Se a falência é decretada após nova Lei, aplica-se esta, ainda que feito o pedido na vigência da lei anterior.
A Turma Recursal de Juiz de Fora analisou um processo envolvendo direito intertemporal. Ou seja, com a entrada em vigor de uma nova lei, a Turma teve de decidir se uma situação nascida sob a égide de uma lei anterior será regida pela antiga ou pela nova lei. No caso, o ajuizamento do pedido de falência contra a empresa reclamada, atualmente representada pela massa falida, ocorreu sob a vigência da antiga Lei de Falências, que proibia a cobrança de multas contra a massa. E esse era, exatamente, o objeto da demanda que estava sendo julgada pela Turma. No entanto, a data de quebra aconteceu quando já vigia a nova lei, que não estabelece a restrição da norma anterior. Qual dispositivo, então, será aplicável ao caso?
Conforme esclareceu o juiz convocado Oswaldo Tadeu Barbosa Guedes, o processo decorre de execução fiscal, proposta pela União Federal, contra a empresa reclamada, que teve como origem multas administrativas aplicadas pela fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego à ex-empregadora, que acabou falindo. O pedido de falência foi distribuído em 28.01.2004, quando vigorava o Decreto-Lei nº 7.661/45, mas a quebra só foi decretada em 07.12.2005, quando já em vigor a nova lei falimentar.
A questão aí é que, nos termos do artigo 23, parágrafo único, III, do Decreto-lei nº 7.661/45, as penas em dinheiro, decorrentes de infração às leis penais e administrativas, não podem ser cobradas na falência. Por outro lado, o artigo 83, VII, da Lei nº 11.101/05, estabelece a classificação dos créditos na falência, sem mencionar qualquer impedimento para a execução das penas pecuniárias por infração das leis administrativas. O juiz de 1º Grau entendeu que se aplica ao processo o antigo Decreto, levando em conta a data de distribuição do pedido de falência. Nesse contexto, decidiu que o crédito fiscal não pode ser exigido e extinguiu a execução. Mas o juiz relator pensa diferente.
O artigo 192, caput, da Lei 11.101/2005, dispõe expressamente que a nova lei não se aplica aos processos de falência ou concordata ajuizados antes do início de sua vigência, os quais deverão ser concluídos com base no Decreto 7.661/45. Contudo, o parágrafo 4º, desse mesmo artigo, prevê que a nova legislação tem cabimento nas falências decretadas em sua vigência, mas que resultam da transformação de concordatas ou de pedidos de falência anteriores, às quais se aplicam, até a decretação, o teor do antigo Decreto.
"Buscando a melhor interpretação da norma, o STJ entendeu que à falência requerida anteriormente à Lei 11.101/2005, mas decretada na sua vigência, aplica-se o Decreto-lei até a prolação da sentença que decreta a quebra e, após esse momento, devem ser atendidos os dispositivos daquele diploma legal", frisou o magistrado, concluindo que incide na hipótese a norma de direito intertemporal contida no artigo 192, parágrafo 4º, da Lei nº 11.101/05. Portanto, aplica-se ao processo as disposições previstas no Decreto-lei nº 7.661/45 até 07.12.05, data da sentença que decretou a quebra e, depois dessa data, as determinações da Lei nº 11.101/05.
Com esses fundamentos, o juiz convocado deu razão parcial razão ao recurso da União Federal e declarou que os créditos decorrentes das penas em dinheiro, por infração às leis administrativas, podem ser cobrados da massa falida. No entanto, não foi determinado o prosseguimento da execução, como pretendido pela recorrente, mas, sim, que o valor total devido seja apurado, na forma prevista no artigo 9º, II, da Lei 11.101/2005, e expedida certidão para habilitação do crédito no quadro geral de credores, perante o Juízo falimentar competente.