Juiz mantém justa causa de gerente que desviou mercadoria para pagar dívidas pessoais
Uma gravação de vídeo em que o gerente de uma empresa de cimentos confessava ter desviado mercadorias para pagar dívidas pessoais. Esta foi a prova decisiva para que o juiz substituto Glauco Rodrigues Becho, atuando na Vara do Trabalho de Ponte Nova, decidisse manter a justa causa aplicada ao empregado por falta grave. Dizendo-se injustiçado, o trabalhador procurou a Justiça do Trabalho pedindo a conversão da dispensa para sem justa causa, bem como o pagamento de indenização por danos morais e materiais. Mas o magistrado entendeu que a razão está com a empresa.
O reclamante era gerente de uma filial da reclamada, sendo o responsável pelo carregamento dos caminhões, fiscalização de atividade, conferência do estoque local, acertos salariais e repasse de valores à sede. Segundo alegou, a empresa o acusou de ter desviado mercadoria, mas esta é que adota procedimentos de vendas falhos e propensos a erros e fraudes. Ainda de acordo com o empregado, ele teria sido coagido a assumir a fato e, por isso, acabou declarando, de próprio punho, que causou prejuízo de R$18.900,00 à empresa. Sofreu humilhação e foi chamado de ladrão publicamente, sendo dispensado por justa causa indevidamente, no seu entendimento.
Ao analisar as provas, o juiz, de fato, constatou a desorganização contábil da reclamada. Mas ponderou que o empregado não poderia se aproveitar dessa situação. Para o julgador, ficou claro que ele agiu de forma ilícita. Foi o que revelou uma gravação de vídeo apresentada pela ré. Conforme esclareceu o magistrado, a gravação ambiental por um dos interlocutores é considerada prova lícita para fins de defesa de direito em processo judicial. Mesmo porque, no caso, o reclamante concordou expressamente com devagração e, após a exibição do DVD, confirmou que a conversa gravada foi real. O magistrado aplicou o artigo 383 do CPC, segundo o qual "qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica, a cinematográfica, fonográfica ou de outra espécie, faz prova dos fatos ou das coisas representadas, se aquele contra quem foi produzida lhe admitir a conformidade" .
Na conversa gravada, um representante da ré questiona o reclamante sobre a diferença encontrada na quantidade de cimento. É que seis clientes haviam negado ter recebido a mercadoria que estava sendo cobrada deles. Como o reclamante alimentava o sistema, teria que saber. Depois de muita conversa, durante a qual foi dada toda oportunidade de esclarecer o ocorrido, o empregado acabou admitindo que traiu a confiança do representante da ré e que tirou o cimento para pagar dívidas pessoais. Ele emitiu notas frias e causou um desfalque de R$18.900,00.
Conforme observou o juiz, durante a conversa, o próprio reclamante se referiu à justa causa. Depois, apresentou outra proposta, considerada absurda pelo magistrado: que a reclamada o dispensasse sem justa causa, como forma de tentar ressarcir parte do prejuízo gerado. Pelas imagens do vídeo, o magistrado verificou que o gerente já havia se levantado da cadeira para deixar a sala quando o empregado apresentou outra proposta: que a empresa ficasse com o acerto dele e ele veria com um tio para pagar a diferença, assinando todos os papéis.
"Ora, após indicar a justa causa, solicitar dispensa imotivada para quitar parte do débito oriundo do desvio, o próprio reclamante convoca o gerente para propor o pagamento integral através de um tio, ou seja, confessando nitidamente a responsabilidade pelo prejuízo advindo da conduta ilícita, atentando-se que o autor, inclusive, confessou que utilizou o valor para quitar dívidas pessoais, com minúcias, sendo totalmente inviável a tese exordial" , destacou o juiz, afastando qualquer possibilidade de coação por parte da empresa, conforme alegado na inicial. E explicou: "a coação capaz de invalidar a confissão é aquela que incute na parte fundado receito de dano à sua pessoa, à sua família ou a seus bens (art. 98 do CC), o que, definitivamente, não se constata no diálogo analisado. Doutro lado, não é considerada coação a ameaça do exercício normal de um direito nem o simples temor reverencial (art. 99 do CC)" .
Por todas essas razões, o magistrado considerou provada a prática de ato de improbidade a justificar a dispensa do reclamante por justa causa, nos termos do artigo 482, inciso "a" da CLT. O reclamante não conseguiu provar a coação e ameaça alegadas, o que era sua obrigação, conforme artigo 818 da CLT. Nesse contexto, os pedidos formulados foram todos julgados improcedentes. Houve recurso, mas o TRT-MG manteve a decisão.