Pedido de demissão só é convertido em rescisão indireta com prova clara do ato faltoso do empregador
Uma faxineira procurou a Justiça do Trabalho dizendo que foi submetida a ambiente de trabalho hostil e nocivo à saúde na clínica médica onde trabalhava. Ela contou basicamente que sofreu perseguição diante da necessidade de passar por uma cirurgia ortopédica, que impediria a prestação dos serviços. De acordo com a trabalhadora, a conduta do patrão tornou o vínculo de emprego insustentável, o que acabou fazendo com que ela pedisse demissão.
Mas, na Justiça, ela pretendeu invalidar o pedido de demissão, alegando que foi o empregador quem deu causa à rescisão, ao descumprir obrigações trabalhistas. A faxineira pleiteou, então, o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho. Essa forma de desligamento é requerida pelo empregado na Justiça do Trabalho diante de um ato faltoso do empregador. Assim como o patrão pode aplicar a justa causa ao empregado que pratica uma falta grave, o empregado também pode tomar essa iniciativa em relação ao empregador. A matéria é disciplinada no artigo 483 da CLT e traz como consequência o pagamento das verbas devidas na dispensa sem justa causa. Também em razão de irregularidades que teriam sido cometidas pela empresa, a trabalhadora pretendeu receber uma indenização por danos morais.
No entanto, ao analisar o caso na 7ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, a juíza titular Maria Cristina Diniz Caixeta não deu razão à reclamante. Conforme observou na sentença, a própria empregada reconheceu que pediu demissão, não alegando a existência de vícios na confecção do documento ou qualquer outra irregularidade. Nesse contexto, a julgadora não viu qualquer motivo para considerar inválido o pedido de demissão.
Por outro lado, a faxineira também não comprovou as faltas imputadas ao patrão. A magistrada lembrou que ela tinha obrigação de produzir provas de suas alegações, nos termos do que dispõe o artigo 333, inciso I, do CPC. A juíza constatou que a reclamada, por sua vez, apresentou diversos atestados médicos, que mostram que a reclamante poderia se ausentar de suas atividades sem maiores problemas, sempre que precisasse.
Para a julgadora, ficou claro que a reclamante não queria mais manter o vínculo de emprego, tanto que pediu demissão. A juíza ponderou sobre essas situações em que o empregado quer sair do emprego e acaba buscando a Justiça apenas para homologar a rescisão e tentar transformá-la em dispensa sem justa causa:
"A preservação do contrato de trabalho é hoje uma preocupação para aqueles que militam no mercado, sendo a rescisão indireta uma exceção cuja prova para o seu reconhecimento há de ser robusta e inequívoca, sob pena de transformar o Judiciário Trabalhista em órgão homologador de rescisões contratuais, onde direitos são transacionados, livrando-se o empregador de suas mínimas obrigações e transferindo-se para os cofres públicos a incumbência de pagar o seguro desemprego para aquele que quer estar desempregado, bem como configura lesão ao FGTS, na medida em que esse não se destina a ser liberado para quem não tem mais interesse em trabalhar".
Com esses fundamentos, a magistrada indeferiu o pedido de reversão da demissão para rescisão indireta e julgou improcedentes os pedidos de aviso prévio, férias proporcionais, 13º salário proporcional, multa de 40% do FGTS e entrega de guias. O pedido de indenização por danos morais também foi julgado improcedente, por ausência de provas quanto à irregularidade da conduta da clínica reclamada. Da decisão cabe recurso para o TRT da 3ª Região.