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Varejista é condenada em horas extras por não conceder a vendedora “intervalo da mulher” em período anterior à reforma

publicado: 16/03/2018 às 00h00 | modificado: 15/03/2018 às 01h59
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A 1ª Turma do TRT de Minas confirmou sentença que reconheceu à ex-empregada de uma grande empresa varejista o direito ao intervalo de 15 minutos antes da prestação de horas extras, o famoso “intervalo da mulher”, previsto no artigo 384 da CLT, nos dias em que ela cumpriu jornada extraordinária.

É importante observar que o contrato de trabalho da vendedora começou e terminou antes da chamada reforma trabalhista, tendo a reclamação sido proposta também antes da entrada em vigor da Lei 13.467/17, que revogou o artigo 384 da CLT. Por isso, a aplicação da nova lei ficou afastada no caso em julgamento (veja a posição da magistrada quanto a essa questão no tópico final).  

Igualdade, com respeito às diferenças - Ao analisar o recurso da varejista, a juíza convocada Ângela Castilho Rogêdo Ribeiro lembrou que a questão da constitucionalidade do artigo 384 da CLT foi analisada pelo Pleno do TST, ao ser apreciado Incidente de Inconstitucionalidade no RR nº 1540/2005-046-12-00.5, em 17/08/2008. Os ministros concluíram que o dispositivo foi recepcionado pela Constituição, independentemente de existir igualdade entre homens e mulheres estabelecida no artigo 5º da Constituição Federal. O fundamento foi o de que a igualdade jurídica e intelectual entre homens e mulheres não afasta a natural diferenciação fisiológica e psicológica dos sexos. Foi registrado não escapar ao senso comum a patente diferenciação de compleição física entre homens e mulheres.

Não fosse o bastante, a relatora reportou-se à decisão do Plenário do STF, que, em 27/11/2014, por maioria, negou provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 658312, com repercussão geral reconhecida. Na oportunidade, foi firmada a tese de que o artigo 384 da CLT foi recepcionado pela Constituição da República de 1988. Foi lembrado na decisão que o ministro Dias Toffoli, relator do RE, ressaltou que as disposições constitucionais e infraconstitucionais não impedem que ocorram tratamentos diferenciados, desde que existentes elementos legítimos para tal. O ministro concluiu que a questão "trata de aspectos de evidente desigualdade de forma proporcional", citando outros exemplos na legislação, em que há disposição específica de tratamento diferenciado legítimo para a mulher, como prazo menor para aposentadoria, a cota de 30% para mulheres nas eleições e a Lei Maria da Penha.

A relatora enfatizou que a matéria inclusive já está sedimentada na Súmula nº 39 do TRT da 3ª Região, proferida para fins de unificação de jurisprudência, aprovada pela Resolução Administrativa 166, de 09.07.2015:

TRABALHO DA MULHER. INTERVALO DE 15 MINUTOS. ART. 384 DA CLT. RECEPÇÃO PELA CR/88 COMO DIREITO FUNDAMENTAL À HIGIENE, SAÚDE E SEGURANÇA. DESCUMPRIMENTO. HORA EXTRA.O art. 384 da CLT, cuja destinatária é exclusivamente a mulher, foi recepcionado pela Constituição da República de 1988 como autêntico direito fundamental à higiene, saúde e segurança, consoante decisão do Supremo Tribunal Federal, pelo que, descartada a hipótese de cometimento de mera penalidade administrativa, seu descumprimento total ou parcial pelo empregador gera o direito ao pagamento de 15 minutos extras diários.

Com base nesses fundamentos, decidiu que a trabalhadora tem direito ao intervalo do art. 384/CLT, nos dias em que houve prestação de horas extras, com os devidos reflexos. A Turma de julgadores acompanhou o entendimento e negou provimento ao recurso da empresa varejista. Houve interposição de Recurso de Revista, ainda pendente de julgamento.

Lei da reforma: critérios para aplicação

A decisão, proferida em 05/02/18, não fez menção à Lei 13.467/17, em vigor desde o dia 11/11/17, a qual revogou o artigo 384 da CLT. Mas, em decisão anterior, a juíza Ângela Castilho Rogêdo manifestou preocupação quanto à necessidade de se estabelecerem critérios de aplicabilidade da nova lei para os contratos de trabalho que se iniciaram antes da sua vigência, ou mesmo se encerraram antes dela, como no caso julgado.

A magistrada lembra que a lei da reforma não trouxe qualquer dispositivo a respeito de direito intertemporal. A medida provisória 808, editada 3 dias após a entrada em vigor da chamada reforma trabalhista, ao estatuir que a Lei 13.467/17 se aplica, na integralidade, aos contratos vigentes, pouco auxilia na questão, vez que essa observância já era previsível tendo em vista a previsão contida no artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. “O que cabe-nos ponderar, portanto, é sobre a aplicação da nova ordem legislativa com observância dos princípios do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada. Além disso, não podem ser olvidados o princípio da irredutibilidade salarial e da não alteração lesiva das condições de trabalho”, alertou, lembrando ainda que o inciso XXXVI do artigo 5º da Constituição Federal dispõe que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada".

Para a julgadora, admitir a aplicação imediata da lei que extinguiu, reduziu ou muito dificultou a configuração de direitos dos empregados seria uma afronta ao princípio basilar do Direito do Trabalho que é o princípio da proteção do trabalhador. E retirar direitos dos empregados com contratos já em curso na época da entrada em vigor da reforma seria um verdadeiro retrocesso. “Assim, entendo que o contrato de trabalho - com as normas benéficas que a ele aderiram - é da classe dos atos definidos pela lei como ato jurídico perfeito. Na aplicação da lei nova, em tudo que reduz os direitos até então conferidos ao trabalhador, o intérprete deverá considerar os princípios da primazia do trabalho, da dignidade do trabalhador e da inalterabilidade das condições contratuais mais benéficas, conforme previsão contida no artigo 468 da CLT, ainda em vigor”, pontuou a juíza, concluindo que a lei nova, quanto aos dispositivos de natureza material, será aplicável no que for mais benéfica ao empregado.

Entre a série de direitos extintos ou reduzidos pela reforma, ela cita a eliminação das horas in itinere, o pagamento apenas do tempo não gozado do intervalo para refeição e descanso, a desconsideração do feriado em regime de escala 12 x 36 e a eliminação do intervalo do artigo 384 da CLT, entre outros.

Conforme ponderou a magistrada, em todas essas hipóteses de evidente extinção ou redução de direitos, a aplicação da nova lei só deverá ocorrer em relação aos contratos cuja vigência tiver se iniciado a partir de 11 de novembro de 2017. E não era esse o caso do contrato da vendedora que, como visto acima, teve seu início e término antes dessa data, tendo sido a ação proposta também anteriormente à entrada em vigor da nova lei.

Processo

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