Juíza afasta efeitos da coisa julgada em ação envolvendo terceirização em empresas de telecomunicações
Na 15ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, a juíza Ana Maria Amorim Rebouças julgou a ação de uma operadora de telemarketing contratada pela CONTAX S.A para prestar serviços à TNL PCS S.A. A reclamante pediu vínculo direto com essa última, alegando ter exercido, durante todo o contrato, funções ligadas à atividade-fim da tomadora de serviços.
A TNL pretendeu afastar a pretensão, alegando a existência de coisa julgada, com efeito erga omnes (válido em face de todos e não apenas das partes da demanda) em razão do trânsito em julgado da decisão proferida pelo TRT da 10ª Região no julgamento da ação civil pública de âmbito nacional, proposta pelo Ministério Público do Trabalho. Nesse processo, segundo sustentou, foi reconhecida a licitude das atividades finalísticas das empresas de telecomunicações, a teor do disposto na Lei n. 9.472/97, cujos efeitos valem em face de todos, nos termos do art. 103 do Código de Defesa do Consumidor.
Analisando o caso, a juíza esclareceu que, conforme dispõe o art. 16 da Lei 7.347/85, a sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator. Exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que se poderá propor outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova. "Na hipótese vertente, observa-se que a referida ação civil pública foi julgada improcedente e embora a 2ª Turma do TRT da 10ª Região tenha reconhecido a licitude da terceirização em determinadas atividades do ramo de telecomunicações, ressalvou que cada caso deve ser examinado considerando-se as suas particularidades, a fim de se evitar a precarização do trabalho e as distorções eventualmente ocasionadas", destacou.
A juíza lembrou ainda que os artigos 103 e 104 do Código de Defesa do Consumidor também ressalvam o efeito de coisa julgada com efeito erga omnes nas ações coletivas, nas hipóteses em que o pedido for julgado improcedente por insuficiência de prova. A teor do artigo 104, as ações coletivas não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada, erga omnes ou ultra partes, não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva. A sentença destaca ainda o parágrafo 1° do artigo 103, pelo qual os efeitos da coisa julgada previstos nesse artigo não poderão prejudicar interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, grupo, categoria ou classe.
"Posto isso, cuidando-se de ação civil pública, aplica-se à espécie o disposto nos citados dispositivos do CDC, acerca do afastamento da coisa julgada por limitação da extensão do efeito erga omnes da decisão. Isso porque, tal como no afastamento da litispendência (art. 104 do CDC), não há impedimento àqueles prejudicados de ajuizamento de ação singular para defesa dos interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe (art. 103, §1º, do CDC)", ponderou a juíza afastando a alegação de coisa julgada.
Liminar do STF
A defesa da TNL PCS invocou ainda a existência de uma liminar concedida pelo Ministro Gilmar Mendes na reclamação 10.132, pela qual o STF validou a terceirização no ramo das telecomunicações, em face da existência da Lei 9.472/97. Para a juíza, essa decisão do STF, "por ora, não tem efeito vinculante e erga omnes, não alcançando automaticamente a presente demanda, mesmo porque vem prevalecendo no âmbito da mesma Corte a tese de que as decisões baseadas na Súmula 331 do TST não violam a Súmula Vinculante nº 10". No mais, acrescentou, trata-se de processo com partes distintas da demanda em julgamento. "E a decisão monocrática do STF é de natureza precária, já que não julgou definitivamente o mérito, sendo também desprovida de caráter vinculativo", finalizou, rejeitando o argumento.
Vínculo com a TNL PCS
No julgamento do mérito, a juíza entendeu que a reclamante, de fato, prestava serviços exclusivamente à TNL, trabalhando no serviço de informação (SAC). E essa função, segundo concluiu, está ligada à atividade-fim da empresa TNL PCS S.A., e não à sua atividade-meio.
A julgadora lembrou que o artigo 60 e seu parágrafo 1º da Lei 9.427/97 define o serviço de telecomunicações como o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação, sendo esta a "transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza". Portanto, segundo concluiu, as funções de telemarketing não podem ser consideradas secundárias, mas sim atividades ligadas à dinâmica produtiva empresarial, de necessidade constante, já que possibilitam a oferta de telecomunicação, mantendo o contato diretamente com os consumidores. Ou seja, sem o call center , a TNL não conseguiria cumprir suas finalidades. "A atividade aqui terceirizada não é de suporte, mas sim de concentração de esforços naquilo que é vocação principal da empresa, ou seja, os serviços de telefonia e atendimento aos clientes da Reclamada TNL PCS S.A", concluiu.
Para a juíza, não há, no caso, vulneração aos artigos 25 da Lei 8.987/95 e 94, II, da Lei 9.472/97, pois essas leis foram levadas em conta pela Súmula 331/TST, que nenhuma exceção fez às empresas de telecomunicações, como o fez expressamente em relação aos órgãos públicos.
Constatando a fraude à legislação trabalhista, a juíza reconheceu o vínculo de emprego diretamente com a TNL PCS, que deverá anotar o contrato de trabalho na CTPS da reclamante, na função de operadora de telemarketing. As diferenças salariais decorrentes do enquadramento da reclamante na categoria profissional dos empregados da TNL deverão ser pagas solidariamente por ambas as rés.