JT reconhece fraude à execução em caso de alienação de bem imóvel entre parentes
Um dos meios utilizados pela Justiça para viabilizar o pagamento do crédito reconhecido em uma ação é a penhora de bens do devedor. Mas, muitas vezes, ocorre de um terceiro alegar que o bem penhorado não mais pertence ao devedor e, sim, a ele, pessoa estranha ao processo, e ajuíza a ação denominada "embargos de terceiro", pedindo a desconstituição da penhora. Em um caso analisado pela Turma Recursal de Juiz de Fora, os julgadores rejeitaram a pretensão nesse sentido, ao constatar a tentativa de fraude à execução. Isso ocorre quando o executado-devedor aliena bens ou direitos de sua propriedade, quando já corre contra ele demanda judicial capaz de levá-lo ao estado de insolvência (que é quando o devedor possui mais dívidas do que bens para saldá-las). A matéria é tratada no artigo 593, inciso II, do Código de Processo Civil.
No caso do processo, os julgadores constataram que a sócia de uma empresa vendeu o imóvel para o seu próprio irmão, depois do ajuizamento de uma ação trabalhista contra ela, quando já se encontrava em estado de insolvência. Em seu recurso, o irmão da devedora tentou convencer os julgadores de que havia comprado o imóvel da irmã em 2010, antes da distribuição da ação, em 2011. Ele sustentou que apenas o reconhecimento das firmas no contrato foi feita após a celebração do negócio, o que se justifica por ter sido realizado entre parentes, em confiança mútua.
No entanto, a relatora do recurso, juíza convocada Maria Raquel Ferraz Zagari Valetim, não acatou esses argumentos. Ela esclareceu que o fato de o embargante não figurar formalmente como proprietário não impede o ajuizamento dos embargos de terceiro, já que ele é possuidor do imóvel. Nesse sentido, citou a Súmula 84 do STJ, pela qual "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda, ainda que desprovida de registro" . Nesses termos, foi reconhecida a legitimidade do embargante.
Já quanto à alegação de fraude, ficou claro para a relatora que tudo não passou de uma tentativa de impedir a execução. Ao analisar as provas, ela não teve dúvidas de que a "transação" ocorreu após o ajuizamento da ação trabalhista. Nesse sentido, destacou que, apesar de constar uma data de 2010 no "Contrato de Compra e Venda de Imóveis", as firmas só foram reconhecidas em 2011. "Tal situação, indubitavelmente, impede a certeza acerca da data da formalização do contrato" , ressaltou, citando o artigo 370 do CPC, que trata da situação ao dispor que, em relação a terceiros, deverá ser considerado datado o documento no dia em que for registrado ou a partir do ato ou fato que estabeleça, de modo certo, a anterioridade da formação do documento.
A relatora também pontuou que, ao contrário do alegado pelo embargante, o bem penhorado não consta na declaração relativa ao exercício de 2011, mas somente na posterior. Também outros documentos no nome do embargante, como IPTU e contrato de locação, se referem ao ano 2011 ou 2012. Pesou ainda o fato do embargante ser irmão da sócia executada na reclamação trabalhista. De acordo com a relatora, ela foi incluída no polo passivo da demanda desde o início, em razão da paralisação das atividades empresariais, havendo pedido de condenação solidária dos reclamados. Portanto, não se pode argumentar que a personalidade jurídica impediu o conhecimento da demanda. Por fim, dados do processo sinalizaram a insolvência da devedora, demonstrando que contra ela se arrastam outras execuções.
Diante desse contexto e chamando a atenção para as peculiaridades do processo, a Turma de julgadores considerou o negócio jurídico ineficaz perante a execução, nos termos do artigo 593, inciso II, do CPC. A penhora sobre o imóvel foi confirmada.