Morte de trabalhador por excesso de jornada leva JT a impor a empresa limites para prorrogação e compensação de trabalho extra
Empresa autuada por fiscais da Delegacia Regional do Trabalho, na qual um empregado morreu por ser forçado a cumprir jornada muito superior à contratual, foi alvo de ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho, que requereu medidas judiciais para que a ré (METALSIDER LTDA) seja forçada a cumprir a legislação de proteção à saúde e segurança no trabalho. A ação foi julgada parcialmente procedente em primeiro grau e mantida pela 1ª Turma do TRT-MG, sendo determinada a limitação da jornada de trabalho dos empregados a 08 horas diárias e 44 semanais, apenas se admitindo o trabalho em sobrejornada nos termos dos artigos 59 e 61 da CLT. O acórdão determina ainda que a empresa conceda folga semanal de, no mínimo, 24 horas consecutivas, na forma do art. 67 da CLT, com intervalo de 11 horas entre duas jornadas, além de intervalo para refeição de acordo com o disposto no artigo 71 da CLT.
A ilegalidade do procedimento da empresa ao desrespeitar os limites legais da jornada de trabalho - direitos que não podem sequer ser negociados - já vinha sendo constatada ao longo dos últimos 05 anos. A resistência da empresa em implementar as medidas de caráter preventivo, inclusive aquelas capazes de neutralizar ou reduzir os riscos do ambiente do trabalho, é que levaram o MPT ao ajuizamento da ação civil pública na Justiça do Trabalho.
Segundo o relator do recurso, desembargador Marcus Moura Ferreira, uma vez configurado o ato ilícito, basta a probabilidade de sua repetição para que seja cabível a tutela jurisdicional inibitória (proibição do ato ou omissão que possa vir a provocar o dano), com caráter pedagógico e preventivo. Desta forma, explica o desembargador, não é necessário que o dano já tenha ocorrido, pois o que se pretende é exatamente prevenir a sua ocorrência.
A fiscalização realizada pela Seção de Segurança e Saúde do Trabalho da DRT local apontou como causas do acidente de trabalho que levou à morte de um dos empregados da empresa, o excesso de jornada, realização de horas-extras diárias e falta de descanso semanal remunerado.
Em parecer técnico realizado nos controles de jornada juntados ao processo, somado aos relatórios da fiscalização, foi constatado que a empresa prorrogava a jornada de trabalho de seus empregados além do limite de duas horas diárias, sem justificativa legal (art. 59/CLT); deixava de conceder-lhes o descanso semanal, havendo casos de trabalho em até 23 dias seguidos, sem ocorrência da folga de 24 horas consecutivas (art. 67/CLT); não concedia o descanso mínimo de 11 horas entre uma jornada e outra (art. 66/CLT), além de reduzir o intervalo intrajornada mínimo de 01 hora.
A empresa sequer demonstrou a ocorrência de necessidade imperiosa que justificasse a prorrogação da jornada, nos termos do art. 61 da CLT. Ao contrário, limitou-se a afirmar que isso ocorria em função de cursos de reciclagem. Ficou demonstrado ainda no processo que a empresa não cumpriu com o determinado pelo § 1º do art. 61 da CLT, ou seja, deixou de comunicar o excesso de trabalho no prazo de 10 (dez) dias à autoridade competente.
A gravidade da situação atingiu o seu ápice com a morte do empregado, que fazia horas extras acima do permitido legalmente, raramente usufruindo do repouso semanal, como constatou o laudo pericial realizado pela DRT. E, ainda, o próprio relatório feito pela empresa após o acidente apontou que o empregado trabalhava sem uso de EPIs, sem treinamento e que seu ambiente de trabalho não tinha placas de sinalização.
De acordo com o relator, esses fatos caracterizam o descaso da empresa com a saúde e segurança de seus empregados, que ainda se recusou a firmar o Termo de Compromisso de Ajuste de Conduta proposto pelo MPT.
O desembargador considerou inválidas as normas coletivas que permitem a “dobra de jornada” dos empregados, ou mesmo a previsão de horas extraordinárias além do legalmente previsto, pois esses direitos são indisponíveis. “ Assim, a possibilidade convencional de que o empregado trabalhe em dobra de jornada, perfazendo horas extras em número superior a 80% da jornada normal (ou seja: acima de 14h30min diárias), significa derrocar o limite inscrito no § 2º do art. 61, de doze horas ”- conclui.
Embora a realização de horas extras favoreça o empregado, o relator pontua que o trabalho em sobrejornada é muito interessante para o setor produtivo, pois permite maior flexibilidade de ajuste da produção, favorecendo a contratação de empregados com salários mais baixos, porque estes serão complementados pelo pagamento das horas adicionais.
“ Desta forma, as atuais práticas de flexibilização das normas trabalhistas - tão ardorosamente defendidas pela ré em seu recurso - costumam trazer em seu bojo uma nova forma de exploração do empregado e conseqüente empobrecimento da população, acentuando as desigualdades e promovendo a exclusão social, pelo que é preciso desmistificar a falsa idéia de que é necessário flexibilizar ainda mais as relações trabalhistas para gerar ou manter empregos ” – conclui o relator.