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Turma descarta pejotização em contrato de representante comercial autônomo

publicado: 08/03/2018 às 00h00 | modificado: 08/03/2018 às 00h35
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“Nem toda contratação através de pessoas jurídicas é fraudulenta!”. Esse foi o alerta dado pelos magistrados da 10ª Turma do TRT mineiro ao julgarem desfavoravelmente o recurso de um vendedor, mantendo a sentença que não reconheceu o vínculo de emprego entre ele e uma empresa de comércio de produtos alimentícios. Diante das provas produzidas, foi descartada a existência de fraude à legislação trabalhista. A conclusão foi de que o vendedor desenvolvia suas atividades como representante comercial autônomo, sem subordinação jurídica, requisito essencial para a configuração do vínculo de emprego.

O vendedor insistia no reconhecimento do vínculo de emprego com a ré por dois períodos em que prestou serviços como pessoa jurídica, além do reconhecimento da unicidade contratual, já que em dois outros períodos teve sua CTPS anotada pela empresa. Argumentou que o próprio preposto da ré reconheceu que ele sempre desempenhou as mesmas funções de “Gerente Regional de Vendas”, seja na condição de celetista, seja como representante autônomo, o que demonstra que a rescisão contratual e sua posterior contratação como pessoa jurídica ocorreram com o único intuito de fraudar seus direitos trabalhistas. Já a empresa afirmou que, depois da primeira rescisão do contrato de emprego, o próprio reclamante foi quem propôs sua contratação como representante comercial autônomo, através de sua própria empresa.

Atuando como relator, o juiz convocado Alexandre Wagner de Morais Albuquerque ressaltou que a situação retratada diz respeito ao fenômeno denominado "pejotização", uma realidade cada vez mais presente no mercado de trabalho atual, na qual a empresa demite seu empregado e exige que ele constitua uma empresa para que continue a lhe prestar serviços. “Por meio dessa ‘manobra’, as empresas tem a intenção de reduzir seus custos, deixando de pagar os encargos trabalhistas, o que permite um certo implemento na remuneração do prestador de serviços, com aparente vantagem para os dois lados”, destacou.

Entretanto, conforme ressaltou o julgador, nem toda contratação através de pessoas jurídicas é fraudulenta, como no caso, em que não se constatou fraude à legislação trabalhista.

A prova testemunhal revelou que o vendedor, de fato, ingressou na empresa como supervisor de vendas, com o contrato registrado na CTPS, atuando no controle de todos os representantes comerciais da ré no Estado de Minas Gerais. Após dois anos, em razão de modificação do formato da gerência de vendas, foi proposto a ele que continuasse o mesmo trabalho, mas, desta vez, por meio de pessoa jurídica por ele constituída. Enquanto empregado, o reclamante recebia salário fixo e a empresa cobria as despesas, inclusive cedendo carro para o trabalho. Já como pessoa jurídica, ele passou a auferir comissões, com certa evolução do trabalho, acompanhada de um aumento remuneratório, embora sem muitas mudanças nas tarefas realizadas. As testemunhas também revelaram que ele tinha total autonomia para decidir os seus horários, sendo ele próprio responsável por sua agenda. Também ficou demonstrado que, enquanto pessoa jurídica, o reclamante poderia prestar serviços a outras empresas (embora nunca o tenha feito), não tendo obrigação de comparecer às reuniões promovidas pela ré, além de ter liberdade para negociar os preços.

Como notou o julgador, as condições de trabalho do vendedor/representante, nos períodos com e sem registro na CTPS, eram semelhantes. Contudo, o que mais chamou a atenção do relator foi a grande diferença entre a remuneração recebida por ele como empregado e como pessoa jurídica. Documentos demonstram que, quando prestou serviços através de sua própria empresa, o representante recebia cerca de R$ 20.000,00 por mês. Já como empregado celetista, ele recebia de R$ 3.500,00 a R$ 8.500,00 mensais. Nas palavras do relator, “a remuneração da pessoa jurídica foi superior em mais de 200% àquela recebida pelo autor quando do vínculo jurídico, o que vai muito além da redução de custos obtida pela empresa por não arcar com os encargos trabalhistas do empregado”. Nesse contexto, o juiz convocado ponderou que não é verossímil considerar que a empresa tenha alterado a forma de contratação do trabalhador com o intuito de fraudar os seus direitos trabalhistas, sem obtenção de vantagem econômica.

“Por tudo isso, entendo que não há como reconhecer a alegada fraude à legislação trabalhista, pois não restou demonstrado o preenchimento de todos os requisitos para a caracterização do vínculo empregatício. Assim como o juízo de origem, estou convencido de que, com relação aos períodos não registrados na CTPS, o reclamante exerceu a profissão de representante comercial autônomo, sem subordinação jurídica” concluiu o relator, no que foi acompanhado pela Turma revisora.

Processo

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