Ementas do Mês
Dezembro de 2024 - Índice de Temas
Dia 02/12/2024
I. Assédio moral - indenização
Dia 03/12/2024
II. Doença ocupacional - indenização
Dia 04/12/2024
III. Trabalho em condição análoga à de escravo - dano moral
Dia 06/12/2024
IV. Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero - aplicação
V. Plano de saúde - indenização
I. Assédio moral - indenização
ASSÉDIO MORAL. BOATOS DESABONADORES NO AMBIENTE DE TRABALHO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
1. A autora foi vítima de assédio moral, em razão dos boatos desabonadores propagados em seu ambiente de trabalho, sendo irrefutável que os fatos comprovados nos autos atingiram a dignidade psíquica da trabalhadora, sem a adoção de medidas, por parte da sua empregadora, para impedir a conduta adotada que, sem dúvidas, tornava o espaço laboral inóspito para a obreira.
2. A obrigação de manter o ambiente de trabalho saudável e seguro é daquele que dirige a prestação de serviços. Cabe ao empregador avaliar os riscos e tomar as medidas corretivas e preventivas, até porque detém o controle e a direção sobre a dinâmica e a gestão do seu negócio.
3. Aplicação do Protocolo para Atuação e Julgamento na Justiça do Trabalho, que tratou especificamente do assédio, publicado em agosto de 2024, elaborado pela ENAMAT e pelo C. TST, e do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça, que determina aos magistrados e às magistradas "que julguem sob a lente de gênero, avançando na efetivação da igualdade e nas políticas de equidade".
4. Restando configurado o dano à dignidade da trabalhadora, em virtude do ato abusivo e ilícito acima relatado, e a culpa da ex-empregadora no evento danoso em face da sua conduta omissiva, impõe-se a obrigação de indenizar.
5. Recurso ordinário provido para majorar o valor da indenização pelos danos morais.
(TRT da 3.ª Região; PJe: 0010125-53.2024.5.03.0171 (ROT); Disponibilização: 02/12/2024; Órgão Julgador: Primeira Turma; Relatora Desembargadora Paula Oliveira Cantelli)
II. Doença ocupacional - indenização
SÍNDROME DE BURNOUT -INDENIZAÇÃO TRABALHISTA POR DANO MORAL. "Alega o autor que foi acometido de doença ocupacional (Síndrome de Burnout). Requer o pagamento de indenização por dano moral decorrente do acidente de trabalho/doença ocupacional. A ré impugna os fatos apontados pelo autor e sustenta que o demandante não é portador de doença de natureza ocupacional. Pois bem.A prova oral dos autos é exuberante quanto às ameaças sofridas pelo obreiro em decorrência do trabalho desempenhado. O boletim de ocorrência de Id 6dda7ac, que traz como testemunhas seus superiores hierárquicos, narra com clareza a ameaça de que foi vítima o autor. No mesmo sentido, a prova oral colhida nos autos é contundente quanto à cobrança excessiva de metas, bem como quanto ao episódio da ameaça proferida por prestador de serviço da ré. Por outro lado, a perícia médica realizada nos autos (Id 03104C1 e Id 1f211da) comprova ter sido o autor acometido por doença de cunho psiquiátrico. De igual modo, os inúmeros atestados e relatórios médicos juntados no Id 9fa7ac5, conforme destaca o laudo pericial. Houve, inclusive, emissão de CAT por parte da empregadora (Id 84a222).Sobre o nexo de causalidade, o auxiliar do juízo, diante da anamnese e do exame clínico, apurou que o trabalho desempenhado junto à ré atuou como causa para a doença que afligiu o autor. Vejamos (ID. 03104C1): "Ficou cristalino para o expert que a patologia narrada possui nexo com o labor, ou seja que o adoecimento foi causado por questões relacionadas diretamente com o trabalho". Pelo exposto, tratando-se de prova eminentemente técnica, produzida por perito que detém a confiança do Juízo, e não havendo nos autos outros meios de prova capazes de infirmar as conclusões do laudo pericial, acolho-o, integralmente. Tem assento constitucional o direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (art. 7º, XXII, da CF). Lado outro, é certo que cabe ao empregador cumprir e fazer cumprir todas as regras de proteção à saúde do trabalhador. Nesse sentido, a responsabilidade do empregador, no que diz respeito à integridade física do trabalhador, é objetiva, valendo notar, por ser importante, que todos os riscos da atividade econômica devem ser imputados ao empregador (art. 2º da CLT). Pelo