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NJ Especial: Súmula Nº 60 do TRT-MG declara inconstitucionalidade de lei municipal de BH que autoriza execução indireta dos serviços pela SLU

publicado: 29/06/2017 às 00h06 | modificado: 28/06/2017 às 20h54
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Logo do NJ EspecialEm sessão ordinária realizada em 09 de março de 2017, O Pleno do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, por maioria de votos,  declarou a inconstitucionalidade, em controle difuso, do inciso II, § 1º do art. 106 da Lei n. 9.011/2005 do Município de Belo Horizonte, no que tange à possibilidade de execução indireta dos serviços de limpeza urbana pela SLU, autarquia municipal responsável por executar diretamente esses serviços. Foi determinada a edição de Súmula de Jurisprudência sobre o tema, na forma dos artigos 144 a 146 do RI do TRT/3ª Região, com a seguinte redação: 

"SLU - EXECUÇÃO  INDIRETA  DOS  SERVIÇOS  DE  LIMPEZA URBANA INCONSTITUCIONALIDADE DE DISPOSITIVO DE LEI MUNICIPAL - É inconstitucional o disposto no inciso II, § 1º, do art. 106 da Lei n. 9.011/2005, do Município de Belo Horizonte, no que tange à possibilidade de execução indireta dos serviços de limpeza urbana pela SLU, responsável, enquanto autarquia municipal, por executar diretamente esses serviços, que lhe foram atribuídos pelo Município, sob pena de afronta ao inciso V do art. 30 e ao inciso II do art. 37, ambos da Constituição Federal."

Ante a edição da Súmula, determinou-se o retorno dos autos à 1ª Turma do TRT da 3ª Região, para que prossiga no julgamento dos recursos ordinários que deram origem ao Incidente, com base no entendimento fixado. 

O caso

Os pedidos formulados na ação civil pública distribuída sob o número 00391-2007-018-03-00-9 foram julgados procedentes em parte. Posteriormente, o acórdão proferido pela 1ª Turma negou provimento a todos os apelos apresentados. Foi, então, interposto Recurso de Revista pelo 3º interessado - SINTRALIX/MG e pela reclamada – SLU, sendo deferida liminar em reclamação constitucional para suspensão, até decisão final da referida reclamação, da eficácia do acórdão proferido pela 1ª Turma nos autos, em razão de inobservância da Súmula Vinculante 10/STF. A reclamação constitucional foi julgada procedente para cassar o acórdão proferido pela 1ª Turma, de modo a ser observada a Súmula Vinculante 10/STF, decisão que transitou em julgado em 11.09.2015.

O processo foi submetido a julgamento pela 1ª Turma que, à unanimidade, na forma do Regimento Interno do Regional (artigo 136/139, combinado com o artigo 142), suspendeu o julgamento e resolveu afetar o Pleno do Tribunal, em observância à cláusula de reserva de plenário, disposta na Súmula Vinculante nº 10/STF, pela qual: “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.”

Assim, o julgamento atendeu à determinação constante da decisão proferida pelo STF, para que se analisasse a declaração de inconstitucionalidade, de forma incidental, do artigo 106, parágrafo l, inciso II da Lei 9.011/2005 do Município de Belo Horizonte, que estabeleceu a competência da SLU para "lI - executar, direta ou indiretamente, e fiscalizar os serviços de limpeza urbana" vez que à SLU, enquanto autarquia municipal, incumbe a execução direta do serviço de limpeza urbana, cuja competência é afeta ao Município de Belo Horizonte, por força do artigo 30, inciso V, da Constituição e, ainda, porque a execução de forma indireta constitui afronta ao artigo 37, inciso II, da CF, ao permitir a admissão de pessoal sem submissão a concurso público.

O Ministério Público do Trabalho opinou "pela declaração incidental da inconstitucionalidade do inciso II do parágrafo 1º do artigo 106 da Lei nº 9.011/2005 do Município de Belo Horizonte pelo Tribunal Pleno do TRT da 3ª Região, prosseguindo-se, então, a 1ª Turma no julgamento do mérito dos Recursos Ordinários conforme for de direito".

