Impetrante pode requerer desistência de Mandado de Segurança sem concordância da parte contrária
Pelo teor de decisão recente da 4ª Turma do TRT-MG, o impetrante do Mandado de Segurança pode requerer a desistência da medida antes de proferida sentença, independentemente da aquiescência da parte contrária. Nesse caso, não se aplica o disposto no artigo 267, § 4º, do CPC. Quem explica é o desembargador relator do recurso interposto pela União Federal, Júlio Bernardo do Carmo: "Com efeito, diferentemente do que ordinariamente acontece nas demais ações, no Mandado de Segurança, não se discute a existência de interesses tuteláveis das duas partes processuais, mas apenas eventual abuso de direito ou ilegalidade praticada em face da impetrante pela autoridade dita coatora". É nesse sentido também a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.
No caso, estava em julgamento o Mandado de Segurança impetrado pela Usina Caeté S/A - Unidade Delta e Usina Caeté S/A - Unidade Volta Grande, em face da Gerência Regional do Trabalho e Emprego em Uberaba e do Ministério do Trabalho e Emprego. O mérito da ação dizia respeito à interdição, pela fiscalização do MTE, da atividade de plantio manual de cana-de-açúcar, mediante o arremesso de mudas de cima de caminhões, sob o fundamento de que isso implicaria risco grave e iminente aos trabalhadores nele envolvidos.
As impetrantes alegaram que a atividade tem base em estudo realizado pela Fundacentro, a pedido do Ministério Público do Trabalho e, por isso, não poderia ser penalizada. Negaram qualquer risco na forma de plantio adotada, considerando que os trabalhadores foram treinados e receberam EPI¿s necessários. Ao final, requereram a concessão de liminar, com a desinterdição da atividade e a concessão da segurança, com o reconhecimento de seu direito líquido e certo de realizar o plantio da cana com o arremesso das mudas de cima dos caminhões. Comprovada a prestação de caução, foi deferida, em 1º Grau, a liminar requerida.
Já as autoridades apontadas como coatoras reafirmaram que a atividade interditada representa risco grave e iminente aos trabalhadores envolvidos, sendo possível realizar o plantio de duas outras maneiras, do chão e mecanizado. Disseram ainda estar a interdição amparada em lei. A União também se manifestou no processo, requerendo a reconsideração da liminar e sustentando a legalidade da interdição.
Nesse ponto da discussão, as impetrantes requereram a desistência da ação, com o que não concordou a União. Em decisão já proferida no processo, o Juízo de 1º Grau denegou a segurança pretendida, com a revogação da liminar anteriormente deferida, concluindo não haver direito líquido e certo de se continuar realizando plantio por arremesso, em desacordo com as normas técnicas e de segurança do trabalho, com evidente risco aos trabalhadores transportados em carrocerias de caminhão, sem qualquer proteção contra quedas. Nessa decisão o Juízo determinou ainda a retificação da autuação e demais registros do feito, para fazer constar do polo passivo a União, e não o Ministério do Trabalho e Emprego, que não possui personalidade jurídica.
Só que, antes de proferida essa decisão, as empresas já haviam entrado com pedido de desistência da ação. Alegaram, em embargos de declaração, que, mesmo que a impetrada (União) não tenha concordado com a desistência, deveria ser pronunciada decisão preliminar de mérito sobre a questão. Em decisão de segundos embargos declaratórios, o juiz de 1º Grau extinguiu o feito, sem resolução de mérito, com base no artigo 267, VIII, do CPC.
Foi contra essa decisão que se insurgiu a União Federal, pretendendo que fosse julgado o mérito e denegada a segurança. Mas o desembargador relator julgou desfavoravelmente o recurso da União e manteve a extinção do feito declarada em 1º Grau. "Verifico, inicialmente, que as razões deduzidas pela União Federal, estão voltadas à defesa da saúde e segurança dos trabalhadores que laboram na atividade de plantio de cana-de-açúcar. A questão, todavia, é de natureza processual, que diz respeito ao direito do impetrante de desistir do Mandado de Segurança, ato que, na esteira do entendimento esposado pelo d. Juízo de primeiro grau, leva à extinção do processo sem julgamento de mérito", ponderou o desembargador.
Ele citou jurisprudência do STF, da lavra do Ministro Celso de Mello, pela qual é lícito ao impetrante desistir da ação de mandado de segurança, mesmo sem consentimento da autoridade apontada como coatora ou da entidade estatal interessada ou dos litisconsortes passivos necessários, mesmo que já prestadas as informações ou produzido o parecer do Ministério Público. Em outra decisão, o Supremo admite a possibilidade de homologação da desistência do MS, a qualquer tempo, ainda que tenha sido proferida decisão de mérito.
O relator lembrou, conforme destacado no parecer do MPT, que com a desistência do mandado de segurança, permanece válido e com plena eficácia jurídica o ato impugnado pelas empresas por meio dele. Ou seja, permanece proibida e interditada a operação de plantio manual de cana-de-açúcar, realizadas com arremesso de mudas pelos trabalhadores de cima dos caminhões.
Acompanhando o relator, a 4ª Turma do TRT-MG negou provimento ao recurso ordinário da União Federal.