Turma declara competência da JT para julgar dano moral decorrente da negativação de nome do empregado junto a órgãos de proteção ao crédito
O ex-empregado de uma grande empresa responsável pela administração de duas importantes varejistas brasileiras procurou a Justiça do Trabalho alegando que a reclamada teria descumprido diversas obrigações. Uma das condutas denunciadas foi a de que a ex-empregadora teria procedido à negativação de seu nome perante o cadastro de devedores do SPC (Serviço de Proteção ao Crédito). Por esta razão, o reclamante pediu o pagamento de uma indenização por dano moral.
No entanto, por entender que a matéria envolve relação consumerista, ou seja, é regulada pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), a juíza de 1º Grau declarou a incompetência da Justiça do Trabalho para julgamento da pretensão. O caso foi parar na Turma Recursal de Juiz de Fora, que reformou a decisão. Com base no voto do juiz convocado Antônio Carlos Rodrigues Filho, os julgadores deram provimento ao recurso para reconhecer a competência da Justiça do Trabalho para exame do pedido.
Na inicial, o reclamante relatou que adquiriu produtos da empresa, de forma financiada, sendo o pagamento realizado mediante desconto em folha. Ocorre, contudo, que, em razão de afastamento previdenciário, a empresa encaminhou tardiamente os respectivos carnês para pagamento, que acabou resultando na inclusão de seu nome, pelo CDL-Juiz de Fora, no rol de devedores.
Ao proferir o seu voto, o relator lembrou que a competência da Justiça do Trabalho é prevista no artigo 114 da Constituição Federal, cabendo a ela dizer o direito nas controvérsias decorrentes das relações de trabalho, bem como nas outras controvérsias oriundas dessas relações (inciso IX). Para o magistrado, é este, exatamente, o caso do processo examinado, uma vez que a discussão tem origem remota no contrato de emprego havido entre as partes.
"A relação jurídica principal é a relação de emprego e não a relação de consumo em que se envolveram, indiretamente, o empregado e a empregadora", apontou o julgador, ponderando que a relação consumerista, no caso, só existe porque, antes dela, estabeleceu-se a relação de emprego. "A relação de consumo não existiria sem a relação de emprego, ao passo que o inverso não é verdadeiro", destacou.
O magistrado chamou a atenção para o fato de a própria ré, em contestação, ter admitido que os valores eram automaticamente debitados do vencimento do reclamante, enquanto empregado, constando os descontos correspondentes em seus holerites. Conforme observou, havia uma cláusula contratual exclusiva e essencialmente trabalhista, que previa o desconto em folha de pagamento. Ainda que esta facilitasse a compra por parte do empregado, representava, em contrapartida, uma garantia de adimplência inequívoca a favor do empregador, ao menos enquanto perdurasse a relação de emprego.
Ainda de acordo com entendimento do juiz convocado, foi exatamente essa cláusula contratual trabalhista que trouxe o prejuízo alegado pelo trabalhador. As circunstâncias que o levaram a deixar de pagar têm relação e origem direta na relação de emprego. Ele observou que a negativação do nome do inadimplente (providência ligada à relação de consumo) é simples desdobramento da controvérsia surgida por causa da relação de trabalho.
"Quem veio ao Judiciário foi o empregado, queixando-se de ato ilícito da empregadora (ao ter deixado de criar alternativas para pagamento) e buscando a compensação de que se julga merecedor em razão do dano moral. São estes, na verdade, com todas as vênias à d. Julgadora, os figurinos que vestem os atores processuais, e não os de consumidor perante a empresa de comércio varejista, como dito em sentença", entendeu o magistrado, para quem não há como fugir da conclusão de que a relação de trabalho é que dá sustentação jurídica à controvérsia trazida ao Judiciário.
Acompanhando o entendimento, a Turma afastou a incompetência declarada, determinando o retorno dos autos ao juízo de origem para exame e julgamento dos pedidos feitos pelo trabalhador.