Em parecer, a Comissão de Jurisprudência opinou pelo sobrestamento da arguição de inconstitucionalidade - 0011221-15.2016.5.03.0000 ArgInc (PJ-e), em decorrência da conexão com a questão discutida no RE n. 847.429/SC, com repercussão geral reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal. No caso de não acolhimento do sobrestamento, entendeu a Comissão que o inciso 11 do § 1º do art. 106 da Lei n. 9.011/2005, do Município de Belo Horizonte, padece de inconstitucionalidade, "porque, a SLU, enquanto autarquia municipal, é incumbida da execução direta dos serviços de limpeza urbana".

O rito

Atuando como relatora, a desembargadora Maria Cecília Alves Pinto destacou que, nos termos dos artigos 136 a 138 do Regimento Interno (RI) do TRT-MG, submetida a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do poder público ao órgão do Tribunal ao qual couber o julgamento do processo e, reconhecida a relevância, levar-se-á a arguição a julgamento pelo Tribunal Pleno, que será proclamada, desde que obtida a maioria absoluta dos Desembargadores do Tribunal. Julgada a arguição, prosseguirá, no órgão de origem, o julgamento das demais questões.

A decisão lembrou o que dispõe o artigo 97 da CF/88: "Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público". E de acordo com o artigo 139 do RI: "Aplicam-se, ao processo de arguição de inconstitucionalidade, no que couber, as disposições estabelecidas para o incidente de uniformização de jurisprudência".

Ainda conforme apontado, os artigos 144 e seguintes, que tratam do Incidente de Uniformização de Jurisprudência, dispõem que "a decisão tomada pela maioria absoluta dos Desembargadores será objeto de súmula e constituirá precedente de uniformização da jurisprudência". Não se alcançando a maioria absoluta, o incidente suscitado permanecerá em pauta das sessões do Tribunal Pleno, computados os votos já proferidos, até que todos os Desembargadores venham a deliberar sobre a matéria, ou até que se alcance o quórum para a eventual constituição de súmula (inteligência do parágrafo 5º do art. 144 c/c parágrafo 3º do art. 146 do RI).

Ademais, a disposição do Regimento Interno é consonante com o artigo 23 da Lei n. 9868/99, que rege o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, segundo o qual:

Artigo 23. Efetuado o julgamento, proclamar-se-á a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da disposição ou da norma impugnada se num ou noutro sentido se tiverem manifestado pelo menos seis Ministros, quer se trate de ação direta de inconstitucionalidade ou de ação declaratória de constitucionalidade.

Parágrafo único. Se não for alcançada a maioria necessária à declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, estando ausentes Ministros em número que possa influir no julgamento, este será suspenso a fim de aguardar-se o comparecimento dos Ministros ausentes, até que se atinja o número necessário para prolação da decisão num ou noutro sentido”

Segundo pontuou a julgadora, foi submetida a arguição a julgamento pelo Tribunal Pleno na sessão do dia 09.02.2017, deliberando-se pelo prosseguimento do julgamento, nas sessões seguintes, até que todos os Desembargadores deliberassem sobre a matéria, tendo em vista que seja alcançada a maioria absoluta dos membros.

O mérito

Sobrestamento negado - De início, a desembargadora rejeitou a pretensão da SLU de sobrestamento do feito e também a tese da Comissão de Jurisprudência que se manifestou pelo sobrestamento da arguição de inconstitucionalidade - 0011221-15.2016.5.03.0000 ArgInc (PJ-e), em decorrência da alegada conexão com a questão discutida no RE n. 847.429/SC, com repercussão geral reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal.

Conforme observou a julgadora, do parecer se extrai que o tema submetido à apreciação do Supremo Tribunal Federal, por meio do RE nº 847.429/SC, diz respeito à possibilidade de delegação, mediante contrato de concessão, do serviço de coleta e remoção de lixo domiciliar pelo Município de Joinville/SC, bem como sobre a forma de remuneração de tais serviços, no que diz respeito à essencialidade e à compulsoriedade.

Para a desembargadora, não há conexão entre a arguição de inconstitucionalidade tratada nos autos com o "Tema 903", com repercussão geral reconhecida pelo STF. É que, segundo ela, o tema tratado na arguição de inconstitucionalidade, submetida à apreciação do Pleno diz respeito à possibilidade, ou não, de a SLU, enquanto autarquia municipal, realizar a terceirização dos serviços públicos de limpeza urbana e coleta de lixo, por meio de contratos públicos celebrados com particulares, uma vez que a ela incumbe, enquanto autarquia municipal, a execução direta do serviço de limpeza urbana, cuja competência é afeta ao Município de Belo Horizonte, por força do artigo 30 da Constituição de 1988.