que está explicitado no parágrafo anterior, somente a culpa exclusiva da vítima pode afastar a responsabilidade do empregador em relação ao dever de indenizar eventual prejuízo experimentado pelo empregado, e tal culpa não restou evidenciada nos autos. Está claro que o trabalho do autor desencadeou a doença ocupacional. O autor esteve submetido a cobranças excessivas acerca das inatingíveis metas estipuladas pela empresa, bem como a intenso temor diante da ameaça de morte proferida por pessoa armada, inclusive dentro do estabelecimento da empresa. O quadro acima é amplamente favorável ao reconhecimento do alegado dano moral. E é por isso que reputo significativo o prejuízo ao patrimônio imaterial do autor, de modo que condeno a ré a pagar àquele indenização por dano moral, arbitrada em R$80.000,00, nos termos dos arts. 927, e caput parágrafo único do Código Civil, c/c art. 5º, V, da CF/88. Registro que o valor fixado tomou em consideração as particularidades do caso presente, bem como o princípio da razoabilidade e a sorte econômica dos envolvidos. Ademais, a indenização por dano moral deve conter uma dupla face: ao causador do dano, uma punição, um aspecto pedagógico; à vítima, uma compensação, uma retribuição pelo prejuízo experimentado. Anoto que a responsabilização do empregador no caso em análise está em linha com a regra prevista no art. 932, III, do Código Civil, visto que o empregador é responsável pela reparação civil de eventuais danos causados por seus empregados e prepostos no exercício do trabalho ou em razão dele, nos termos do art. 933 do mesmo diploma legal. Tal responsabilidade do empregador independe de sua culpa, entendimento corroborado pela Súmula 341 do STF." (Excerto da sentença da lavra do MM. Juiz Marcelo Paes Menezes).
(TRT da 3.ª Região; PJe: 0010066-20.2023.5.03.0068 (ROT); Disponibilização: 03/12/2024; Órgão Julgador: Primeira Turma; Relator Desembargador Luiz Otávio Linhares Renault)
III. Trabalho em condição análoga à de escravo - dano moral
JORNADAS EXAUSTIVAS. TRABALHO ANÁLOGO À ESCRAVIDÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
1. As jornadas excessivas, caracterizadas pelo labor além dos limites de jornada previstos no ordenamento jurídico, possuem aptidão para gerar o dano existencial, com o comprometimento do projeto de vida do trabalhador, bem como podem configurar o trabalho escravo.
2. As Convenções 29 e 105, da Organização Internacional do Trabalho, ambas ratificadas pelo Brasil, em 1957 e 1965, respectivamente, preveem o trabalho forçado ou obrigatório e ampliam o conceito de trabalho escravo, na esteira do artigo 149, do Código Penal e da Instrução Normativa MTP n.º 2, de 22 de janeiro de 2021.
3. Aplicação do Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva de Enfrentamento do Trabalho Escravo Contemporâneo, do Tribunal Superior do Trabalho e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, de 2024.
4. Destaco trecho da sentença proferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, no julgamento do caso Fazenda Brasil Verde vs Brasil, em que reconhecido que o Estado violou o "direito a não ser submetido à escravidão e ao tráfico de pessoas": "Não pode passar inadvertido para um juiz interamericano que a escravidão, em suas formas análogas e contemporâneas, tem origem e consequência na pobreza, na desigualdade e na exclusão social, repercutindo nas democracias substantivas dos países da região. Deste modo, a análise da experiência interamericana de proteção de direitos humanos (civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais) demanda que sejam consideradas as peculiaridades da região, já que a América Latina é a região com o mais alto grau de desigualdade no mundo."(Sentença de 20/10/2016).
5. Neste caso, na primeira quinzena, o trabalho do autor foi executado por 168 horas e, na segunda, por 182 horas, o que resulta em uma média, a cada 7 dias de trabalho, de 84 horas e 91 horas. Ressaltando-se que as folgas eram concedidas apenas após quinze dias consecutivos de trabalho.
6. Restou demonstrado o labor em condições análogas à escravidão, já que submetido o Autor a jornadas extremamente extenuantes, na forma em que previsto no arcabouço jurídico interno e internacional, impondo-se a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais.
