada concluiu que o documento foi alterado a mando da empregadora, para beneficiá-la no processo. Na avaliação da julgadora, essa atitude da empresa representa verdadeira confissão de culpa, pois se ela não tivesse responsabilidade alguma pelo acidente, não precisaria praticar essas irregularidades. Por esses fundamentos, a juíza sentenciante condenou a empresa a pagar ao reclamante indenização por danos morais e estéticos, fixada em R$380.000,00, e uma pensão mensal calculada pela média das últimas 12 remunerações, parcelas vencidas e que estão por vencer, até a data em que o reclamante completar 65 anos de idade, devendo a empresa incluí-lo na sua folha de pagamento. A condenação inclui ainda uma multa por litigância de má-fé, fixada em 1% sobre o valor da causa, em favor do reclamante. O TRT-MG manteve a sentença, apenas modificando o valor da condenação para R$200.000,00.