Já as questões debatidas no tema 903 cingem-se ao exame da possibilidade de delegação, mediante contrato de concessão, do serviço de coleta e remoção de resíduos domiciliares e na definição da natureza jurídica da cobrança pela prestação dos serviços de coleta e remoção de lixo domiciliar prestado por concessionária, se taxa ou tarifa.

Nesse contexto, concluiu que a inconstitucionalidade discutida nos autos retrata situação jurídica que precede à discussão travada no âmbito do STF, já que sequer foi celebrado o contrato de concessão com o Município de Belo Horizonte. Ao contrário, houve apenas e tão-somente a terceirização do serviço público que foi atribuído à Autarquia, por meio de outorga legal, situação diversa da versada no tema 903.

Por essa razão, entendeu que não é o caso de sobrestamento da ação para se aguardar o julgamento do RE n. 847.429/SC, pelo STF.

Súmula Vinculante 10/STF - Passando ao enfrentamento do mérito propriamente dito, ponderou a relatora que o acórdão proferido pela 1ª Turma do TRT/3ª Região não observou a Súmula Vinculante 10/STF, vez que afastou expressamente o artigo 106, §1º, inciso II, da Lei Municipal 9.011/2005, com base no art. 37, II/CF. Considerando teor da decisão do STF, a 1ª Turma suspendeu o julgamento do recurso e submeteu a decisão ao pleno, adotando como razões de decidir os fundamentos expendidos pela Relatora do acórdão que foi objeto da reclamação constitucional e acrescento outros, conforme decisão da 1ª Turma, oriundos da decisão de afetar o processo ao Tribunal Pleno.

Declaração de inconstitucionalidade - Nessa decisão, relatora lembrou que a SLU, autarquia municipal, foi criada por meio da Lei Municipal 2.220/73, que dispôs:

Art. 1º- Fica criada a Superintendência de Limpeza Urbana - SLU - entidade autárquica dotada de personalidade jurídica e patrimônio próprios, com autonomia financeira administrativa e técnica, sede e foro nesta Capital, regidos pelas disposições, da presente Lei.

Art. 2º- A Superintendência de Limpeza Urbana - SLU - tem por finalidade a exploração em todo o Município de Belo Horizonte dos serviços de varredura, coleta, depósito, tratamento e transformação do lixo e da venda de seus produtos e subprodutos.

Art. 3º- A Superintendência de Limpeza Urbana - SLU - fica assegurada a exclusividade na exploração dos serviços de que trata o artigo anterior, competindo-lhe:

I - planejar, desenvolver, executar e explorar diretamente os serviços mencionados no artigo 2º;

(...)”

Dessa disposição legal, a magistrada inferiu que o Município de Belo Horizonte transferiu à Superintendência de Limpeza Urbana de Belo horizonte (SLU), ente da Administração Pública Municipal Indireta, a consecução dos serviços atinentes à limpeza pública urbana. Portanto, segundo a julgadora, esta é sua atividade-fim, por meio de outorga legal do serviço, que deveria executar diretamente, conforme inciso I do art. 3º da lei 2220/73.

A magistrada chamou a atenção para o fato de que a Lei Municipal 6.290/92 reafirma que o objeto da SLU é a exploração exclusiva dos serviços de limpeza urbana, sendo que a ela compete planejar, desenvolver, executar e explorar com exclusividade e diretamente, os serviços de limpeza urbana. Apenas posteriormente, como destacou, a Lei 7.906/1999 alterou o inciso I do artigo 2º dessa Lei, que passou a ter a seguinte redação: "planejar, desenvolver, explorar e executar, direta ou indiretamente, os serviços de limpeza urbana", dando espaço para que a autarquia municipal terceirizasse a execução dos serviços de limpeza, alterando, assim, de forma indireta, a finalidade de criação da SLU.

Por fim, apontou a relatora que a Lei 9.011/2005, que dispôs sobre a estrutura organizacional da administração direta do poder executivo e deu outras providências, foi mais além: alterou o objeto da SLU, bem como manteve a possibilidade de execução, de forma indireta, dos serviços de limpeza urbana, consoante artigo 106:

Fica mantida a Superintendência de Limpeza Urbana de Belo Horizonte - SLU -, autarquia municipal criada pela Lei nº 2.220, de 27 de agosto de 1973, com as alterações da Lei nº 6.290, de 23 de dezembro de 1992, com seu objetivo circunscrito à implementação da política governamental para o Sistema de Limpeza Urbana e de metas do Plano Diretor de Resíduos Sólidos em colaboração com a Administração Direta do Poder Executivo.

