Companheiro e filho de empregada que morreu com choque elétrico ao limpar banheiro de shopping serão indenizados
A trabalhadora fazia a limpeza do banheiro de um shopping center administrado pelo condomínio reclamado quando levou um choque elétrico e morreu. Ela utilizava máquina de polir cerâmica e teve contato direto com a corrente elétrica ao desconectar o fio da máquina da tomada. A justificativa apresentada pela empresa: culpa exclusiva da vítima, que não teria utilizado luvas nitrílicas para proteção e isolamento térmico.
Mas o argumento não convenceu o juiz substituto Neurisvan Alves Lacerda, que julgou a ação ajuizada pelo companheiro e pelo filho da vítima na 1ª Vara do Trabalho de Montes Claros. Os familiares pediram o pagamento de indenizações por danos morais e materiais sofridos com a morte da trabalhadora, o que foi deferido pelo julgador, após analisar detidamente o conjunto das provas do processo.
Na defesa, o reclamado ainda levantou outra tese: a de que a trabalhadora teria tentado provocar a própria morte. Segundo alegou, ela teria se trancado no banheiro e retirado as luvas de proteção, desconectando a tomada com o piso ainda molhado. Tudo porque estaria abalada emocionalmente em razão da prisão do seu único filho, por tráfico de drogas e porte ilegal de armas. A versão, no entanto, não foi acatada pelo julgador.
Com fundamento no ordenamento jurídico vigente, na doutrina e nas provas do processo, o magistrado foi refutando, um a um, os argumentos apresentados pelo réu na tentativa de se livrar da responsabilidade pelo acidente. O juiz se baseou no resultado da perícia criminal feita no local do acidente, além de fotos e testemunhas, para concluir que o condomínio descumpriu seu dever de manter instalações elétricas adequadas. Segundo ele, obrigação neste sentido é prevista no artigo 157 da CLT. Na sentença foi lembrado, ainda, o conteúdo da NR 10. A norma dispõe que as instalações elétricas devem ser construídas, montadas, operadas, reformadas, ampliadas, reparadas e inspecionadas de forma a garantir a segurança e saúde dos trabalhadores e usuários, e serem supervisionadas por profissional autorizado (item 10.4.1).
Na visão do julgador, a falta de manutenção da tomada foi a causa do acidente que resultou no falecimento da empregada. "Não vislumbro participação concorrente da vítima no acidente, por falta de luvas de borracha" , destacou na sentença, ponderando que o pessoal da limpeza não costuma receber luvas isolantes contra choques elétricos, pois normalmente não existe exposição a esse risco. Geralmente são fornecidas luvas de borracha para proteção contra agentes químicos. De todo modo, o juiz pontuou que o condomínio réu não apresentou recibo de entrega de luvas isolantes à empregada, com certificado de aprovação expedido pelo Ministério do Trabalho, nos termos do artigo 167 da CLT.
"A insegurança no ambiente de trabalho foi o antecedente causal que teve como efeito direto e imediato o resultado danoso" , destacou o magistrado, reconhecendo os direitos pretendidos pelos reclamantes. No processo, ficou demonstrado que o companheiro da vítima é funcionário público municipal e o filho estava preso. Isso, contudo, não modificou o entendimento do magistrado. É que, conforme ele explicou, o direito à pensão surge do ato ilícito e visa a reparar o prejuízo da perda da renda familiar. Pouco importa se os familiares têm ou não condição de manter o padrão de vida anterior ao óbito. Sopesando vários aspectos envolvendo o caso, o juiz presumiu que dois terços da remuneração da falecida era destinada ao grupo familiar e um terço era utilizado para suas próprias despesas pessoais.
Com base nesse contexto, o juiz decidiu condenar o condomínio ao pagamento de dois terços da remuneração da falecida a título de pensão mensal, sendo um terço para cada reclamante. Considerando que a morte da trabalhadora causou sofrimento aos reclamantes, o magistrado decidiu ainda condenar o condomínio ao pagamento de indenização por danos morais, no valor total de R$186.600,00.
Denunciação da lideO condomínio pretendia incluir no processo duas seguradoras por ele contratadas para que fossem responsabilizadas no caso de sua condenação. É a chamada denunciação da lide, instituto previsto na legislação processual civil e que permite à parte trazer para a demanda judicial um terceiro com quem mantenha uma relação jurídica ligada, de alguma forma, à questão em julgamento. Nas ações trabalhistas, a denunciação tem, em geral, o objetivo de atender a pretensão de regresso da reclamada contra terceiro, caso venha a sofrer uma condenação.
Mas o juiz sentenciante entendeu que a Justiça do Trabalho não tem competência para processar e julgar a demanda entre a denunciante e a denunciada, por envolver uma lide empresária ou civil em sentido estrito. De acordo com o magistrado, a medida retardaria a solução da questão trabalhista, retirando da Justiça do Trabalho o foco do seu objeto central: o trabalho humano. Portanto, foi declarada a incompetência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a denunciação da lide formulada pelo réu.
O condomínio apresentou recurso ao TRT da 3ª Região, que apenas reduziu o valor da indenização por danos morais, fixando-a em R$60.000,00, sendo R$30.000,00 para cada reclamante.