7. Recurso ordinário do autor conhecido e provido.
(TRT da 3.ª Região; PJe: 0010318-80.2024.5.03.0070 (ROT); Disponibilização: 04/12/2024; Órgão Julgador: Primeira Turma; Relatora Desembargadora Paula Oliveira Cantelli)
IV. Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero - aplicação
EMBARGOS DE TERCEIRO. AGRAVO DE PETIÇÃO. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. MEAÇÃO. EX-CÔNJUGE. DIVÓRCIO MUITO ANTERIOR AO CONTRATO DE TRABALHO. PROTOCOLO DE JULGAMENTO COM PERSPECTIVA DE GÊNERO. INSTRUMENTO PARA ALCANCE DA IGUALDADE DE GÊNERO, OBJETIVO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL - ODS 5 DA AGENDA 2030 DA ONU. A teor do que dispõe o art. 1º da Lei 8.009/90, "o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei". A impenhorabilidade do bem de família visa conferir efetividade e concretude aos direitos fundamentais, tais como a dignidade da pessoa humana e a moradia, os quais devem funcionar como vetores axiológicos do nosso ordenamento jurídico. Considerando-se que a parte agravante não se desvencilhou do seu ônus probatório a contento, não logrando demonstrar, de forma suficiente, a natureza de bem de família do imóvel, deve ser mantida a decisão proferida na origem que julgou subsistente a penhora. Entretanto, sob um olhar interseccional de gênero e em razão dos indícios de violência patrimonial sofrida, deve ser assegurada a meação da ex-cônjuge, por se tratar de contrato de trabalho muito posterior ao divórcio (realizado em 2014), não respondendo a parte pelas dívidas contraídas após a dissolução da sociedade conjugal. No caso concreto, as questões relacionadas ao fato devem ser valoradas a partir do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, que se trata de um instrumento para que seja alcançada a igualdade de gênero, Objetivo de Desenvolvimento Sustentável - ODS 5 da Agenda 2030 da ONU. Consta do Prefácio do referido protocolo: "Este protocolo é fruto do amadurecimento institucional do Poder Judiciário, que passa a reconhecer a influência que as desigualdades históricas, sociais, culturais e políticas a que estão submetidas as mulheres ao longo da história exercem na produção e aplicação do direito e, a partir disso, identifica a necessidade de criar uma cultura jurídica emancipatória e de reconhecimento de direitos de todas as mulheres e meninas. (...) Vale lembrar que conforme dados da ONU Mulheres, o Brasil tem se posicionado favorável ao modelo de protocolo latino-americano de investigação de mortes violentas de mulheres por razões de gênero (feminicídio), para que casos de violência contra a mulher sejam tratados de forma diferenciada. Ao que se vê, este protocolo é uma proposta que segue o discurso de garantia da inafastabilidade constitucionalmente exigida (art. 5º, XXXV, CF), bem como estabelece campo processual e procedimental sedimentados pelos discursos presentes em outros protocolos categorizados no âmbito internacional. O objetivo primordial de todos esses esforços é alcançar a superação dos percalços que impossibilita a percepção de uma igual dignidade entre mulheres e homens, em todos os cenários. Destarte, mais ainda se exige essa diretriz no ambiente judicial, diante da própria dimensão do conceito de acesso à justiça". A controvérsia, portanto, deve ser analisada seguindo o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, editado pelo CNJ, que determina que o julgador deve estar atento às desigualdades estruturais que afetam a participação dos sujeitos em um processo judicial.
(TRT da 3.ª Região; PJe: 0010563-93.2024.5.03.0134 (AP); Disponibilização: 06/12/2024, DJEN; Órgão Julgador: Primeira Turma; Relatora Desembargadora Adriana Goulart de Sena Orsini)
V. Plano de saúde - indenização
PLANO DE SAÚDE. MORA NA IMPLEMENTAÇÃO DESTE BENEFÍCIO. DANO MORAL. "Ao invocar conduta negligente por parte do Reclamante na implementação do direito convencionalmente previsto, atraiu para si a defesa o ônus de demonstrar o fato alegado, ônus do qual não se desincumbiu de nenhuma forma. Nesta linha, resta claro que a implementação do direito operada meses após a celebração do contrato de emprego (a partir de 13/07/20, conforme documento de fl. 36) representou clara violação ao patrimônio jurídico do Reclamante, sonegando-lhe direito de deveras importância, mormente quando observado o contexto da sonegação (no auge da pandemia de COVID-19). Tal estado de coisas, por injustificado, mostra-se patentemente condenável, sendo plenamente de causar transtornos ao trabalhador de toda ordem, eis que relegado a contexto de angústia em cenário mundial de incerteza e risco patente. Presumível, portanto, o dano, dano este que decorre, como visto, de conduta omissiva do empregador que, de maneira injustificada, obstaculiza cobertura adicional de saúde ao trabalhador em momento de premência. E uma vez observado o tripé necessário à responsabilização civil, impõe-se, por força dos arts. 186 e 927, ambos do CC, o dever de reparação." (Excerto da sentença proferida pela MM.ª Juíza Silvia Maria Mata Machado Baccarini).
(TRT da 3.ª Região; PJe: 0010682-43.2022.5.03.0031 (ROT); Disponibilização: 06/12/2024, DJEN; Órgão Julgador: Primeira Turma; Relator Desembargador Luiz Otávio Linhares Renault)