§ 1º - À SLU compete:

[...]

II - executar, direta ou indiretamente, e fiscalizar os serviços de limpeza urbana; (grifos acrescidos)

Por fim, o mencionado inciso II teve sua redação alterada pela Lei Municipal 10.101/2011, passando a ter o seguinte teor: "II - executar, direta ou indiretamente, os serviços de limpeza urbana".

Conforme observou a relatora, o artigo 30, V/CF dispõe que compete aos Municípios organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial. O artigo 37, II/CF prevê que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

No mesmo sentido, ainda nos termos da decisão, o artigo 2º da Lei 9.074/95, que estabelece normas para a outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos e dá outras providências, assim estabelece:

É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios executarem obras e serviços públicos por meio de concessão e permissão de serviço público, sem lei que lhes autorize e fixe os termos, dispensada a lei autorizativa nos casos de saneamento básico e limpeza urbana e nos já referidos na Constituição Federal, nas Constituições Estaduais e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e Municípios, observado, em qualquer caso, os termos da Lei 8.987, de 1995.”

Ainda foi registrado que a Lei nº 8.897/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no artigo 175 da Constituição Federal, expressamente prevê que a concessão de serviço público é "a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado" (art. 2º, inciso II).

E o artigo 9º disciplina que: "A tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei, no edital e no contrato."

A concessão de serviço público é, portanto, espécie de contrato administrativo por meio do qual a Administração Pública Direta (poder concedente) transfere à pessoa jurídica privada ou a consórcio de empresas a execução de determinada atividade de interesse coletivo, com a singularidade de que esta atividade é remunerada por tarifas pagas pelos próprios usuários do serviço”, registrou a relatora, concluindo que somente a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios detêm legitimidade para transferir, mediante concessão, a execução de serviços públicos. Nesse sentido, citou, ainda, o inciso I do art. 2º da Lei 8.987/95:

Para os fins do disposto nesta Lei, considera-se:

I - poder concedente: a União, o Estado, o Distrito Federal ou o Município, em cuja competência se encontre o serviço público, precedido ou não da execução de obra pública, objeto de concessão ou permissão;”

No caso, o entendimento da desembargadora é o de que os contratos firmados pela SLU não tratam, em hipótese alguma, de concessão de serviço público, mas de verdadeira terceirização de atividades, mediante contrato de prestação de serviços, sendo certo que a SLU não é poder concedente, na forma da lei.

Tanto que, ponderou, os valores recebidos pelas prestadoras de serviços, para a execução dos contratos firmados com a SLU, não têm origem nas tarifas cobradas diretamente de seus usuários (taxa de limpeza urbana), mas sim no repasse efetuado diretamente pela SLU (segundo Reclamado). Como exemplo, indicou a cláusula quarta do contrato de f. 287/301.

Da leitura do acórdão proferido, inferiu que a SLU, em razão dos dispositivos constitucionais citados, não pode terceirizar os serviços de execução de limpeza urbana, d.m.v. do citado art. 106, caput, § 1º, II da Lei 9.011/2005, porquanto não está prevista na Constituição Federal a possibilidade de a autarquia municipal sub-rogar a atividade-fim e o escopo para a qual foi criada, remanescendo competência apenas para a implementação de política governamental. Salientou que caberia apenas ao Município a organização e prestação direta, ou sob regime de concessão ou permissão dos serviços públicos de interesse local, mas à autarquia, criada para o fim específico de executar a atividade de competência do órgão a que está vinculada, não cabe a terceirização dos serviços cuja competência lhe foi atribuída por lei, vez que não há permissivo legal nesse sentido.

Para a relatora, como bem registrou o MPT, na peça inicial, o Estado pode transferir a execução de serviços públicos e atividades de interesse público a pessoas jurídicas de direito público, como no caso dos autos, em que foi criada autarquia para esse fim (SLU), entidade que integra a Administração Indireta do Município de Belo Horizonte. Ou pode transferi-los ao particular (pessoa jurídica de direito privado) por meio de contratos de concessão ou permissão, dentre outras modalidades de contratação com o particular.

