Recepcionista que faz ronda em shopping é equiparada a vigilante e ganha dano moral por ter de andar em fila indiana
A juíza Ana Maria Amorim Rebouças, titular da 15ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte analisou o caso de uma reclamante que, apesar de ter sido contratada para exercer a função de recepcionista, na verdade, sempre atuou como guardiã ou segurança em um shopping. Ela trabalhava com rádio comunicador, abordava suspeitos, realizava rondas e vistorias em todos os andares do shopping. Além disso, era obrigada a chegar ao trabalho bem antes do horário contratual para vestir o uniforme e maquiar-se. Ao final da jornada, tinha de formar uma fila indiana e percorrer todos os andares do shopping, inclusive a praça de alimentação, numa operação conhecida como "trenzinho", para que fosse feita a troca de turno.
Entendendo que houve desvio de função, a juíza concluiu que a reclamante tem direito ao piso salarial previsto nos instrumentos normativos da categoria dos vigilantes. Explica a magistrada que a Lei 7.102/83 estabelece, em seu artigo 15, que vigilante é o empregado que exerça vigilância patrimonial de estabelecimentos ou a segurança de pessoas físicas, realize o transporte de valores ou garanta a segurança do transporte de qualquer outro tipo de carga. Ela esclarece que é indiferente se a reclamante fez ou não o curso de vigilante, pois o que importa é saber é se as tarefas por ela desempenhadas eram inerentes ao cargo de recepcionista ou de vigilante. Isto porque, na Justiça do Trabalho, vigora o princípio pelo qual a realidade prevalece sobre a forma.
No caso, as testemunhas informaram que as tarefas da reclamante eram: realizar escolta de mercadorias, abordagem de fumantes, contato com a central de segurança por meio de códigos internacionais ao visualizar suspeitos, além de vistoria em banheiros e galerias. Segundo os depoimentos, os outros seguranças do shopping têm as mesmas funções e nenhum deles trabalha armado.
Com base nesses indícios, a juíza concluiu que a reclamante, de fato, exercia as funções inerentes à segurança e, portanto, deve receber o piso salarial da categoria. Mas ressaltou que o caso não é de enquadramento da empregada na categoria dos vigilantes, já que o enquadramento sindical é feito em função da atividade preponderante da empresa. ¿Trata-se apenas de se remunerar de forma igual aqueles que desempenham tarefas semelhantes, tendo em vista o princípio constitucional da isonomia¿ - pontuou, acrescentando que, independentemente de existir ou não quadro de carreira na empresa, ficou configurado o desvio funcional, pois a reclamante exercia função diversa daquela para a qual foi contratada e remunerada.
A sentença entendeu ainda que a empregada sofreu humilhações e constrangimentos morais ao ser obrigada a participar do "trenzinho". As testemunhas confirmaram que a supervisora distribuía a escala e as empregadas formavam uma fila e iam passando por cada posto de trabalho para a troca de turno. Assim, aquelas que estavam deixando o turno entravam no trenzinho para retornar ao vestiário, sujeitando-se às brincadeiras e chacotas feitas pelos clientes do shopping, em cada andar que passavam.
Para a juíza, a empregadora ultrapassou os limites do seu poder diretivo ao expor a reclamante e demais empregadas e esse constrangimento. ¿Desta forma, comprovado o erro de conduta da reclamada, com a conseqüente violação à honra e à imagem da reclamante, verificam-se violados os arts. 186 e 927 do CCB/2002 c/c o art. 5o, X, da Constituição Federal¿ - concluiu a juíza, condenando a empregadora à pagar à reclamante uma indenização por danos morais, fixada em R$3.000,00.
Por fim, foram deferidos à reclamante 35 minutos extras por dia, pelo tempo gasto com a maquiagem obrigatória para o trabalho, pois, como isso era exigência expressa da empresa, é considerado tempo à disposição do empregador, nos termos do artigo 4º da CCT, ainda que a maquiagem fosse feita na residência da empregada.