ACP contra empresas de telecomunicações não faz coisa julgada em relação a situação abusiva concreta
Em ação que tramita na Vara do Trabalho de Caratinga, a Telemar Norte Leste S.A. pretendia ver extinta a reclamação trabalhista contra a empresa, sob o argumento de que haveria "coisa julgada" atingindo o pedido feito pelo trabalhador, que denunciou irregularidades na sua contratação por intermédio de empresa de terceirização de mão-de-obra. Isto porque, segundo alegou a ré, em Ação Civil Pública de âmbito nacional, proposta pelo Ministério Público do Trabalho, foi reconhecida a licitude das terceirizações nas atividades finalísticas das empresas de telecomunicações, cujos efeitos valem em face de todos, nos termos do artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor.
Só para entender o caso: por coisa julgada entende-se a qualidade da sentença irrecorrível que se torna definitiva e imutável. Isso quer dizer que da decisão alcançada pela coisa julgada não cabe mais recurso e os pedidos feitos nela não poderão mais ser repetidos em outras ações judiciais pelas mesmas partes e com as mesmas causas de pedir. Se isso ocorrer, haverá litispendência, ou seja, as duas ações serão consideradas idênticas e a segunda deverá ser extinta.
Mas o juiz Jonatas Rodrigues de Freitas, titular da Vara, não acatou os argumentos da Telemar. Para ele, é preciso considerar o contexto do artigo 103 do CDC e seus incisos, que se conjugam com o artigo 81, também do CDC: "Evidentemente, sendo julgados improcedentes os pedidos apresentados na ação civil pública a que faz referência, nos limites em que proposta e decidida (art. 468, CPC), não poderia mais ser repetida aquela demanda por qualquer outro interessado. Mas, repete-se, nos limites em que proposta e decidida, ou seja, exclusivamente no que toca aos temas em tese já analisados e que se referem estritamente à licitude da terceirização nas atividades secundárias, nas atividades principais e, ainda, ao dano moral coletivo correspondente" , explicou.
De acordo com o juiz, não é esse o caso do processo julgado, já que a denúncia lançada na petição inicial vai além dos limites da demanda proposta pelo Ministério Público do Trabalho, alcançando uma situação abusiva específica e concreta, segundo as alegações do trabalhador, a serem analisadas. Ele ressaltou ainda que o penúltimo parágrafo da sentença da ACP em questão traz expressa referência a esses limites. "Lá se registrou que o indeferimento da tutela inibitória não impedirá que situações concretas de abuso, seja pela subcontratação integral de atividades concessionadas, seja pela subordinação direta dos empregados terceirizados à tomadora, possam ser reprimidas por nova ação civil pública ou por reclamações trabalhistas individuais ou plúrimas" , completou, acrescentando que a ré tenta ignorar essa orientação.
Por fim, lembrou o magistrado que somente se poderia falar em coisa julgada, impedindo nova demanda, na hipótese de improcedência da ação coletiva anterior e quando verificadas as hipóteses dos incisos I e II do artigo 103 do CDC: "Enfim, ainda que houvesse repetição da demanda anterior, o que somente poderia se dar se já analisados interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum (art. 81, parágrafo único, III, CDC), neste caso, o impedimento da repetição se daria apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores (inciso III do artigo 103 do CDC)" , finalizou frisando que, nos termos do parágrafo 1º do artigo 103 do CDC, os efeitos da coisa julgada não poderão prejudicar interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, grupo, categoria ou classe.
Com esses fundamentos, o juiz rejeitou a exceção de coisa julgada e procedeu ao julgamento dos pedidos feitos pelo reclamante. Essa questão não voltou a ser discutida nos recursos apresentados pelas reclamadas.
0000454-95.2012.503.0051