Ora, segundo o art. 5º do Decreto-Lei 200/1967, as Autarquias são criadas para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada”, ponderou. Nesse contexto, considerou que, ao optar por realizar o serviço de limpeza urbana por meio de autarquia, o Município de Belo Horizonte realizou outorga legal de serviço essencial. Na avaliação da magistrada, não cabia à SLU terceirizar sua atividade-fim, ainda que por meio de processo licitatório, porque implica em contratação de empregados sem concurso público, para consecução de sua finalidade legal.

Na decisão, citou ainda o que estabelece o Decreto 2.271/1997:

Art. 1º No âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional poderão ser objeto de execução indireta as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade.

§ 1º As atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações serão, de preferência, objeto de execução indireta.

§ 2º Não poderão ser objeto de execução indireta as atividades inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal”

No mesmo sentido, pontuou ser o artigo 9º da IN 02/2008 expedida pelo MPOG, que veda "a contratação de atividades que: I - sejam inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, assim definidas no seu plano de cargos e salários, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal", ou ainda as atividades que "II - constituam a missão institucional do órgão ou entidade".

Por outro lado, foi levado em conta o permissivo contido no parágrafo 7º do artigo 10 do Decreto-Lei 200/1967, segundo o qual:

Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e controle e com o objetivo de impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução”.

Concluiu, entretanto, que esse último dispositivo deve ser interpretado em conjunto com os demais dispositivos legais citados, notadamente o artigo 1º do Decreto 2.271/1997, pelo qual somente poderão ser objeto de execução indireta "as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade".

Dessa forma, o entendimento adotado foi o de que somente as atividades acessórias, instrumentais ou complementares podem ser objeto de execução indireta. No caso analisado, rejeitou a possibilidade de a limpeza urbana e os serviços de varredura, coleta, depósito e tratamento de lixo serem considerados como acessórios, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem a área de competência legal da SLU.

Na visão da julgadora, a SLU apenas está contratando mão de obra por meio de interposta pessoa, o que é vedado pelo ordenamento jurídico, não obstante tenha extinguido os cargos necessários à consecução de suas atividades por meio da Lei Municipal 9.329/2007, artigo 2º, § 4º, o que, registrou, não altera o entendimento esposado.

A decisão aponta parecer do TCU e decisão do TCE/MG, no mesmo sentido:

Por fim, registrou a conclusão da Comissão de Jurisprudência do TRT-MG: "esta Comissão entende que o inciso II do § lº do art. 106 da Lei n. 9.011/2005, do Município de Belo Horizonte, ao estabelecer a competência da SLU para executar indiretamente os serviços de limpeza urbana, padece de inconstitucionalidade. Isso porque, a SLU, enquanto autarquia municipal, é incumbida da execução direta dos serviços de limpeza urbana".

Portanto, no entender da relatora, ao estabelecer a possibilidade de execução indireta dos serviços de limpeza urbana, o inciso II do § lº do artigo 106 da Lei n. 9.011/2005, do Município de Belo Horizonte afronta o disposto no artigo 30, V/CF, bem como o art. 37, II, da CF, ao permitir a admissão de pessoal sem submissão a concurso público.

A Conclusão

Por todos esses fundamentos, o Tribunal Pleno do TRT/3ª Região conheceu da arguição de inconstitucionalidade de preceito de lei municipal, rejeitou as preliminares arguidas e, no mérito, declarou a inconstitucionalidade, em controle difuso, nos termos da fundamentação, do inciso II, § 1º do art. 106 da Lei n. 9.011/2005, no que tange à possibilidade de execução indireta dos serviços de limpeza urbana pela SLU, responsável, enquanto autarquia municipal, por executar diretamente esses serviços, que lhe foram atribuídos pelo Município, sob pena de afronta ao inciso V do art. 30 e ao inciso II do artigo 37, ambos da Constituição Federal.

Atingido o quorum regimental, correspondente à maioria absoluta de seus membros, o Tribunal Pleno deliberou pela edição da Súmula de Nº 60 sobre o tema, na forma dos artigos 144 a 146 do RI da 3ª Região. Na sequência, foi determinado o retorno dos autos à Primeira Turma do TRT da 3ª Região, para que prossiga no julgamento dos recursos ordinários até então sobrestados.

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