Empregadores que enganaram o juízo sobre sua real atividade são condenados por litigância de má-fé
A 2ª Seção Especializada em Dissídios Individuais, acompanhando voto da relatora, juíza convocada Taísa Maria Macena de Lima, deu provimento a ação rescisória proposta pelo espólio reclamante para rescindir o acórdão (decisão de 2º Grau) proferido na ação principal, procedendo a novo julgamento do recurso aviado naquele processo. É que foi constatado que, no processo original, os reclamados agiram de má-fé para induzir o juízo a erro, tendo sido proferida decisão equivocada por esse motivo.
Na ação trabalhista, em que o espólio do empregado falecido postulou o pagamento de verbas e direitos previstos na convenção coletiva dos trabalhadores em construção civil, os pedidos foram julgados improcedentes por ter a sentença acolhido a tese da defesa de que a ré era pessoa física que não exerce atividade econômica. Como ficou convencido de que o empregado havia trabalhado apenas na construção da própria residência da empregadora, o juiz concluiu que ele não poderia ser enquadrado como empregado das indústrias que representam aquela categoria profissional. A conclusão, portanto, foi de que o vínculo empregatício seria de natureza doméstica, já que a construção de um imóvel residencial não poderia ser equiparada à construção civil para fins de enquadramento sindical. Esse entendimento foi mantido pela Turma que julgou o recurso da autora.
Como a viúva não conhecia o local de trabalho de seu marido, foi também enganada pela ré, acreditando na alegação contida na defesa. Somente após o trânsito em julgado do acórdão tomou conhecimento de que a ré e o seu respectivo marido, que é engenheiro civil, são sócios, desde 1991, de uma empresa que atua no ramo da construção civil, construindo prédios de apartamentos na região do bairro Buritis.
Para comprovar suas alegações, a viúva apresentou uma série de documentos novos, como o contrato social da empresa dos réus, fotografias de prédios em construção com placas ostentando os nomes de ambos, além de certidões cartorárias que atestam que estes são legítimos possuidores, não de uma residência, mas sim de todas as unidades que compõem um condomínio residencial.
Ou seja, tanto a viúva, quanto os magistrados foram induzidos a erro pela ré que, agindo com dolo, deliberadamente mentiu em juízo. Casos como esse estão previstos no artigo 485, inciso IX, do Código de Processo Civil, que determina a rescisão (anulação) da sentença ou acórdão transitados em julgado.
Ocorreu, no caso, um erro de fato, apurável por simples exame dos documentos juntados aos autos. “ A hipótese aqui retratada não é a da parte que silencia a respeito de fatos contrários a ela ou que faz afirmação de fato inverídico, sem má-fé, mas sim de deliberada alteração da verdade, caracterizando tal proceder ardil do qual resulta o desvio do juiz de uma sentença justa ” – declara a juíza. Isto porque, se a ré não tivesse ocultado a sua atividade econômica, o resultado da demanda seria outro, pois o falecido teria sido enquadrado como empregado das indústrias da construção civil, com direito às vantagens previstas na CCT da categoria.
Decretando a rescisão do acórdão proferido no processo principal, a Seção Especializada passou imediatamente ao rejulgamento da causa, a teor do artigo 488 do CPC. Como a defesa apresentada pela ré havia se limitado a impugnar o seu enquadramento como integrante da categoria econômica, não contestando os pedidos formulados, presumiram-se verdadeiras as alegações do autor, nos termos do artigo 302 do CPC, sendo deferidas à viúva indenização por morte no valor de R$10.800,00, indenização correspondente a 50 kg de alimento (R$122,46) e pagamento de multa por descumprimento da CCT, no valor de R$19,07.
A reclamada foi ainda condenada por litigância de má-fé (art. 17 do CPC) e por ato atentatório à dignidade da Justiça, ao tentar alterar a verdade dos fatos, mesmo diante de documentos cartorários incontestáveis. A multa, de 1% sobre o valor da causa, será revertida em favor do espólio autor.