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TRT-MG afasta suspeição levantada contra juiz que aplicou multa por litigância de má-fé a advogados

publicado: 11/10/2012 às 03h06 | modificado: 11/10/2012 às 06h06

A Exceção de Suspeição julgada pela 7ª Turma do TRT de Minas, sob a relatoria do juiz convocado Antônio Gomes de Vasconcelos, já ultrapassava a 60ª ajuizada contra o mesmo magistrado, sempre pelos mesmos advogados. Embora entendendo ser juridicamente impossível o pedido de declaração de suspeição fundado na alegação de inimizade entre o magistrado e os advogados das partes (o que seria adequadamente impugnável pela medida correcional e, nos casos de discordância das decisões, pela via recursal adequada), o relator achou conveniente examinar o mérito da ação, em decorrência da gravidade das alegações e suas implicações, já que, pela acusação, a dita inimizade estaria se estendendo aos jurisdicionados. O julgador entendeu que o caso vai além do campo de interesse das partes, envolvendo elevado interesse público, no que diz respeito aos princípios do estado democrático de direito, quanto ao exercício da jurisdição e à administração da justiça.

Os advogados sustentaram que, em razão da inimizade e antipatia pessoal que nutre por eles, o magistrado estaria agindo com parcialidade na condução dos feitos nos quais eles atuam, em prejuízo das partes que representam. Enumeraram atitudes do magistrado que configurariam a alegada perseguição, entre elas, a acusação de que o juiz vem adotando mecanismos de controle processual que, embora possam parecer legítimos, têm a intenção de prejudicá-los. Como exemplos, citaram a aplicação de multa por litigância de má-fé, a condenação ao pagamento de indenização à parte contrária e o cerceio à produção de provas, como oitivas de testemunhas. Pediram que o juiz suspeito seja impedido de atuar no caso e em quaisquer outros processos em que estejam atuando como advogados.

O juiz acusado rejeitou a suspeição e frisou que as condutas adotadas na condução dos processos resultaram de convicção jurídica, inexistindo qualquer questão pessoal com os advogados e, menos ainda, intenção de prejudicar as partes. Até porque, ele adota a mesma postura com todos os advogados indistintamente e, inclusive, já impôs sanções às partes opostas àquelas representadas pelos advogados em questão. E mais: proferiu inúmeras decisões favoráveis às partes defendidas por eles. Por outro lado, as posturas adotadas visam a coibir a prática de atos processuais desnecessários ou desleais.

Após analisar os fatos e provas do processo, o juiz relator entendeu que não há qualquer caráter pessoal ou de inimizade nas medidas adotadas pelo juiz acusado de suspeito. Ele destacou que o magistrado não é obrigado a ouvir todas as testemunhas arroladas, mas somente o número suficiente delas para o esclarecimento dos fatos, sob pena de ofensa aos princípios da necessidade, utilidade e pertinência da prova. "Com efeito, todos os atos impugnados traduzem o exercício do poder de direção do processo assegurado ao magistrado, a quem compete, dentre outros deveres, velar pelo rápido andamento das demandas, prevenir ou reprimir qualquer ato atentatório à dignidade da justiça, frustrar objetivos das partes quando estas se servirem do processo para praticar ato simulado ou conseguir fim proibido por lei, determinar, inclusive de ofício diligências ou as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias (arts 125 a 132, CPC, art. 765, CLT)".

Quanto às sanções impostas, o relator observou que estão todas devidamente fundamentadas e previstas nas normas processuais. Além do que, foram igualmente adotadas pelos demais magistrados do foro, atingindo também outros advogados. Segundo ressaltou, todas elas decorrem de diagnóstico e deliberação coletiva dos juízes em prol da melhoria e da efetividade da jurisdição e no combate à má-fé processual e aos atos protelatórios. É que o juiz apenas seguiu a manifestação do colegiado dos juízes que integram a Unidade Regional (URGE-UDI) do Sistema Integrado de Participação da Primeira Instância na Gestão Judiciária e na Administração da Justiça do TRT de Minas (SINGESPA-TRT3). Entre as funções do Singespa, estão, justamente, a busca da eficiência dos serviços judiciários, mediante a descentralização da gestão judiciária, respeitando-se as particularidades locais e a atuação coletiva dos juízes na administração da Justiça. E essa busca do aprimoramento da atividade jurisdicional foca-se, sobretudo, nos princípios da duração razoável do processo, da justiça das decisões e da efetividade dos direitos, o que pode se viabilizar com a simplificação e racionalização de procedimentos judiciais e com recursos voltados a inibir a ação das partes que tencionam usar o processo para fins proibidos em lei.

