Neoplasia contraída por trabalhador de indústria nuclear gera presunção de nexo causal com o trabalho
Se o empregado trabalha exposto a agente radioativo, como urânio e tório, a presunção legal é de que o trabalho foi o causador da neoplasia maligna (câncer) por ele contraída, mesmo que o diagnóstico só tenha se revelado anos após a sua saída da empresa. Mas essa presunção é relativa, cabendo à empregadora o ônus de provar o contrário.
Assim decidiu a 10ª Turma do TRT-MG, ao analisar o caso de um ex-empregado de indústria nuclear, que trabalhava em minas onde se processa o tratamento físico e químico de minérios e outros materiais contendo urânio e tório para produção de concentrados radioativos, além da fabricação de ácido sulfúrico. Ele faleceu no curso do processo judicial, dias depois de se submeter à perícia médica oficial. A causa da morte foram complicações decorrentes de insuficiência renal crônica e do câncer de tireóide diagnosticado 08 anos depois que deixou de integrar os quadros da indústria nuclear.
A empresa argumentou que não há elementos para justificar sua responsabilização pelo adoecimento do ex-empregado e afirmou serem baixos os níveis de radiação encontrados no ambiente de trabalho. Mas a relatora do recurso, juíza convocada Wilméia da Costa Benevides, não lhe deu razão.
Segundo pontuou a relatora, o anexo I do Decreto 3.048/99 traz um elenco de agentes patogênicos causadores de doenças profissionais. Essa listagem inclui radiações ionizantes e arrola entre as atividades laborais de risco, a extração de minerais radioativos (tratamento, purificação, isolamento e preparo para distribuição), como o urânio. O anexo II, Lista A, da mesma norma, contém uma série cânceres causalmente relacionados com elementos radioativos. A interpretação conjunta de todas as normas técnicas e legais sobre o tema gera a presunção legal, em favor do trabalhador exposto a radiações, de que a doença contraída após anos de trabalho nessas condições, tem origem profissional. Caberia ao empregador provar o contrário, mas isso, na visão da magistrada, não se deu no caso.
De acordo com o perito oficial, a radiação ionizante é uma energia radiante potente que passa pelo corpo e ao se chocar com as células tem o poder de causar danos. Além disso, ela permanece em diversos compartimentos do corpo e continua a atingir as células dos tecidos, após o período de trabalho. A perícia médica entendeu claramente caracterizada a doença ocupacional e descartou expressamente a existência de qualquer outro fator (como, por exemplo, antecedentes familiares) que pudesse ser apontado como causa para a manifestação cancerígena que acometeu o trabalhador. Isto posto, assentada a perda e seu nexo de causalidade com o trabalho, não se há perquirir acerca de culpa para fins de condenação da empresa reclamada, pois se tem aqui uma hipótese expressa de responsabilidade civil objetiva em decorrência da natureza do dano sofrido e do negócio explorado , concluiu a relatora, citando ainda o artigo 21, XXIII, da Constituição Federal, pelo qual a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa .
Portanto, a Turma negou provimento ao recurso da empresa e determinou a imediata remessa de ofício à Comissão Nacional de Energia Nuclear, dando ciência da decisão. Considerando que o trabalhador, na data do exame pericial, encontrava-se descorado, em precário estado nutricional, com dificuldade para andar, falar e até para respirar, sendo considerado ¿inválido na concepção ampla da palavra¿, os julgadores mantiveram ainda a indenização por dano moral, fixada pela sentença em R$150,000,00.