Justiça do Trabalho identifica cerceamento de defesa em encerramento precoce da audiência virtual
Houve falha de conexão que prejudicou depoimento de testemunha.
Julgadores da Oitava Turma do TRT de Minas reconheceram a nulidade processual que atingiu a sentença do juízo da 1ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora e determinaram a reabertura da instrução para ouvir uma testemunha. Ela havia sido convidada pelo reclamante, no processo contra uma empresa de vigilância e segurança privada e outra de telefonia móvel. O colegiado, por unanimidade, acompanhou o voto do relator, juiz convocado Danilo Siqueira Faria. Ele considerou que o encerramento precoce da instrução processual, por falha na conexão da internet, prejudicou o autor. O problema técnico impediu a formulação de perguntas à testemunha, por meio das quais pretendia provar os fatos constitutivos do direito postulado, que foi indeferido pela sentença.
A discussão versava sobre horas extras, inclusive invalidade dos cartões de ponto, bem como indenização por danos morais decorrentes de ameaça, coação e constrangimento que teriam sido praticados pela empresa tomadora dos serviços. A testemunha estava sendo inquirida na audiência realizada por videoconferência, quando começaram a ocorrer falhas por perda de conexão. Diante disso, o juiz de primeiro grau, após consignar o fato, decidiu encerrar a instrução processual. Ele registrou na ata que: "no início da audiência foi estabelecido perfeito contato com a testemunha", sob protesto do reclamante.
Na sequência, proferiu a sentença, julgando improcedentes os pedidos por ausência de prova dos direitos pretendidos. Inconformado, o trabalhador interpôs recurso, pedindo a nulidade processual e a reabertura da instrução para ouvir a testemunha. E o relator lhe deu razão.
Chamou a atenção do relator o fato de o juiz instrutor ter acolhido o argumento da empresa de que fosse desconsiderado o depoimento da única testemunha ouvida. Na sentença, constou que “se as partes não tiveram oportunidade de participar da sua produção, não se aperfeiçoou o exercício do direito fundamental à prova”. Os horários lançados nos controles de jornada foram considerados verdadeiros, “por ausência de prova em sentido contrário”, sendo os pedidos de horas extras rejeitados, levando-se em conta ainda que não haviam sido apontadas horas extras pendentes de pagamento.
Mas, na avaliação do relator, a interrupção do depoimento da testemunha causou prejuízo ao trabalhador e não pode prevalecer. “Em que pese o teor do artigo 765 da CLT c/c artigo 370, do CPC, e ainda que a celeridade e a economia processuais sejam princípios norteadores, informadores da processualística do trabalho, o encerramento precoce da instrução processual, e a própria desconsideração da parte colhida da oitiva testemunhal, em razão da instabilidade da conexão e perda de contato durante o depoimento, configurou inequívoca ofensa aos postulados do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, de envergadura constitucional”, registrou no voto.
Asseverou o relator que a regulação das teleaudiências por meio da Resolução CNJ nº 314/2020 prevê a possibilidade de adiamento do ato por eventual impossibilidade técnica ou de ordem prática (parágrafo 1º do artigo 6º). A Resolução nº 329/2020 do CNJ, por sua vez, determina que as audiências e atos processuais realizados por videoconferência deverão observar os princípios constitucionais inerentes ao devido processo legal e a garantia do direito das partes, como “segurança da informação e da conexão, com adoção de medidas preventivas a falhas técnicas” (item V) e “o direito da defesa em formular perguntas diretas às partes e às testemunhas" (item VII, artigo 4º).
Além disso, observou que o artigo 5º do Ato nº 11/2020 da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho dispõe que deverão ser adiados os atos processuais que eventualmente não puderem ser praticados pelo meio eletrônico ou virtual, por absoluta impossibilidade técnica ou prática a ser apontada por qualquer dos envolvidos, devidamente justificada.
A decisão citou posicionamento recente da própria 8ª Turma, em semelhante discussão.
“Diante da natureza fática da questão controvertida, materializado o prejuízo na improcedência integral das pretensões formuladas, obstar o autor do direito à produção integral da prova implicou flagrante cerceamento ao direito de defesa e afronta aos ditames do inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal”, concluiu ao final.
Com esses fundamentos, o relator acolheu a pretensão recursal de nulidade processual e determinou o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução, com a oitiva da testemunha previamente arrolada pelo trabalhador. Depois disso, o juiz de primeiro grau deverá proferir nova decisão, como se entender de direito.