Segundo informações prestadas pelo coordenador da URGE-UDI - Unidade Regional de Participação da Primeira Instância na Gestão Judiciária e na Administração da Justiça de Uberlândia, é hábito no foro local os juízes se reunirem para discutir questões ligadas à administração da justiça. Eles constataram um constante aumento das práticas, por alguns advogados, de atos de litigância de má-fé, processos repetitivos, muitos pedidos de adiamento de audiências, cálculos em desconformidade com a sentença e um elevado número de "testemunhas preparadas", ou seja, pessoas cujos depoimentos revelavam-se tendenciosos a uma das partes. Diante destes fatos, os Juízes do Trabalho de Uberlândia começaram a adotar posicionamentos jurídicos que visavam a combater estas práticas, como o princípio da imediatidade (ou seja, do contato direto do juiz com a prova oral produzida) para, a partir de impressões do julgador sobre a prova colhida, atestar aquela que merecia maior credibilidade. Além disso, o rol de testemunhas, na forma prevista no artigo 407 do CPC, foi extinto, passando as partes a terem a obrigação de convidar as testemunhas que serão ouvidas, na forma do artigo 825 da CLT. Os juízes passaram ainda a exigir das partes e advogados envolvidos em tais práticas um maior compromisso ético no processo, aplicando as sanções de litigância de má-fé. E isso foi feito em relação aos advogados, em geral, que militam na JT de Uberlândia.

A conclusão do relator foi de que as acusações dos advogados demonstram a insatisfação destes com as decisões do magistrado e que a imposição de multas constituiu uma das providências adotadas com o fim de coibir atos desleais, como as práticas dos advogados em questão de suscitar, de forma reiterada, incidentes processuais sem fundamento, com intuito apenas de protelar o processo. Multas essas, aliás, que foram mantidas pelo Tribunal no julgamento dos recursos por eles interpostos junto ao TRT.

Para o relator, o propósito dos advogados era forjar um estado de suspeição "perene e generalizado" do julgador em relação a eles próprios, visando ao seu afastamento de quaisquer demandas, anteriores ou futuras, nas quais venham a atuar. Tudo em razão da política jurisdicional adotada pelo magistrado que, adequada e fundamentadamente, puniu os advogados com penas de litigância de má-fé, cumulada com indenização por dano e assédio processual. "Ora, o ajuizamento de aproximadamente 60 (sessenta) exceções de suspeição contra um único magistrado, nas circunstâncias descritas, revela intenção mais profunda por parte dos excipientes, qual seja a de desestabilizar o magistrado e de tentar opor obstáculo ao pleno exercício da jurisdição mediante conduta contrária à dignidade da justiça, dado que os fatos invocados não revelam a boa-fé necessária à administração da justiça da qual são os procuradores das partes atores indispensáveis (art. 133, CF/88)", frisou.

Portanto, o relator concluiu que o magistrado é insuspeito: "Não se registra, no presente caso, nenhuma ocorrência condizente com as hipóteses previstas no artigo 135, CPC", ressaltou. Por outro lado, ele entendeu como abuso do direito de ação a conduta processual adotada pelos advogados, o que classificou como assédio processual: "Esse abuso de direito prosseguiu na proliferação dessas ações, mesmo depois de inúmeras decisões deste Egrégio Tribunal que rejeitaram a exceção argüida, inclusive, com a advertência explícita aos excipientes para que assim deixassem de proceder".

Para o juiz relator, essa conduta afronta o princípio da boa-fé, da ética e da lealdade processuais, sobretudo porque se pretende comprometer a credibilidade, eficiência e efetividade da própria atividade da Justiça. Por isso, aplicou aos advogados, com exceção da parte representada no processo principal, a multa simbólica de R$10.000,00, a ser paga em favor do Fundo de Amparo ao Trabalhador, a fim de prevenir atos contrários à dignidade da justiça. "Presentemente, a vítima do dano é o próprio estado de direito, razão pela qual o magistrado excepto não será o beneficiário da pena pecuniária aqui aplicada", finalizou. A Turma julgadora, por unanimidade, acompanhou o entendimento.

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