Trabalhadora acusada de furtar guarda-chuva será indenizada
"Quem tem um direito pode exercê-lo livremente, desde que o faça dentro de certos limites que não excedam o conteúdo do próprio direito, ou que não revele intenções prejudiciais a outrem" . A lição é do jurista João Franzen de Lima e foi lembrada pelo juiz Fernando Sollero Caiaffa, titular da 1ª Vara do Trabalho de Uberlândia, na sentença em que condenou a Sadia S.A. e uma prestadora de serviços de segurança ao pagamento de indenização por dano moral. Tudo porque uma empregada da Sadia foi acusada, sem qualquer cuidado e na frente de outras pessoas, do furto de um guarda-chuva por um vigilante que prestava serviços na empresa. No entender do julgador, um abuso capaz de gerar o direito à reparação.
A trabalhadora contou que foi abordada pelo vigilante na saída da empresa e que ele a acusou, na frente de terceiros, de ter furtado um guarda-chuva pertencente à empresa. Uma situação que ela descreveu como sendo constrangedora, vexatória e que gerou muito sofrimento. A empregadora, por sua vez, negou o fato, defendendo o direito de preservar o seu patrimônio. Já a empresa de segurança reconheceu o ocorrido, mas deu outra versão à história. De acordo com esta, a abordagem do vigilante foi respeitosa e em local adequado. Cenário bem diferente do que apurou o julgador, ao analisar as provas. É que a reclamante apresentou uma testemunha que afirmou ter presenciado a seguinte cena: o guarda acusando a empregada de "ladrona" e ela chorando e dizendo que a haviam acusado de roubar um guarda-chuva. Diante desse contexto e considerando que as reclamadas não apresentaram provas em audiência, o juiz sentenciante concluiu que a razão estava com a reclamante. Afinal, ela conseguiu comprovar sua versão dos fatos, como determina a lei. Para o julgador, houve clara violação à dignidade da pessoa e, especificamente, da trabalhadora.
No boletim de ocorrência a reclamante relatou que comprou um guarda-chuva na rua e o deixou no vestiário feminino. Após o término do serviço, pegou o objeto e saiu. Foi então que foi abordada pelo segurança e tudo aconteceu. E realmente o guarda-chuva não era o dela. Segundo a trabalhadora, ela só percebeu isso quando o vigilante o abriu. Mas o juiz sentenciante não deu muita importância para esses fatos. Se a empregada se equivocou ou se realmente foi um furto, para ele isso não tem relevância. Isto porque, de qualquer modo, houve abuso na forma de agir das reclamadas. Conforme explicou o julgador, a empresa tem o direito de abordar uma pessoa suspeita, como forma de zelar pelo seu patrimônio e tomar as providências cabíveis. O que não pode é ultrapassar certos limites. "O abuso no exercício de um direito a garantir" é o que se repudia, esclareceu na sentença. E foi nesse contexto que chamou a atenção para a lição do mestre mineiro João Franzen de Lima.
"O rigor do ato, publicamente praticado, ou seja, sem as cautelas necessárias, ao lado de uma imputação, mesmo que procedente e independente do motivo legal, traz consigo frustração, desorganização mental e até mesmo familiar, insegurança, medo e vergonha, todos passíveis de reparação" , reconheceu o magistrado na sentença. Para ele, a grave acusação certamente deixou a trabalhadora com vergonha e constrangida, causando dor moral. Diante disso, entendeu que a conduta antijurídica das empresas gerou um dano moral à reclamante, decidindo condenar tanto a Sadia como a empresa prestadora de serviços de vigilância ao pagamento de indenização, arbitrada em R$5 mil reais. Houve recurso, ainda sem julgamento pelo Tribunal de Minas.